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Futebol: Ligações perigosas

Estudo inédito mostra que, em trocade ajuda financeira, seleção alemã fechouos olhos para as atrocidades de Hitler

Wilson de Oliveira Junior Publicado em 01/06/2006, às 00h00 - Atualizado em 23/10/2017, às 16h36

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Aventuras na História - Arquivo Aventuras
Aventuras na História - Arquivo Aventuras

Sessenta e um anos após o fim da Segunda Guerra, a relação entre o futebol alemão e o nazismo veio finalmente à tona. Ao mesmo tempo em que a Alemanha se preparava para a Copa do Mundo, que tem início dia 9 deste mês, um grupo de pesquisadores mergulhou em 40 diferentes arquivos e provou que a convivência entre o esporte e a política de Adolf Hitler era mais profunda do que se imaginava.

O estudo foi feito pelos historiadores alemães Nils Havemann e Klaus Hildebrand a pedido de Theo Zwanziger, presidente da Deutscher Fussball-Bund (DFB), a federação alemã de futebol, e do ministro do Interior Otto Schily. O resultado deu origem a Fussball Unterm Hakenkreuz – Der DFB Zwischen Sport, Politik Und Kommerz (“Futebol sob a suástica – DFB entre o esporte, a política e o comércio”), recém-lançado por lá e inédito no Brasil.

O estudo de Havemann, que leva em conta as relações entre futebol e nazismo entre 1933 e 1945, destrói a tese defendida pela própria DFB de que o futebol alemão teria sido apolítico durante os anos do nazismo. De acordo com o pesquisador, a entidade contribuiu, sim, para o nazismo, quando optou por apoiar a política de Hitler.

O início da relação da federação com o regime nazista, a bem da verdade, quase nada teve de ideológico – era, isso sim, baseado em dinheiro, já que a crise mundial iniciada com a quebra da Bolsa de Nova York em 1929 tinha deixado a entidade com os cofres vazios. A partir de 1933, a DFB se apoiou em Hitler, que acabara de assumir como chanceler, com a intenção de garantir sua sobrevivência.

O nazismo, por sua vez, via no futebol um excelente instrumento de propaganda. Em 1936, no entanto, os nazistas perderam o interesse na DFB e, aos poucos, estatizaram-na e expulsaram os antigos funcionários. Nunca ficou claro se isso teve ou não a ver com as vitórias do atleta negro americano Jesse Owens em provas de velocidade e salto nos Jogos Olímpicos de Berlim – o que fez fracassar o plano de provar uma suposta superioridade da raça ariana através do esporte.

Segundo Havemann, a contribuição da DFB para o avanço do nazismo se devia mais à ambição de alguns de seus funcionários do que propriamente à aceitação da ideologia. Um exemplo é Josef “Sepp” Herberger. Apesar de saber das atrocidades cometidas pelo regime, ele só pensava em virar técnico da seleção alemã – o que conseguiu em 1937. Herberger chegou a conquistar a Copa de 1954, e se aposentou em 1964.

Havemann também conta que o próprio Hitler raramente ia aos estádios para assistir aos jogos. Depois da Olimpíada de 1936, quando a Alemanha perdeu por 2 a 0 para a Noruega, o Führer ficou tão furioso que nunca mais quis saber de futebol.

Craque de papel

Austríaco senegou a jogar pelosnazistas e foi morto

O talentoso atacante Matthias Sindelar, louro, alto, magro, de pernas e braços muito finos – e, por isso, conhecido como Der Papierene, ou “homem de papel” –, se transformou num símbolo da resistência da Áustria durante a ocupação pela Alemanha nazista. Judeu e pobre, virou astro atuando pelo poderoso Austria Viena, clube ligado à classe média judia austríaca, e pela seleção do país. Tudo mudou em 1938. A Áustria havia se classificado nas eliminatórias da Copa da França, mas o país foi anexado pela Alemanha de Hitler logo depois. Assim, vários jogadores passaram a defender a seleção alemã. Menos Sindelar. Nacionalista extremado, ele se negou a defender o time do Führer. A recusa o deixou duplamente marcado: como judeu e como opositor do nazismo. Mas Sindelar não esmoreceu. Tanto que, no jogo “comemorativo” pela unificação dos dois países, errou várias jogadas de propósito até marcar, no segundo tempo, um dos gols da vitória por 2 a 0 do time austríaco Ostmark sobre o alemão Altreich. A atitude foi tomada como uma afronta ao Terceiro Reich. Em 23 de janeiro de 1939, aos 35 anos, Matthias e sua namorada, Camila Castagnola, foram encontrados mortos num quarto de hotel. O laudo oficial apontou envenenamento por monóxido de carbono. Ainda há suspeitas de que Sindelar teria sido executado pela Gestapo, a polícia secreta nazista. A tragédia o transformou num mito na Áustria.