Detestada pela corte portuguesa, odiada pelo povo, a mulher que ficaria conhecida como A Megera de Queluz, chegava a consumir 20 litros por dia do coquetel de lima, açúcar e cachaça
M.R. Terci Publicado em 01/02/2020, às 10h00
A simples menção de seu nome traz à imaginação um cortejo de caprichos indecorosos e intrigas políticas. Nascida em 1775, no Palácio Real de Arajuez, na Espanha, Carlota Joaquina Teresa Cayetana foi uma mulher que nunca se resignou a ser aquilo para qual nascera. Esposa de Dom João VI, rainha consorte do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, sem dúvida, viria a se tornar um dos maiores estorvos da vida do rei, não tanto pelo cinismo e pelo desejo imoderado de poder, quanto pela pertinácia em alcançar seus fins e pela dureza de seu espírito.
Não há nos anais da história portuguesa um monarca que fosse tão ignominiosamente enganado pela esposa. Dentre tantas qualidades odiosas, a depravação messalínica da rainha se sobressaia aos olhos do povo, que a acusava de promiscuidade e de influenciar o marido a favor dos interesses da coroa espanhola.
Dom João abriu os portos da colônia ao comércio estrangeiro, tornando possível o desenvolvimento e prosperidade do Brasil, muito embora, concomitantemente, pelo paço real andasse a perfídia, ambição e luxuria ninfomaníaca de Carlota Joaquina que se ocupava em sonhar com o trono do Vice-Reino Independente de Buenos Aires. Misto incongruente de Penélope e Messalina, a rainha jamais gostou do Brasil e fez de tudo para que essa terra não passasse de uma colônia.
Dia após dia, cada vez mais afastada dos desejos e aspirações do marido, Carlota não suportava o calor e frequentemente ouviam-na gritar que ficaria cega quando voltasse para Lisboa, por estar há tantos anos “no escuro, vendo somente negros”.
Prezemo-nos pensar, contudo, com manifesta generosidade, que a passagem de Carlota Joaquina pelo Brasil não tenha sido apenas negativa. Conta-se que a rainha portuguesa foi a responsável pela invenção da caipirinha, mandando, pois, misturar frutas com cachaça para fazer compotas e ingerindo litros da mistura com gelo para se refrescar. Documentos mostram que a lista de compras da cozinha do palácio onde vivia era encabeçada por imensas quantidades de aguardente de cana.
Detestada pela corte portuguesa, odiada pelo povo, a mulher que ficaria conhecida como A Megera de Queluz, chegava a consumir 20 litros por dia do coquetel de lima, açúcar e cachaça.
M.R. Terci é escritor e roteirista; criador de “Imperiais de Gran Abuelo” (2018), romance finalista no Prêmio Cubo de Ouro, que tem como cenário a Guerra Paraguai, e “Bairro da Cripta” (2019), ambientado na Belle Époque brasileira, ambos publicados pela Editora Pandorga.
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