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Completando 70 anos, o Diário de Anne Frank tem perturbado grupos puritanos dos EUA

Versão sem cortes passou por problemas por seu conteúdo 'explícito'

Fred Linardi e Fábio Marton Publicado em 25/06/2017, às 00h00 - Atualizado em 23/10/2017, às 16h35

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Uma das fotos menos conhecidas - Museu Anne Frank
Uma das fotos menos conhecidas - Museu Anne Frank

Após ser libertado pelo Exército Vermelho do campo de Auschwitz, o empresário judeu alemão Otto Frank retornou a Amsterdã. Lá sua ele vivera por 11 anos, dois deles escondidos com sua esposa Edith e as filhas Margo e Anne, num compartimento secreto do escritório da Opekta, sua empresa. Que então estava sob o nome de um "laranja" para evitar ser confiscada pelos nazistas, seu amigo e funcionário Victor Kugler. 

+ Em imagens: Um dia no esconderijo de Anne Frank 

Assim foi até um traidor entregá-los em agosto de 1944. Otto não via nenhum de seus familiares desde setembro, quando foram separados e enviados para os campos de morte. Acabou por constatar ser o único sobrevivente. 

Em um momento amargo e doce, recebeu a visita de Miep Gies, sua secretária, que com o já citado Victor Kugler, mais Johannes Kleiman e Bep Voskuijl, foi parte do grupo de holandeses que mantiveram vivos os judeus escondidos. Ela havia encontrado e guardado os diários (era mais de um caderno e várias folhas soltas) de sua filha Anne. Ao lê-lo, ficou surpreso com a precocidade dos pensamentos e estilo literário da filha. Decidiu editá-lo e prepará-lo para publicação, que aconteceu em 25 de junho de 1947. 

Até hoje, foram vendidas mais de 30 milhões de cópias em mais de 50 línguas e entrando no currículo das escolas do mundo todo. 

O diário começa pela manhã do dia 12 de junho de 1942, ao completar 13 anos, Anneliese Marie Frank desceu as escadas de sua casa e desembrulhou os presentes. Entre eles, havia um caderno. Nele, ela deixaria os escritos de seu cotidiano em Amsterdã, na Holanda, para onde se mudou com a família. Os Frank, judeus, haviam deixado a Alemanha natal em 1933, após a ascensão de Adolf Hitler. Em seus relatos, Anne contou como a vida da família mudou radicalmente com uma carta do partido nazista convocando Margot, sua irmã mais velha, de 16 anos, para trabalhar. Em 7 de julho de 1942, a família se viu obrigada a se mudar para um esconderijo, o “anexo secreto”, no escritório. Ficava atrás de uma prateleira móvel do escritório e seria o cenário para a maioria dos relatos da adolescente. 

Anne contou bem mais do que as pessoas de 1947 estariam dispostas a ouvir. Ou ao menos foi o que pensou seu pai, que publicou apenas 30% do material que recebeu. Muito do que a jovenzinha escreveu é absolutamente natural para alguém com essa idade, mas não batia com o que seria aceitável de uma jovenzinha pela moral sexual de 1947. E outra partes não batiam com a doce e inocente mártir que Otto queria eternizar, como seus comentários ácidos sobre sua mãe, o próprio pai (que fazia muitas piadas com puns) e um cassal de amigos de seu pai, a que ela tratou como pobres e cafonas.

A versão completa só sairia no aniversário de 50 anos da obra, em 1997. É essa a versão a causar polêmica.

Em 2010, a versão completa do Diário foi banida das escolas públicas de Culpeper County, Virgínia, EUA. Ela ficou disponível na biblioteca e a versão censurada voltou a ser a ensinada nas salas de aula. Em 2013, Gail Horalek, mãe de uma estudante da 7ª série em Northville, Michigan, iniciou uma campanha para banir o livro, acusando-o de ser "bastante pornográfico", dizendo que sua filha havia ficado chocada com a leitura. Ao menos seis outras tentativas judiciais de remover o livro do currículo foram registradas desde a versão completa.

Do que se trata, afinal? O diário vai dos 13 aos 15 anos da autora. E ela falou, com o perdão do trocadilho, muito francamente sobre as mudanças em seu corpo e seu nascente desejo sexual. 

Há passagens como "PS. Esqueci de mencionar a importante notícia de que provavelmente vou me menstruar em breve. Sei disso porque fico achando manchas esbranquiçadas na calcinha". Em outra parte, discute as brincadeiras sem graça da família ao ter de dormir num recinto com um homem mais velho, mostrando que entendeu perfeitamente o que queriam dizer. Anne mostra um interesse por um dos últimos ocupantes a compartilharem o esconderijo com a família, Peter van Pels, de 18 anos. Chegam a trocar um beijo. Discutem coisas como o nome do órgão masculino em alemão ou por que os livros didáticos não mostram vaginas.

E as partes que provavelmente perturbaram aos pais puritanos são sobre esse tema. Relatos da exploração do próprio corpo. Como: "Até eu ter 11 ou 12 [anos], não percebi que havia um segundo conjunto de lábios por dentro [da vagina]. O que era ainda mais engraçado é que eu pensava que a urina saía do clitóris. Perguntei para minha mãe o que aquele calinho era e ela disse que não sabia". Em outra parte, Anne aparece perplexa com a desproporção entre o tamanho do orifício em comparação com um pênis ou, pior, um bebê.

O último escrito de Anne data de 1º de agosto de 1944, três dias antes de a Gestapo, a polícia secreta de Hitler, invadir o esconderijo e enviar todos a campos de concentração. Anne foi levada com a família a Auschwitz, na Polônia, e depois, com Margot, ao campo de Bergen-Belsen, na Alemanha, onde morreu de tifo em março de 1945. O seu interesse amoroso, Peter, assim como a mãe, a irmã e todos os ocupantes menos o pai, teriam o mesmo destino.


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