Em entrevista ao site AH, Andreia Vigo, Coordenadora do Programa Modernismo Hoje, falou sobre os bastidores do evento
Em fevereiro de 1922, há exatos 100 anos, o Theatro Municipal de São Paulo recebeu a Semana de Arte Moderna. Com o passar dos anos, o evento se tornou um dos mais importantes na história da arte brasileira, principalmente quando falamos de inovação.
Na época, com a fase do país caracterizada pela política do café-com-leite, a Semana de 22 foi financiada pela elite paulistana. Interessada em tornar São Paulo uma referência na criação cultural, a oligarquia cafeeira viu uma grande oportunidade.
Em homenagem à data, então, o site da Aventuras na História conversou com Andreia Vigo, Coordenadora do Programa Modernismo Hoje, da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, para lembrar dos bastidores da histórica semana.
Andreia também é representante da Agenda Tarsila, iniciativa que ela própria definiu como "o braço fundamental do programa" da Secretaria de Cultura. Nesse sentido, a agenda reúne eventos e atividades que celebram os 100 anos da Semana de Arte Moderna — como a exposição Portinari por Todos.
Com quase 5 mil obras de Candido Portinari em formato audiovisual, segundo narrou a coordenadora do Programa Modernismo Hoje, a mostra do MIS Experience promete garantir aos seus visitantes uma "experiência imersiva no universo do artista".
Durante a conversa exclusiva sobre a Semana de Arte Moderna de 22, então, Andreia revelou 10 curiosidades que poucas pessoas conhecem acerca do evento — citando até mesmo acordos feitos por artistas por trás das cortinas. Confira abaixo!
Ao contrário do que podemos imaginar, “a Semana de Arte Moderna não foi uma semana de programação”, conforme explicou Andreia.
Curiosamente, um dos maiores eventos da história da arte brasileira durou apenas três dias. “Ela teve uma exposição que durou uma semana, mas as apresentações foram nos dias 13, 15 e 17”, disse Vigo.
Considerado o maior expoente da música modernista no Brasil, “Villa-Lobos foi o único artista a receber um cachê para se apresentar na Semana de 22”, segundo Andreia.
“Ele tinha uma máxima que era: ‘Música de graça é desgraça’, então ele se recusava a se apresentar de graça”, narrou a especialista.
Após ser pago por suas apresentações, Villa-Lobos cantou para o público três vezes. Na última delas, “subiu no palco calçando chinelo em um pé e sapato no outro”.
Diante da cena, diversos espectadores criticaram o compositor, vaiando o artista e afirmando que “aquela era uma forma modernista de se apresentar”.
Acontece que, de acordo com Andreia, a ideia de Villa-Lobos nunca foi chocar o público com seus calçados. “Ele estava com um problema de calo inflamado no pé e, por isso, subiu no palco com a sandália”, explicou a coordenadora.
Formado em Direito em 1919, Oswald de Andrade foi um dos maiores nomes da Semana de Arte Moderna de 22. E, para garantir que seu nome nunca fosse esquecido, ele teve uma ideia inusitada. “[O poeta], que adorava polêmica, contratou estudantes para atirar tomates nele durante suas apresentações”, lembrou Andreia.
Graça Aranha, que escreveu duas obras muito importantes para inspirar o modernismo brasileiro — 'Canaã' e 'A Estética da Vida' —, não apenas participou da Semana de Arte Moderna de 22, como ainda foi o responsável pelo discurso inaugural do evento.
O problema é que, segundo Andreia, a motivação do escritor foi bastante distinta.
“Ele afirma que não foi por amor à arte. Na verdade, ele estava apaixonado pela irmã do Paulo Prado, o aristocrata que foi o grande apoiador do evento”, explicou Vigo.
Paulo Prado, que também era escritor e poeta, foi um dos primeiros a "perceber que a arte brasileira precisava de uma atualização, em especial na poesia, que era o campo dele". “Ele acreditava que o parnasianismo estava muito atrasado”, afirmou Andreia.
Foi sua esposa, no entanto, quem comentou sobre eventos semelhantes à Semana de Arte que aconteciam na Europa.
“Dizem, então, que Di Cavalcanti pescou esse comentário dela e começou a formatar a Semana de Arte Moderna, com exposições, música e recitações de poemas”, narrou a coordenadora do programa.
Segundo Andreia, é importante pontuar que a Semana de 22 aconteceu no mesmo ano em que se comemorou o centenário da Independência do Brasil.
“Isso tem muito a ver com essa ideia de independência da arte brasileira. Esse foi um dos pontos que os modernistas pensaram”, lembrou ela.
Maior crítico literário do país, Antonio Candido foi uma das pessoas que defendeu o legado da Semana de 22. No ensaio ‘Literatura e Cultura de 1900 a 1945’, o escritor definiu o evento como um divisor de águas na cultura brasileira do século 20.
Convidado para a Semana de 22, o pintor e colecionador Yan de Almeida Prado chegou até mesmo a criar um esboço do evento. Pouco depois, no entanto, ele tornou-se crítico da Semana de Arte.
Em 1972, por exemplo, afirmou que "a Semana de Arte Moderna pouca ou nenhuma ação desenvolveu no mundo das artes e da literatura".
O pintor Vicente do Rego Monteiro, por sua vez, enviou oito de suas obras para a mostra sediada pela Semana de 22, que foram expostas no Theatro Municipal. O próprio artista, no entanto, não compareceu ao evento, já que morava em Paris.
Ao contrário de Villa-Lobos, que recebeu por suas apresentações, os investidores da Semana de Arte de 22 tiveram que arcar com algumas dívidas após o evento.
Acontece que segundo o jornal A Gazeta, a semana gerou um déficit orçamentário de 7 contos de réis — que, na época, era um valor considerável.