A ayahuasca gera controvérsia desde o século 16
Entre 1000 a.C. e 500 a.C., os índios da Amazônia peruana experimentavam misturar cipós e folhas para criar uma bebida. De gosto amargo e forte, a infusão final passou a ser usada pelos líderes durante os rituais religiosos, fazendo-os se sentirem capazes de contatar os mortos e promover a cura. Batizada de ayahuasca, que na língua quíchua (falada na região central dos Andes) significa "vinho das almas", ela é popularmente conhecida hoje como santo-daime. Passados pelo menos 2,5 mil anos de sua invenção, o chá mantém a aura religiosa (e polêmica) do seu uso. "A forma de preparo continua sendo basicamente a mesma", diz Henrique Carneiro, professor da Universidade de São Paulo e autor de Pequena Enciclopédia da História das Drogas e Bebidas. Mas há um porém: apesar de ser consumida por 70 diferentes povos indígenas e de estar difundida por toda a América do Sul, a ayahuasca é famosa por seus efeitos alucinógenos. No Brasil, ela é consumida por 40 mil pessoas, divididas em quatro grandes seitas: Santo Daime, União do Vegetal, Natureza Divina e Barquinha.
Seus ingredientes, as folhas de chacrona e o cipó-caapi (substituível por mariri ou jagube), são plantados da Amazônia ao interior de São Paulo. E, se foi preservada e difundida, é porque o chá escapou da pressão dos colonizadores europeus. "É plausível acreditar que a ayahuasca possa ter sobrevivido em nichos isolados durante esse período de grandes transformações pós-Conquista", afirma Alexandre Camera Varella, pesquisador do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos. No Brasil, o uso do chá é permitido para fins religiosos desde 1992 - do contrário, é considerado um psicotrópico e é proibido. Nas últimas décadas, a bebida foi difundida entre intelectuais e artistas e seu uso vem sendo pesquisado como uma ferramenta para o tratamento de alguns problemas mentais e para a dependência de drogas - resultados preliminares das pesquisas do Programa de Orientação e Assistência ao Dependente da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) apontam melhora no quadro de dissociação da realidade em pacientes esquizofrênicos.
Bebida milenar
O chá é ingerido por tribos desde antes de Cristo
De 1000 a.C. a 500 a.C.
Índios da Amazônia (no Peru) misturam um cipó e uma folha. A bebida alucinógena é usada em cerimônias religiosas.
Século 16
Os jesuítas entram em contato com tribos da Amazônia que consomem chás alucinógenos. Seus relatos não são favoráveis.
1616
O uso da ayahuasca é condenado pela Santa Inquisição.
1858
O geógrafo equatoriano Manuel Villavicencio é o primeiro a descrever os efeitos do chá com detalhes.
1913
Raimundo Irineu Serra entra em contato com a ayahuasca. Em 1920, ele funda a primeira igreja do Santo Daime.
1961
O seringueiro baiano José Gabriel da Costa funda a União do Vegetal - hoje o maior grupo brasileiro de adeptos da bebida.
1963
Os poetas beatnik William Burroughs (dir.) e Allen Ginsberg publicam The Yage Letters, com cartas sobre os rituais de que participaram.
1992
Após sete anos de estudos, o Conselho Federal de Entorpecentes libera o uso religioso do chá no Brasil.