Nem da Rocinha - Stringer
Personagem

De Antônio Francisco Bonfim Lopes para Nem da Rocinha

A trajetória de um dos maiores traficantes do país, que chefiou a Rocinha por anos e se tornou o homem mais procurado do Brasil

Alana Sousa Publicado em 27/10/2019, às 14h00

Antônio Francisco Bonfim Lopes viveu os primeiros anos de sua vida de maneira relativamente sossegada até se deparar com uma situação que mudaria completamente sua vida. Nasceu na favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, em 1976, mas se mudou para a Paraíba com os pais para tentar escapar da pobreza. Anos depois, voltou para o Rio de Janeiro, casou-se e teve uma filha, Eduarda.

Aos nove meses, sua filha recebeu o diagnóstico de uma doença rara, conhecida como histiocitose X, que afeta uma em cada 200 mil pessoas, logo a doença poderia começar a provocar o esfarelamento dos ossos da criança, e em uma situação mais extrema, causar a morte. Antônio precisava de dinheiro imediato para bancar o tratamento da menina, largou o emprego como operador de tv a cabo, e optou pela única opção que lhe pareceu possível.

Antônio Francisco Bonfim Lopes vira Nem

No dia 22 de maio de 2000, dois dias antes de completar 24 anos, Antônio subiu o morro da favela da Rocinha, onde residia, a fim de pedir um empréstimo para Luciano Barbosa da Silva, o Lulu, dono do morro.

Favela da Rocinha / Crédito: Getty Images

 

Foi recebido por Lulu e três seguranças, para quem contou a história de sua filha e solicitou o valor de 20 mil reais. Em troca se ofereceu para trabalhar para o traficante, como forma de quitar a dívida. Sua proposta foi aceita, já não era mais Antônio e sim Nem — um apelido de infância.

Começou trabalhando como segurança, devia emitir sinais caso visse algum sinal da polícia. Aos poucos foi se tornando mais importante, até que se tornou o braço direito de Lulu. A Rocinha viveu quatro anos tranquilamente sob o comando de Lulu, os índices de violência se igualavam a bairros de classe média da cidade.

Até que, em 2004, após Lulu se negar dividir o comando da comunidade com Eduíno Eustáqui Araújo Filho, conhecido como Dudu, um clima de terror foi instalado. As facções rivais entraram em guerra e tentaram tomar o comando do tráfico a qualquer custo. Até que o Batalhão de Operações Especiais, o Bope, tomou conhecimento do confronto e se envolveu nas briga. O resultado foi o assassinato de Lulu e o caos na Rocinha.

Dono do Morro

Após diversas lutas pelo comando da Rocinha, Nem finalmente assumiu o poder. Algumas regras foram implantadas de imediato, tais como a proibição de menores na quadrilha criminosa, venda de crack e ameaça a moradores.

Crédito: Divulgação

 

A inteligência de Nem era o ponto forte no tráfico na Rocinha. Em pouco tempo, a quadrilha lucrava entre 10 e cerca de 15 milhões de reais por mês, segundo dados da Polícia. Além de cobrir mais da metade da demanda de cocaína da cidade inteira.

“Durante seu período no poder, Nem constrói um campinho de futebol para a comunidade, paga viagens de moradores ao Nordeste para reverem a família, banca tratamentos médicos e providencia cestas básicas para os mais carentes”, escreve o autor Misha Glenny, em seu livro O Dono do Morro, que conta a história de Nem.

A realidade da favela se transformou completamente. Nem trazia shows internacionais para comunidade, assim como organizava a própria para do Orgulho Gay. O tráfico se fortalecia ainda mais, com o baixo nível de violência, os bailes começaram a ser frequentados por pessoas de classe média, que consumiam dos produtos da quadrilha.

Prisão

Foram quase sete anos de reinado. Em 2011, Nem somava um patrimônio de cerca de 100 milhões de reais, já era o homem mais procurado do país, intitulado como inimigo público nº1.

Uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) estava prestes a ser implantada na Rocinha, e as autoridades ofereciam uma recompensa de 50 mil reais para quem ajudasse a capturar o dono do morro.

Nem após sua prisão / Crédito: A/A Beatriz

 

Em 9 de novembro de 2011, Nem foi preso, enquanto tentava escapar de uma blitz no porta-malas de um carro, rodeado de malas de dinheiro. As acusações contra ele eram de tráfico de drogas, armas e formação de quadrilha. Algo que chamou atenção, pois, todos os chefes anteriores da favela eram também assassinos, e Nem, apesar de ser suspeito de estar envolvido na morte de duas garotas, não pode ser ligado às mortes por falta de evidências.

Antônio hoje cumpre pena — que soma mais de 96 anos — na penitenciária federal de segurança máxima, em Porto Velho, em Rondônia.


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O dono do morro, Misha Glenny (2016)

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A História do Rio de Janeiro, Armelle Enders (2015)

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