Pinturas de Kim Jong-Il ressuscitam realismo socialista
Texto Wagner Gutierrez Barreira e Marina Darmaros, de Moscou Publicado em 18/12/2012, às 15h53 - Atualizado em 23/10/2017, às 16h36
Caro leitor, dê uma olhada atenta na imagem acima. Veja que cavalheiro sorridente, adorado por criancinhas felizes. Era assim que os norte-coreanos conheciam seu líder - um dos mais cruéis ditadores de todos os tempos, que deixou parte da população morrer de fome para investir nas Forças Armadas, assassinou oposicionistas, viveu em permanente estado de guerra contra o resto do mundo, herdou o governo do pai e o legou ao filho numa espécie de socialismo hereditário. O Era Kim Jong-Il, que morreu de ataque cardíaco em dezembro. Se o socialismo soviético sofre para sobreviver em uns poucos países, na Coreia do Norte ele parece ter sido congelado no tempo. Mais precisamente nos anos 1940 - e a estética que reforça essa sensação veio diretamente de Moscou, o realismo socialista, uma espécie de Photoshop malfeito da realidade.
O estilo nasceu na década de 30, obra do comissário do ditador soviético Josef Stalin para a arte e propaganda Andrei Jdanov. O objetivo era mostrar como o novo homem, fruto do comunismo, era feliz, forte e heroico. A estética seguia os 4 pilares da arte marxista: era preciso retratar o belo, o trágico, o heróico e o sublime. "A arte foi dominada pelos heróis do trabalho. Retratavam-se apenas os trabalhadores garbosos do futuro. Não há nenhum experimento, nenhuma abstração. Tudo deve ser compreensível e exato", explica a galerista Natália Bykova, que vive em Moscou e vende obras do gênero. A estética caiu no ostracismo depois da morte de Stalin e saiu da história para virar piada ¿ o mundo, retratado de forma perfeita, era um horror na realidade. À medida que os crimes de Stalin vinham à tona, os valores estéticos que sustentavam o regime saíam de moda.
"Era assim que os norte-coreanos viam seu líder", escreveu o correspondente do jornal espanhol El País na China, José Reinoso, que publicou as imagens no site do jornal. O viam em meio a sorrisos, a gente feliz (com ou sem farda), em um país de abundância, como em qualquer propaganda política do mundo, só que bem mais exagerada ¿ e num país onde o exagerado é a fome e a truculência do governo. Kim Jong-Il era retratado como um chefe generoso e humilde, sempre disposto a ouvir e aprender com seu povo. Nada mais mentiroso. "A questão da temática e da composição é tão extremamente similar às pinturas dos tempos do realismo socialista que se poderia apenas trocar os rostos das pinturas por russos", comenta a galerista Natália. Por uma gentileza do jornal El País, AVENTURAS NA HISTÓRIA publica as imagens de Kim Jong-Il com exclusividade no Brasil.