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Matérias / Brasil

Da culinária a economia: A influência tropeira no país

Tropeirismo, que surgiu no século 17, foi responsável por transportar mercadorias e conectar os grandes centros econômicos às pequenas vilas

Jorge Antonio Salem Publicado em 13/10/2024, às 09h00

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Quadro "Rancho Grande (dos Tropeiros)", de Benedito Calixto - Museu Paulista da USP
Quadro "Rancho Grande (dos Tropeiros)", de Benedito Calixto - Museu Paulista da USP

O Brasil que conhecemos hoje não seria o mesmo sem o tropeirismo que surgiu no século 17. Sem esses trabalhadores anônimos, o amado feijão-carioca com linguiça, ovos e farinha de mandioca não existiria; o arroz carreteiro com carne-seca, bacon e tomate talvez não fosse tão popular; e o torresmo, fritura da pele e da gordura de porco, provavelmente seria encontrado somente em Minas Gerais e não estaria entre os petiscos mais amados nos bares do país.

Mas não é só na culinária que os condutores de carga marcaram a História: durante muitos anos, faziam as conexões entre os estados do Sul e do Sudeste, além de outras regiões.

Eram eles que levavam mercadorias de um lugar a outro e conectavam os grandes centros econômicos às pequenas vilas. Alguns até eram responsáveis por trazer e levar notícias aos moradores dos locais por onde passavam.

A origem

Porém, apesar de todas essas características, o tropeirismo surgiu com outra intenção. Numa época de plena expansão econômica, com a produção de ouro e diamante em Minas Gerais, a demanda por animais de transporte para o porto do Rio de Janeiro — por determinação da Coroa — era grande, mas havia uma questão: como era proibida a criação de muares no Brasil, o transporte passou a ser feito com os animais oriundos da Argentina, de Córdoba.

E, para que eles pudessem chegar ao Brasil, foram constituídas as tropas conduzidas por homens que traziam esses animais pelas picadas abertas. Era o início da profissão.

Foi a partir disso que diversas regiões do país passaram a se conectar. A principal estrada aberta, por exemplo, foi a Viamão Sorocaba, ligando o Rio Grande do Sul a Sorocaba, em São Paulo.

E ali, os animais eram comercializados na maior feira de muares do território. Chegou-se a negociar mais de cem mil mulas por ano, utilizadas para levar alimentos a Minas Gerais e trazer os metais preciosos para o porto do Rio de Janeiro, em Paraty. Esses animais eram muito procurados, pois podiam viver até os 35 anos e transportavam até 50% do seu peso.

Durante as viagens, o número de animais e trabalhadores variava: para se ter uma noção, 800 a 1000 mulas podiam ser conduzidas de uma só vez. E, durante esse percurso, muitas vilas iam se formando quando os condutores conheciam mulheres no meio do caminho e estabeleciam uma família.

Exemplo disso é o caso do tropeiro Cristovão Pereira de Abreu, que conduziu, em 1731, cerca de 3200 cabeças de gado e 132 homens do Rio Grande do Sul até Sorocaba, segundo Carlos Solera, idealizador do projeto Tropeiros Brasil. Essa viagem durou 13 meses e muitas vilas foram se formando a partir disso. Ao longo do tempo, tornaram-se cidades, com a rica miscigenação cultural.

No livro 'Tropeirismo e Geodiversidade no Paraná', Antonio Liccardo afirma que a profissão perdurou oficialmente até 1959. No entanto, há diversos tropeiros que deram a vida a esse serviço até o início do século 21.

Agora que sabemos um pouco mais da história desses homens e suas contribuições para o país, pergunto ao leitor: o que você come tem influência dos tropeiros? Pois se hoje nossa cultura alimentar e as tradições de diversas regiões brasileiras estão interligadas, é porque durante mais de três séculos milhares de condutores de tropas se dedicaram ao trabalho nas estradas e florestas ainda pouco conhecidas.

Fato é que esses trabalhadores se fazem presentes no nosso cotidiano — deixando uma marca atemporal (e quem sabe eterna) no país.