O cidadão que fosse visto lendo, transportando ou transferindo o livro para outra pessoa poderia passar até sete anos na cadeia
Wallacy Ferrari Publicado em 11/03/2020, às 12h30
Durante seus longos anos de existência, a União Sovietica publicou e adicionou novos livros, filmes e músicas em sua lista de censura de obras. Todo tipo de expressão artística que fosse avaliada como obras que continha fatores “imorais”, “anti-éticos” e com “propaganda anti-soviética”, seria adicionadas a lista e, consequentemente, retiradas de comercialização.
Em casos específicos, detentores de obras eram obrigados a devolver os livros ao governo para destruição. As escritas eram avaliadas por uma comissão do governo e, as vezes, tinha critérios duvidosos; Julio Iglesias, por exemplo, foi proibido em 1985 por neofascismo, mesmo sem nunca ter se posicionado sobre qualquer doutrina fascista.
Entretanto, em 11 de março de 1931, a lista foi atualizada contendo a obra literária mais vista na história da humanidade: a Bíblia. Sua venda e circulação foi proibida em todo o território da URSS com a justificativa de que as ideias contidas no Sagrado eram opostas as ideias de Lenin e Marx, mesmo sendo anacrônica ao tempo que ambos viveram.
Não apenas foi proibida de circular, mas qualquer cidadão soviético que fosse visto passando o livro para outro leitor ou até mesmo lendo, iria direto a prisão. Na lista, havia outras obras básicas religiosas, não somente do cristianismo, mas também do judaísmo e da religião mulçumana: como o Torá e Alcorão.
As punições severas para quem fosse encontrado com escritas banidas, de acordo com o Código Penal da URSS de 1922, seriam de, no mínimo, seis meses de reclusão. Em casos de obras explicitamente contrárias ao regime, o leitor seria julgado com penas que poderiam chegar a sete anos na prisão e até exílio de cinco anos.
Essa perseguição às religiões com maiores números de adeptos não foi exclusiva; religiões com qualquer atuação considerada mística ou o associada ao obscurantismo teria suas atividades caçadas, defendendo a supressão, controle e, se possível, a eliminação dessas crenças para manter o ateísmo ativo nas atuações do governo.
No oitavo congresso do PCUS, o artigo 13 especificou esse trabalho de desconstrução de crenças na liderança e ações de governo: “O Partido visa a destruição completa das ligações entre as classes opressoras e a propaganda religiosa, ao mesmo tempo apoia a libertação real das massas trabalhadoras dos preconceitos religiosos e organizará a propaganda de educação e esclarecimento antirreligioso mais ampla possível”.
As estruturas de igrejas, como templos evangélicos, católicos, hebraicos, budistas e muçulmanos foram aproveitadas após o golpe de Estado de Outubro de 1917, transformando os edifícios maiores em locais para abrigar representantes do Partido Comunista da União Soviética, os bolcheviques. Os mosteiros, mesquitas e pequenos templos tiveram suas estruturas usadas para comportar comércios e serviços com ligação governamental.
Além das medidas contra as igrejas, os cidadãos soviéticos batizados com nomes bíblicos foram convidados, sem nenhuma proposta de ter alguma vantagem, a trocarem seus nomes por nomes novos. As alcunhas oferecidas foram, inicialmente, estimuladas a serem adaptadas como apelidos apenas, de maneira que se acostumassem.
A solicitação, entretanto, não fez efeito, visto que havia um grande número de cidadãos com nomes religiosos que não puderam ser alcançados pelo governo, além de recusarem as trocas ou, simplesmente, declararem ao governo que utilizaria o nome sugerido e seguir utilizando o nome dado em seu nascimento.
A Bíblia e os outros livros de origem religiosa só voltaram a circular, de maneira clandestina, no final da década de 1980, com a perda de força da União Soviética. Entretanto, a estratégia de repressão foi eficaz: em 1987, existia apenas 18 mosteiros em funcionamento em toda a extensão territorial da URSS. Hoje, a Bíblia pode ser comercializada livremente em todos os países que compunham o regime.
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