Recente invasão à Ucrânia reacendeu histórico russo sobre ataques à países vizinhos
Em meio a invasão à Ucrânia, principalmente após as chocantes imagens divulgadas das vítimas em Bucha, muito se tem discutido sobre os ataques cometidos pela Rússia ao longo da história. Embora a responsabilidade do país seja questionável em alguns episódios, em outros a própria nação admite sua culpa.
Um desses capítulos é conhecido como Massacre de Katyn. Em novembro de 2010, o parlamento russo assumiu que o ditador Josef Stalin ordenou que 22.000 oficiais poloneses fossem mortos em 1940.
"Os documentos publicados, que permaneceram por muitos anos nos arquivos secretos, não apenas revelam a amplitude desta terrível tragédia, como são uma prova de que o crime de Katyn foi cometido por ordem pessoal de Stalin e de outros dirigentes soviéticos", afirmou uma declaração do Parlamento, conforme repercutido pela agência France Presse.
O reconhecimento do massacre foi feito durante uma sessão na Duma, a câmara legislativa russa. A reunião, porém, gerou certa confusão, visto que o Partido Comunista da Federação Russa (PCFR) negou que o líder soviético estivesse envolvido com as mortes.
A responsabilidade desta matança foi atribuída, pela propaganda soviética aos criminosos nazistas, o que alimentou a revolta, a amargura e a desconfiança do povo polonês", prosseguiu o texto. Além do mais, o Parlamento manifestou uma "profunda compaixão com todas as vítimas desta repressão injustificável, com suas famílias e amigos".
"É um texto histórico para as relações russo-polonesas, mas é ainda mais para nós mesmos", completou Konstantin Kossachev, então chefe da comissão de Relações Exteriores do Parlamento.
O PCFR, em contrapartida, não concordou com o texto emitido pelo Parlamento, dizendo que o documento era "uma falsificação dos fatos históricos e uma revisão das conclusões do tribunal de Nuremberg".
Guennadi Ziuganov, líder do Partido Comunista, cargo que ocupa ainda hoje, rejeitou todas as acusações feitas contra Stalin. Em defesa do ex-líder soviético, Ziuganov afirmou que a nota apresentada por Lavrenti Beria, chefe da polícia secreta NKVD, que continha a assinatura do ditador e propunha a execução dos 20 mil oficiais poloneses, havia sido falsificada na década de 1990 por um grupo ligado à Boris Yeltsin, o primeiro presidente da Rússia pós-URSS.
Por anos, a União Soviética acusou a Alemanha nazista de ter sido mandante dos assassinatos. Entretanto, em abril de 1990, Mikhail Gorbachev, último líder da extinta União Soviética, reconheceu que seu país era o verdadeiro responsável pelos atos.
Com isso, o então presidente russo Dmitri Medvedev, segundo apontou o jornal econômico Vedomosti, informou que lançaria uma campanha de "desestalinização" da Rússia, para jogar uma luz sobre os crimes cometidos pelo ex-líder soviético, visto por muitos como um herói da pátria por ter vencido os nazistas na Segunda Guerra Mundial.
Durante a Segunda Guerra Mundial, na floresta de Katyn e em prisões em Kalinin e Kharkov, nas regiões da Rússia e Ucrânia, o mundo esteve diante de trágico episódio que, por muito tempo, foi negado pelos russos e seus aliados: o Massacre de Katyn.
Em 5 de março de 1940, Stalin, como reconheceu a Rússia em 2010, assinou uma ordem para autorizar o genocídio de aproximadamente 22 mil poloneses, incluindo oficiais do exército, engenheiros, advogados, professores universitários, entre outros membros da intelectualidade do país. Estima-se que 8 mil eram oficiais presos durante a invasão soviética da Polônia em 1939, 6 mil policiais e os demais faziam parte da elite.
Parte do território da Polônia estava sendo ocupado pela Alemanha Nazista, e a outra pela União Soviética. Na região dominada pelos soviéticos, os soldados foram, de imediato, rendidos e enviados para lugares específicos onde seriam presos e mantidos sob o controle da URSS por serem considerados uma ameaça.
A estratégia foi administrada pela NKVD (Comissariado do povo para assuntos internos, em português), o Ministério dos Assuntos Internos russo.
Em Katyn, eles atiraram na nuca de todos os prisioneiros, que foram enterrados em valas comuns da região. Enquanto isso, em Tver, os presos eram baleados em uma sala à prova de som, individualmente, e colocados em um caminhão do lado de fora, conforme repercutido pelo AllThatInteresting.
O historiador Gerhard Weinberg avalia que, no contexto histórico, uma explicação mais provável para o caso é que a União Soviética esperava, no futuro, ter novamente a Polônia em sua fronteira ocidental.
Stalin pretendia manter sua parte Leste e sabia que se o país em questão fosse revivido, não seria um episódio amigável. Por isso, privá-lo, de maneira drástica, de sua elite militar e intelectual o tornaria mais fraco.
"Uma explicação mais provável é que [o massacre] deve ser visto como uma expectativa para um futuro em que pode haver novamente uma Polônia na fronteira ocidental da União Soviética. De qualquer forma, Stalin podia ter certeza de que qualquer Polônia revivida seria hostil. Nessas circunstâncias, privá-la de uma grande proporção de sua elite militar e técnica a tornaria mais fraca", diz Gerhard Weinberg.
Em 1943, oficiais alemães receberam informações da existência de túmulos coletivos de poloneses na floresta de Katyn. Em seguida, uma investigação composta por um grupo de doze especialistas forenses de diversos países europeus comprovou o envolvimento dos soviéticos nos assassinatos. A história, no entanto, permaneceu em negação e silêncio e demorou a ser, finalmente, reconhecida, como mostramos no começo da reportagem.