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Vitrine / Personagem

Três anos preso por um crime que não cometeu: a triste saga de Kalief Browder

Sem provas, Browder viveu um verdadeiro inferno na prisão; sua história foi contada em documentário disponibilizado na Netflix

Victória Gearini Publicado em 18/10/2020, às 16h47

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Kalief Browder, jovem preso injustamente - Wikimedia Commons
Kalief Browder, jovem preso injustamente - Wikimedia Commons

Vítima do sistema dos Estados Unidos, o jovem afro-americanoKalief Browder foi preso no complexo carcerário de Rikers Island, sem obter julgamento. O rapaz foi acusado de supostamente roubar uma mochila contendo objetos 'valiosos'. Todavia, era apenas o começo do verdadeiro inferno que o jovem viveria. 

Caçula de sete irmãos biológicos, Kalief Browder foi colocado para adoção ainda recém-nascido, por conta do vício em drogas de sua mãe. O garoto foi adotado por Venida Browder, que tinha mais 34 filhos até 2015 — entre eles biológicos e adotivos. Quando criança, Browder frequentou a New Day Academy, sendo considerado um dos melhores alunos. Tinha tudo para ter um futuro brilhante.

Em 2009, o jovem foi acusado de furto. De acordo com autoridades, ele havia roubado um caminhão, que pertencia a uma padaria, e batido o veículo num carro estacionado. Com apenas 16 anos, foi julgado como adulto.

Embora tivesse assumido a culpa anteriormente, Kalief disse depois que apenas havia participado como 'espectador', foi em vão. O garoto foi dado como jovem infrator e encarou a liberdade condicional, no entanto, não seria a única vez que encontraria grandes problemas.

A prisão 

No dia 15 de maio de 2010, enquanto voltava de uma festa com um amigo, Browder foi surpreendido pela polícia na Arthur Avenue, perto da East 186th Street, no bairro Belmont do Bronx. Os policiais prenderam a dupla após receber uma chamada de roubo de uma mochila — que supostamente continha uma câmera, US$ 700, um cartão de crédito e um iPod Touch. 

Embora a polícia tivesse revistado Browder e não encontrado nada, o rapaz foi levado preso, após uma testemunha identificá-lo como autor do crime. A todo momento, ele afirmava que não havia roubado nada. E isso batia justamente com o depoimento da testemunha, que apresentava inconsistências.

Em determinado momento ela deu a entender que o roubo havia acontecido naquela noite, depois voltou atrás e alegou que havia ocorrido duas semanas antes. Ou seja, mais faltas de provas. 

No entanto, mesmo com depoimento controverso, Browder e o amigo foram levados para o Tribunal Criminal do Condado de Bronx, onde foram processados ​​no registro central do tribunal. No dia seguinte, o rapaz fora acusado de roubo e agressão.

A família de Browder, por sua vez, arrecadou a quantia para pagar a sua fiança, mas para piorar sua situação, foi impedida pelos policiais devido ao fato do garoto cumprir liberdade condional. Em seguida, Kalief foi transferido para a prisão em Rikers Island, enquanto aguardava o julgamento.

O complexo prisional, no qual Browder foi enviado, é conhecido pela política de violência, onde prisioneiros sofrem todos os tipos de torturas psicológicas e físicas — com Browder não foi diferente. Sua mãe costumava visitá-lo semanalmente e levar roupas limpas e dinheiro para comer. 

No local, o jovem foi vítima de violência dos guardas e de outros detentos. Certa vez, o rapaz e outros reclusos foram brutalmente espancados pelos guardas. Já no dia 20 de outubro de 2010, Browder foi agredido pelo líder de uma gangue, mas ao revidar, o rapaz foi atacado por outros 15 criminosos. 

Dois anos depois, um vídeo que mostrava o rapaz sendo agredido pelos guardas foi gravado. Pouco tempo depois, ele foi enviado para a solitária, após discutir com outro interno. Durante dois anos, Browder ficou em confinamento solitário, onde passou a estudar para o exame de Desenvolvimento Educacional Geral (GED).

Liberdade e depressão

Após um longo processo, Browder foi liberado. A partir disso, o rapaz e seu irmão Akeem, passaram a buscar representação legal. Como consequência, em novembro de 2013 moveu um processo contra o Departamento de Polícia da Cidade de Nova York, o Promotor Distrital do Bronx e o Departamento de Correções. Entretanto, as acusações foram negadas e Browder não recebeu reparação pelo o que aconteceu. 

Mais tarde, ele passou no exame GED e se matriculou no Bronx Community College (BCC), onde trabalhou como professor de matemática. Browder trabalhou, ainda, como segurança, mas assim que seu histórico veio à tona, ele foi demitido. 

Conforme o tempo passava, Browder demonstrava sinais que não estava bem. As primeiras tentativas de suicídio ocorreram quando ele ainda estava preso, até que em 6 de junho de 2015, sua mãe encontrou o cadáver do próprio filho. Kalief se enforcou em sua casa, aos 22 anos.

Na época, o caso foi amplamente noticiado pela mídia, o que gerou uma onda de protestos e insatisfações populares. As torturas sofridas por Browder e a sua morte geraram fortes impactos na opinião pública e diversas celebridades e personalidade se manifestaram sobre o assunto.

Em 2017, o rapper Jay-Z produziu uma minissérie documental intitulada Time: The Kalief Browder Story, disponível na Netflix atualmente. O caso de Browder ficou marcado na história dos Estados Unidos como mais um caso da violência policial e do racismo eminente no país. 


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