No ano de 2021, a história de um professor decapitado falsamente acusado de islamofobia rodou o mundo; relembre o episódio
Redação Publicado em 28/11/2024, às 13h30
Em 2021, um episódio chocante reacendeu o debate sobre liberdade de expressão e segurança na França. Naquele ano, uma aluna de 13 anos, cujo testemunho precipitou uma série de eventos trágicos envolvendo o professor Samuel Paty, confessou ter fabricado sua acusação de islamofobia contra o docente. A revelação foi feita pelo advogado da jovem durante uma audiência judicial.
Em um depoimento revelado pela imprensa francesa, a estudante confessou que não estava presente na aula em que Paty exibiu charges do profeta Maomé durante uma discussão sobre liberdade de expressão.
A confissão da jovem veio à tona após uma audiência em novembro de 2021, onde foi acusada de "denúncia difamatória", cerca de um mês após o brutal assassinato do professor por Abdullakh Anzorov, um tchetcheno de 18 anos.
Conforme informações do jornal Le Parisien, a adolescente inventou sua versão dos fatos para justificar uma suspensão escolar por faltas excessivas. Alegou ter discutido com Paty devido a uma atitude que ele não tomou — exibir a classe "uma fotografia do profeta nu" e pedir aos alunos muçulmanos para se retirarem da sala.
Testemunhas presentes na aula, entretanto, desmentiram essa narrativa. Em uma aula de história e geografia, Paty instigou seus alunos a refletirem sobre dilemas contemporâneos relacionados à liberdade de expressão.
O ponto focal do debate foi a questão "ser ou não ser Charlie", aludindo ao slogan JeSuisCharlie, amplamente utilizado em solidariedade ao jornal satírico francês Charlie Hebdo.
O veículo de comunicação tornou-se alvo de um ataque terrorista em 2015, resultando na morte de 12 pessoas, um evento que suscitou discussões globais sobre os limites da liberdade de expressão e a violência extremista.
De acordo com os relatos, Paty havia informado aos estudantes muçulmanos sobre o teor potencialmente ofensivo das imagens e ofereceu-lhes a opção de fecharem os olhos ou deixarem a sala, respeitando suas crenças religiosas.
O pai da menina, ao ouvir a história falsa contada pela filha, divulgou vídeos nas redes sociais pedindo a demissão do professor e acusando-o de discriminação.
Com a repercussão online, a fake news chegou em Abdullakh Anzorov, imigrante tchetcheno de 18 anos que residia na Normandia. Inconformado com o que descobriu, viajou até Conflans Sainte-Honorine e identificou o professor.
Quando o docente saiu da escola em uma sexta-feira, Anzorov o decapitou a sangue frio. Já o criminoso acabou morto pelas autoridades da França horas após o ato bárbaro, com o crime classificado como terrorismo islâmico.
No começo do mês, iniciou-se no Tribunal Especial de Paris o julgamento de oito indivíduos acusados de incitar o assassinato de Paty, informou a RFI.
O processo judicial envolve dois jovens amigos do autor do crime, acusados de "cumplicidade em assassinato terrorista", podendo enfrentar penas de prisão perpétua. Outros seis réus respondem por "participação em associação criminosa terrorista", com possíveis condenações de até 30 anos de reclusão.
Entre os acusados está Brahim Chnina, marroquino de 52 anos e pai da aluna que iniciou a fake news. Outro réu notório é Abdelhakim Sefrioui, ativista islâmico franco-marroquino, que, junto com Chnina, ajudou a disseminar as mentiras nas redes sociais.
Sefrioui e Chnina estão presos há quatro anos sob a acusação de participação em uma "associação criminosa terrorista".
Em defesa de Sefrioui, o advogado Vincent Brengarth argumentou que seu cliente não conhecia Anzorov nem participou do ataque, pedindo que o julgamento resista às pressões da opinião pública.
Em um julgamento anterior no tribunal de menores, a filha de Chnina e cinco ex-colegas foram condenados a penas entre 14 meses e dois anos. Já Naim Budaoud e Azim Epsirkhanov, amigos próximos do assassino, enfrentam a possibilidade de prisão perpétua por auxiliarem Anzorov na aquisição da arma utilizada no ataque.
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