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Curiosidades / Beatles

Segregação fez Beatles incluírem uma cláusula contratual em shows

Em 1964, a banda não aceitou o segregacionismo na plateia de um show em Jacksonville, nos EUA: “Nós nunca tocamos para públicos segregados e não vamos começar agora”

Isabela Barreiros, sob supervisão de Thiago Lincolins Publicado em 17/03/2021, às 09h36 - Atualizado em 04/06/2022, às 05h00

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Os Beatles em julho de 1964 - Getty Images
Os Beatles em julho de 1964 - Getty Images

Foram necessárias décadas de luta por uma sociedade igualitária para que o então presidente dos Estados Unidos, Lyndon B. Johnson, assinasse a Lei dos Direitos Civis em 2 de julho de 1964. O documento estabelecia o fim da segregação racial no país, que vigorava desde a abolição da escravidão, no século 19.

Movimentos de direitos civis passaram a questionar abertamente a política oficial de estado ao longo dos anos de 1950 e 1960, organizando enormes protestos contra o regime de segregação racial, ou apartheid. Como resultado, a legislação foi alterada, mas isso não significava que, na prática, as coisas mudariam tão rápido assim.

Se nos dias de hoje os Estados Unidos ainda enfrentam um enorme problema relacionado ao racismo de sua sociedade, é possível imaginar que demorou para que as novas regras que colocaram fim às Leis de Jim Crow fossem, de fato, levadas a sério e colocadas em prática.

Algumas pessoas se recusavam a aceitar o fim da segregação no país, o que se espalhou em estabelecimentos, e inclusive, em um show dos Beatles, marcado para 11 de setembro de 1964, pouco mais de dois meses depois de Johnson assinar a Lei dos Direitos Civis.

Os Beatles quando chegaram em Nova Iorque, em 1964 / Crédito: Wikimedia Commons

Show segregado

Naquele ano, os Beatles também tinham se tornado uma atração mundial com sua apresentação no programa de TV do apresentador estadunidense Ed Sullivan, que conquistou uma audiência histórica. Com a explosão da beatlemania, os músicos marcaram sua primeira turnê nos Estados Unidos.

O que eles não esperavam era que a plateia do show do dia 11 de setembro, que aconteceria no estádio Gator Bowl, na cidade de Jacksonville, na Flórida, estaria segregada: negros e brancos estariam divididos, mesmo que tal política já tivesse sido abolida.

Foi então que a banda se negou a subir no palco. Eles estavam dispostos até mesmo a cancelar o show caso negros não pudessem assistir ao show de qualquer lugar do estádio. Na época, John Lennon disse: “Nós nunca tocamos para públicos segregados e não vamos começar agora”, conforme repercutido pelo portal Ultimate Classic Rock.

As autoridades perceberam que eles não cederiam e foram obrigadas a permitir um público misto, sem segregação. Somente assim, os Beatles decidiram entrar para finalmente fazer o show: com uma audiência unificada.

“Não gostávamos de preconceito”, disse Paul McCartney em uma entrevista de 1966, segundo noticia a Rolling Stone. “Sempre estivemos interessados ​​em públicos mestiços. Com essa atitude, compartilhada por todo o grupo, nunca quisemos tocar na África do Sul ou em qualquer lugar onde os negros fossem separados. Não foi por causa de qualquer coisa boa; apenas pensamos: 'Por que você deve separar os negros dos brancos? Isso é estúpido, não é?”, questionou.

Paul McCartney em apresentação / Crédito: Wikimedia Commons

Depois de Jacksonville

Já estava claro para os Beatles que eles não cantariam para plateias divididas por raça, mas o episódio em Jacksonville fez com que eles percebessem que isso não era tão fácil quanto parecia. 

Eles, então, passaram a incluir uma cláusula de contrato exigindo públicos integrados, abandonando o acordo falado que não funcionou no show dos Estados Unidos. A banda “não irá se apresentar na frente de um público segregado”, lia-se em um contrato dos artistas para a realização de um show em Cow Palace, na Califórnia, em 1965.

Embora os Beatles tenham acabado, o pensamento dos integrantes que ainda estão vivos não mudou. Em junho do ano passado, Paul McCartney relembrou o episódio de 1964 em uma postagem feita em suas redes sociais para apoiar manifestações por justiça racial que começaram após o assassinato de George Floyd, vítima de violência policial.

“Sinto-me enjoado e com raiva porque estamos aqui quase 60 anos depois, e o mundo está em choque com as cenas horríveis do assassinato sem sentido de George Floyd nas mãos do racismo policial, junto com os incontáveis ​​outros que vieram antes”, escreveu.

“Todos nós aqui apoiamos e estamos ao lado de todos aqueles que estão protestando e levantando suas vozes neste momento. Quero justiça para a família de George Floyd, quero justiça para todos aqueles que morreram e sofreram. Não dizer nada não é uma opção”, afirmou o músico.


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