Livro relata a insólita quantidade de drogas ingeridas pelo ditador
Vítor Soares, professor de História Publicado em 01/02/2022, às 18h02 - Atualizado em 12/08/2022, às 10h00
Dentre as inúmeras facetas do nazi-fascismo, o moralismo era de longe uma das que mais seduzia os europeus da década da primeira metade do século XX. Mas quanto desse discurso moralista não passava de uma ferramenta política?
Hoje não há mais discussão: Hitlerusava muita droga. No livro Delírio Total - Hitlere as Drogas no Terceiro Reich, de Norman Ohler compartilhou registros detalhados do dr. Theodor Morell, médico pessoal do Führer, sobre cada medicamento aplicado no ditador.
No Brasil o livro teve um título mais criativo: High Hitler - Como o Uso de Drogas pelo führer e pelos Nazistas ditou o Ritmo do Terceiro Reich, e nele há descrições detalhadas sobre como Hitler foi evoluindo na dependência química.
Como ele queria passar uma imagem de líder com vigor e viralidade, no início ele pediu para Morell apenas injetar glicose e vitaminas. Mas não demorou muito tempo para que a sua demanda aumentasse e, conquentemente, a oferta de drogas também tivesse que aumentar.
“Antes de todo grande discurso de sobriedade, o chanceler permitia-se uma ‘injeção de energia’ para funcionar da melhor maneira possível”, escreveu o dr. Morell.
Essas injeções de energia poderiam ser testosterona, metanfetamina, eukodal - um analgésico derivado da morfina - e mais para o fim da guerra, heroína e cocaína.
O livro de Ohler é minucioso quando fala da quantidade de drogas que Morell injetava no líder do partido Nazista. O diário do médico possui 885 notas sobre Hitler, escritas durante 1.349 dias. Nesse período, Hitler ingeriu mais de 1.100 medicamentos e recebeu mais de 800 injeções.
Além da grande quantidade de drogas ingeridas, assim como uma pessoa viciada, os rumos da sua vida acabam influenciando na quantidade e na variedade de drogas consumidas. Um exemplo disso foi quando Hitler perde a lendária Batalha de Stalingrado e começa a perder outros conflitos contra os soviéticos, ele pediu injeções de morfina - que causa euforia.
Inclusive, certa vez quando Hitler estava completamente drogado, ele decidiu pegar um avião e ir visitar o seu aliado de guerra: Benito Mussolini. O ditador alemão soube que Mussolini estava cogitando sair da guerra. Em entrevista à revista Veja, Normal Ohler disse:
"Isso aconteceu quando Hitler tomou pela primeira vez Eukodal, uma droga à base de ópio duas vezes mais forte que a morfina. Ele estava muito nervoso com a possibilidade de Mussolini sair da Segunda Mundial, levando consigo todo o exército italiano. Para ajudá-lo, Morell aplicou no patrão uma dose da droga que o deixou dele eufórico e confiante.
No encontro, Hitler falou por cerca de três horas sem parar. Se o líder italiano estava com medo, eu não sei, mas de fato ele não foi corajoso o suficiente para enfrentar a animosidade do alemão, porque ele simplesmente não aceitaria nenhum contra-argumento. A partir daí, as drogas passaram a abrir vantagem sempre para Hitler nas discussões, e se tornaram parte do coquetel diário dele."
É consenso entre os historiadores que as drogas usadas pelo líder do Terceiro Reich influenciaram os rumos da guerra. E analisando genericamente o desfecho do conflito, vê-se uma similaridade no desempenho alemão na guerra com o efeito que as drogas consumidas causavam em indivíduos.
Se no começo a Alemanha começou eufórica, veloz, com suas blitzkrieg impedindo que o seu inimigo consiga responder ao ataque, com o tempo a Alemanha foi se desgastando e perdendo o rítmo - assim como acontece com um usuário de metanfetamina.
E estava longe de ser Hitler o único usuário do exército alemão. Desde a invasão alemã à Polônia - fato que inicou a Segunda Guerra - os soldados nazistas recebiam metanfetamina aos montes. "Tornou-se tão natural quanto uma xícara de café”, escreve Ohler.
Um exército extremamente frenético pelo uso desenfreado das drogas explica bastante o desempenho alemão no começo da Guerra. Segundo Ohler escreve em seu livro, em menos de um 100 horas os nazistas tiveram mais conquistas territoriais do que os alemães em toda a Primeira Guerra Mundial.
++Da Guerra de Inverno ao ataque a Pearl Harbor: As vitórias que foram derrotas.
Mas a a euforia causada pelas drogas tem um fim. E um fim repleto de efeitos colaterais. Soldados tendo infartos, hipertensão, psicose e muitos outros efeitos causados pela droga cresciam em uma progressão geométrica entre os soldados alemães.
O mesmo acontecia com Hitler. No fim da guerra, complemente escravizado pelo uso das drogas e sabendo da chegada do exército vermelho em Berlim, decidiu tomar a sua última dose: cianeto - um veneno letal. Distribuiu para sua família e pessoas próximas, dentro de um bunker. Esperando a morte chegar. Fosse ela pelo veneno ou pelas mãos de um soldado comunista.
Mas a euforia causada pela quantidade das drogas em seu corpo e pelo sentimento da morte iminente, fez com que ele sacasse uma terceira opção e puxasse o gatilho contra sua cabeça. Talvez, a última dose do Führer não tenha sido o cianeto - mas sim a pólvora.
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A Metanfetamina foi desenvolvida em 1919, mas popularizada durante a Segunda Guerra Mundial. Quer conhecer outras 10 coisas que só existem por causa da Segunda Guerra? Ouça o podcast 'Desventuras na História' na voz do professor Vítor Soares.