Cena de "Irmãos Menendez: Assassinos dos Pais" - Divulgação/Netflix
Irmãos Menendez

Irmãos Menendez: O que explica o sucesso do true crime?

Em nova temporada da série "Monstro", a plataforma de streaming Netflix reviveu o infame caso dos irmãos Menendez, condenado por assassinar os pais

Thiago Lincolins Publicado em 22/09/2024, às 12h00

Quem acessa o catálogo da plataforma de streaming Netflix neste final de semana encontra a série "Irmãos Menendez: Assassinos dos Pais" em primeiro lugar entre as mais assistidas por brasileiros.

A produção, que compreende a segunda temporada da antologia "Monstro", revive um dos crimes mais infames dos EUA: o assassinato de José e Kitty Menendez pelos próprios filhos, Lyle e Erik. Antes disso, a série retratou os crimes de Jeffrey Dahmer, um serial killer que matava jovens rapazes. 

Cena de "Irmãos Menendez: Assassinos dos Pais"

 

Nos últimos anos, a popularidade de filmes, séries, livros, documentários e, podcasts baseados em crimes reais, conhecidos como "true crime" ("crimes reais"), tem crescido exponencialmente.

Embora produções culturais sobre crimes que impactaram a sociedade não sejam uma novidade, há um aumento perceptível na demanda por esse tipo de conteúdo no streaming.

A questão que surge é: o que motiva as pessoas a se interessarem por relatos e detalhes de crimes hediondos como forma de entretenimento?

Em entrevista ao site Aventuras na História, Rubens Correia Jr., advogado, palestrante e criminólogo, explica que o ser humano, em diferentes escalas, demonstra atenção por atos que, muitas vezes, podem ser incompreensíveis.

Capa do livro "Serial Killers" - Editora Matrix

"Os crimes reais, violentos e principalmente aqueles mais inexplicáveis como, por exemplo, o parricídio (morte dos pais pelo filho – como o caso von Richthofen) matricídio (morte da mãe pelos filhos – caso Pesseghini), o filicídio (morte do filho pelos pais caso Andrea Yates) desafiam a nossa concepção de certo e errado e o que consideramos como normal. E, nos provocam, pois, nos obrigam a confrontar nossos piores sentimentos e desejos inconscientes", explica Rubens, autor de "Serial Killers - Como funciona a mente sombria dos assassinos em série".

O especialista também explica que a "brutalidade tem um grande poder de atração e assim desperta a atenção e curiosidade da população, para Freud isso se dá pela pulsão por morte, que é a nossa atração inconsciente pela destruição, que nos faz ver ou procurar por acidentes, tragédias, coisas apocalípticas (aqui entra, inclusive, filmes de fim de mundo, como zumbis etc.)".

Encarar o caos

O autor também destaca que existe um sentimento satisfatório do ser humano: a possibilidade de "encarar o caos e a destruição de maneira controlada e segura", além, claro, do desejo de entender o que leva a alguém a cometer atos extremos.

"Ou seja, ao assistir um documentário de serial killer na TV, o sujeito pode experimentar toda a maldade humana e brutalidade e continuar totalmente seguro, trazendo sentimentos (conscientes ou inconscientes) de excitação, tensão, sofrimento, mas, ao mesmo tempo, segurança e alívio. Outro ponto objetivo para se assistir ou consumir tantos produtos relacionados a crime é o desejo do sujeito de entender o que leva seu semelhante a ultrapassar todos os limites sociais, o que induz a todos a reflexões sobre os valores de nossa própria sociedade", explica ele.

Rubens explica que, paradoxalmente, o consumo de materiais voltados ao true crime cria uma "jornada de autoconhecimento, que nos faz experimentar sensações totalmente ambíguas de curiosidade e excitação, mas medo e tensão. Fascínio e repulsa".

O criminólogo também aproveita para evidenciar outro ponto importante: o criminoso, para a criminologia psicanalítica, se torna um "bode expiatório dos desejos análogos presentes no próprio expectador".

"Ao ver no sujeito a culpa que o precede, o espectador deseja a punição dele como forma de aplacar seus desejos análogos. Ou seja, algumas vezes, o que nos fascina reside no fato de que nosso inconsciente violento desejar o mesmo que o criminoso, assim o que vemos na tela tem um sentido de projeção. E isso é perturbador", continua o escritor.

Cena do filme 'A Menina Que Matou os Pais - A Confissão', que retrata o caso Richthofen - Divulgação Santa Ritas Filmes e Galeria Distribuidora

 

Sinal de alerta?

Muitos discutem que o fascínio em materiais sobre crimes reais seria um problema, no entanto, o criminólogo explica, que, na realidade, o consumo excessivo pode indicar um sinal de alerta.

É importante que o espectador não banalize a violência, enxergando crimes reais como um simples entretenimento. Além disso, assassinos e as respectivas vítimas dos crimes não devem se tornar ícones da cultura pop, ou seja, um produto de consumo, explica Rubens. 

O espectador não pode ser levado a dessensibilização. Ao ponto de se sentir imune ao sofrimento que o cerca. As tragédias da vida cotidiana nunca devem ser normalizadas, assim como não podemos transformar homicidas bárbaros em heróis (ou mesmo anti-heróis)", explica.
Silvero Pereira no filme "O Maníaco do Parque" - Divulgação/Amazon Prime Video

 

O consumo também pode ser prejudicial se impactar a saúde mental do telespectador, potencializando as angústias e até mesmo apresentando gatilhos.

"O telespectador tem sempre que refletir se seu consumo não é uma tentativa de projetar seus desejos mais reprimidos ou suas próprias ansiedades. Mas, aqui, definitivamente, o equilíbrio será o ideal. As produções devem, sim, ser consumidas e tem papel relevante em nosso inconsciente (individual e social), pois é a partir do confronto com a verdade da violência que nos cerca que podemos compreender a sociedade em que vivemos. De tal modo, o problema reside na banalização do sofrimento e não no consumo de produções que rememoram crimes", afirma.

 

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