Em decisão histórica, soldados peruanos foram sentenciados por crimes contra a humanidade cometidos há quatro décadas durante a guerra civil no Peru
Publicado em 20/06/2024, às 10h39
Em decisão histórica, dez soldados foram considerados culpados em um tribunal em Lima, no Peru, acusados de terem cometido crimes contra a humanidade há quatro décadas, durante a guerra civil no Peru. O julgamento ocorreu na quarta-feira, 19, e marcou o encerramento do caso Manta y Vilca — nome das comunidades que sofreram nas mãos dos soldados.
Esse caso, segundo o The Guardian, é o primeiro processo coletivo no Peru em torno do uso de violência sexual em massa no país, durante o conflito do Estado com os rebeldes de Sendero Luminoso — um partido político de esquerda da época — finalizado no país. Ao todo, nove mulheres que foram vítimas iniciaram ações legais no tribunal.
Os ex-soldados acusados, por sua vez, foram condenados a prisão com penas que variam entre seis e 12 anos, além de serem obrigados a pagar 100 mil soles peruanos (mais de R$ 140 mil, na cotação atual) a cada uma de suas vítimas. Essas mulheres, no caso, eram quíchuas de uma comunidade rural andina, e eram adolescentes quando sofreram os abusos.
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Uma das vítimas que compareceu ao julgamento, Maria, disse no julgamento que foi estuprada várias vezes ao longo de anos quando adolescente, tendo passado inclusive por duas gestações nesse período. "Éramos meninas. E enviaram o exército para todas as zonas rurais, para vários departamentos, onde cometeram abusos. Abuso, estupro, tortura, assassinatos. Sou testemunha disso".
Agora, embora seja considerado um "marco importante" a condenação dos réus, Cynthia Silva — diretora do Demus, uma organização de direitos que representava três das mulheres que foram vítimas — menciona que este é só "um primeiro reconhecimento dos direitos destas mulheres", e que as sentenças, mesmo que existentes, ainda não são proporcionais aos crimes cometidos.
Quando falamos de crimes contra a humanidade, estamos a falar de atos de natureza tão grave, de dimensão tão elevada, que não podemos deixar de reconhecer que as penas correspondentes a estes atos gravíssimos também devem ser, portanto, graves", acrescenta ao The Guardian.
Segundo o Ministério da Justiça do Peru, mais de 5.300 pessoas sobreviveram às violações de direitos humanos de décadas atrás, além de que, dos casos de violações de direitos humanos, 83% são de responsabilidade das forças armadas — outros grupos atuantes na guerra civil também cometeram estes crimes, embora em menor quantidade.
Porém, o veredito chega em um momento em que os direitos humanos são pautados no Peru, visto que no início deste mês o congresso peruano votou a aprovação de um projeto de lei que sujeita à prescrição crimes contra a humanidade cometidos antes de 2002; agora, este projeto aguarda uma segunda votação, e é criticado por uma série de organizações de direitos humanos.