Daniel Smith, nascido nos Estados Unidos, era o último filho vivo de uma pessoa escravizada em território estadunidense
Aos 90 anos, Daniel Smith, última pessoa filha de alguém que foi escravizado no território dos Estados Unidos, faleceu em 19 de outubro em Washington. A morte, segundo sua esposa, foi uma falência cardíaca e um câncer na bexiga.
Daniel Smith experienciou, como repercutido pela Folha de São Paulo, muitos dos principais momentos da história afro-americana. Seu pai foi, Abram Smith, que nasceu como escravizado em Virgínia durante a Guerra Civil americana.
Sua esposa, Clara, muito mais nova que ele, deu a luz à Daniel em 1932, quando ele já tinha 70 anos. Mesmo com as dificuldades, apesar de ter nascido pobre, Daniel e seus irmãos fizeram faculdade e tiveram empregos de classe média.
Segundo historiadores que estudaram sua geração, não existe o conhecimento de outros filhos de escravizados, apesar de não ser possível determinar se Daniel foi, de fato, o último filho vivo de uma pessoa escravizada.
Daniel Smith escreveu uma autobiografia publicada esse ano, de nome "Son of a Slave: A Black Man’s Journey in White America". Ele estudou no Instituto Tuskegee, historicamente negro. Ele já ajudou a comandar um programa de alfabetização de adultos no Alabama e já dirigiu uma iniciativa de combate à pobreza no condado rural e pobre de Lowndes.
O pai, Abram Smith, era um funcionário federal aposentado, nascido em Massies Mill, uma pequena comunidade a sudoeste de Charlottesville, na Virgínia. Ele nunca soube precisamente sua data real de nascimento — infelizmente como muitas pessoas escravizadas — mas sabia que havia sido por volta de 1862 ou 1863. Ele faleceu vítima de um atropelamento de carro quando tinha 6 anos.
Por suas vivências, Daniel Smith foi até mesmo chamado de "Forrest Gump negro", pelos inúmeros acontecimentos históricos que presenciou. Em 1963, ele tomou parte na Marcha a Washington, em 1965 atravessou a ponte Edmund Pettus, em Selma, no Alabama, com Martin Luther King Jr, e esteve na plateia para assistir à posse de Barack Obama, em 2009.
Daniel Smith viveu, entre outras, uma situação de racismo em 1950, enquanto tentava salvar a vida de uma mulher. Ele trabalhava num acampamento da Associação Cristã de Moços no Connecticut e viu uma mulher branca ser resgatada de uma pedreira inundada. Ela estava desmaiada, mas ainda viva.
Um policial branco o viu e mandou que parasse, o que resultou na morte da mulher.
"Isso é racismo no máximo", disse Martin Dobrow, professor do Springfield College, para um artigo em 2020. "Ele deixou a garota morrer, preferindo isso a ver um negro tocar os lábios dela. Nunca me esquecerei disso.", contou o professor da instituição onde Daniel estudou.