A união das duas é, até hoje, a única a ter sido oficializada pela instituição religiosa
1. Começo
A história de um dos romances mais surpreendentes do século 19 começou em uma escola de magistério na cidade de Coruña, na Espanha. Na década de 1880, Elisa Sánchez Loriga e Marcela Gracia Ibeas se conheceram no colégio, onde a primeira estudava e a segunda trabalhava, e se apaixonaram rapidamente, em um período onde esse romance era ainda mais tabu perante a sociedade.
Quando perceberam que a paixão era recíproca, começaram a viver uma história de amor, mesmo com todas as privações. Durante muito tempo, viveram juntas em apenas uma casa, no anonimato por anos até que decidiram estabelecer a relação oficialmente no Estado — e, consequentemente, na Igreja.
2. Estratégia para o casamento
Elas tiveram que desenvolver uma estratégia para poderem se casar na Igreja. De fato, naquela época, relações entre pessoas do mesmo gênero ainda não eram reconhecidas, isso apenas aconteceu em 1998, na Espanha.
No dia 6 de junho de 1901, Elisa vestiu-se como se fosse um “homem” e foi até o padre da região, pedindo que a batizasse. Ela disse que seu nome era Mario, e que queria se converter. Dois dias depois, o mesmo jovem voltou ao clérigo pedindo que o casasse com a moça que vivia fazia alguns anos, Marcela. Ele não desconfiou, e, assim, firmou-se o primeiro — e único — casamento homossexual aprovado pela igreja.
3. Descoberta da farsa
"Após o casamento, elas deram um passeio e tiraram uma foto com José Sellier, um dos fotógrafos mais importantes da cidade. E voltaram a Dumbría, cidade onde Marcela trabalhou. Já na viagem, alguns passageiros descobriram que Mario era, na verdade, Elisa", explicou Narciso Gabriel, autor do livro Marcela e Elisa, muito além dos homens.
Depois da exposição da farsa do casamento, o anonimato acabou. Com isso, as pessoas da cidade começaram a interessar pela história peculiar, chamando até mesmo a atenção da mídia. Segundo Gabriel, “o caso teve uma grande repercussão não só na Galícia, mas também em Madri e na imprensa de outros países, como França, Bélgica e Argentina".
4. Fuga para Portugal
Como elas haviam enganado a igreja ao unirem em matrimônio como um casal heterossexual, as duas começaram a sofrer com represálias da igreja – mas também da polícia. Elas estavam sendo perseguidas pela justiça espanhola, e então decidiram fugir do país natal de ambas.
Dirigiram-se para a cidade do Porto, em Portugal, onde foram inocentadas dos crimes — Elisa por adulterar documentos e Marcela por encobrir o crime da amante. Mesmo assim, Portugal enviou as duas mulheres de volta para a Espanha quando o país pediu suas extradições. No entanto, pelo que se sabe, elas não voltariam mais para terras espanholas.
5. Segunda fuga
Mas elas não foram para a Espanha. Aproveitando a situação, partiram para a Argentina: Elisa chegou em 1903, e Marcela, pouco tempo depois. Ela, porém, estava acompanhada: uma criança desembarcou com a mulher no país latino-americano, que havia nascido em janeiro de 1902, apenas seis meses depois do casamento.
O mistério dessa criança nunca foi plenamente resolvido — assim como o destino das duas mulheres que se casaram na igreja católica. Para o escritor Narciso Gabriel, existem duas possibilidades. Na primeira, Marcela teria engravidado de um jovem da cidade e Elisa teria assumido o bebê.
"A segunda hipótese, que é a que eu mais gosto, mas reconheço que não tenho base para sustentá-la, é que poderia se tratar de uma gravidez premeditada. Ou seja, Elisa e Marcela não se conformavam em se tornar marido e mulher sem ter filhos", explica.
6. Final infeliz
Mesmo depois da longa história, o final das duas provavelmente não foi feliz. Documentos históricos apontam que Elisa se casou novamente na Argentina, mas dessa vez com um homem. Sobre Marcela, nada se sabe após sua chegada no país.
Segundo aponta Narciso Gabriel, o matrimônio entre Elisa e o indivíduo de origem dinamarquesa não deu certo. Ela não queria ter relações sexuais com ele, e, algum tempo depois, ele acabou descobrindo que ela era uma das protagonistas de um dos casamentos mais polêmicos da Espanha.
“Ele denunciou sua esposa e pediu a anulação do casamento. O juiz decidiu que Elisa, então Maria, deveria ser examinada por três médicos. A conclusão foi de que ela era mulher e que o casamento era perfeitamente válido”, afirmou Gabriel. Depois disso, as evidências de Elisa e Marcela praticamente desapareceram na história: não se sabe o que aconteceu com as duas mulheres que desafiaram os dogmas da igreja católica.
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