Campo de jogo de bola em Monte Alban, no México - Tjeerd Wiersma de Amsterdam/Wikimedia Commons
Jogo maia

O que tinha dentro das bolas que os maias usavam em antigo jogo?

Quadra do famoso jogo de bola foi encontrada no sítio arqueológico de Toniná e pode revelar rituais mortuários complexos da civilização

Isabela Barreiros Publicado em 14/08/2022, às 08h00

Muito antes do futebol, o povo maia tinha um jogo de bola que foi tão popular que chegou a ser praticado nas Américas por milhares de anos. Historiadores sabem disso porque muitas quadras onde o esporte podia ser praticado foram encontradas pela região.

Uma delas foi identificada no sítio arqueológico de Toniná, onde estão ruínas de uma antiga cidade maia, situadas no estado mexicano de Chiapas, estudadas por Juan Yadeun Angulo, arqueólogo do Instituto Nacional de Antropologia e História do México (INAH).

Em um comunicado publicado pelo INAH, após uma investigação que começou em 2020, a equipe sugeriu uma hipótese para o que pode ter sido usado pelos maias para formar as bolas que serviam para o jogo.

Templo em Toniná, no México / J. Antonio Cruz Coutiño/Wikimedia Commons

 

A teoria aponta que o povo maia teria cremado seus governantes e usado suas cinzas para formar as bolas de borracha que seriam usadas no jogo milenar, cujo nome e regras podem ter mudado ao longo do tempo.

Segundo o portal Live Science, o jogo de bola era muitas vezes praticado por duas equipes usando uma bola de borracha. A quadra usada para o esporte tinha forma da letra “I” maiúscula.

Cinzas de governantes

O time de pesquisadores surgiu com a tese depois de descobrir uma cripta de 1.300 anos sob uma pirâmide chamada de “Templo do Sol”, enquanto escavava as ruínas da cidade maia em Toniná, ao sul do México.

No local, a oito metros de profundidade, identificaram os restos de cerca de 400 embarcações que guardavam materiais orgânicos, como cinzas, carvão e borracha natural, que foram submetidos a uma análise microscópica.

Outro campo do jogo de bola em Yagul, no México / I, Jlrsousa/Wikimedia Commons

 

“Pessoas especializadas, possivelmente sacerdotes, faziam a combustão dos corpos inertes de personalidades de alto escalão, e que o enxofre das cinzas — o terceiro mineral mais abundante em termos de porcentagem do peso corporal total — foi utilizado para a vulcanização da borracha, com a qual foram confeccionadas as bolas utilizadas no ritual do Jogo de Bola”, diz o comunicado.

Assim, os cientistas sugerem que as cinzas seriam restos cremados de governantes, assim como os outros “ingredientes” encontrados nos frascos também indicariam que ali estava sendo feito o processo de vulcanização.

“Ao contrário de outras culturas antigas, incluindo a egípcia, que preservavam o corpo de seus ancestrais por meio da mumificação, na Mesoamérica os restos mortais dos governantes eram cremados, não necessariamente até que fossem completamente reduzidos a cinzas, já que algumas partes do corpo acarretavam um poder particular. porque eles estavam relacionados com certas divindades”, destaca a nota.

Também foram levados em consideração os entalhes feitos em esculturas que foram identificados em uma antiga quadra situada perto da pirâmide, onde foram retratados um governante de nome Wak Chan Káhk, que morreu em 1º de setembro de 775, e uma mulher que teria sido de alto escalão, Lady Káwiil Kaan, morta em 722 d.C.

Para a equipe, essas evidências apoiam que os dois indivíduos foram cremados e seus restos usados para formar as bolas de borracha, uma prática que pode ter se estendido para além de Toniná.

Aro em campo de jogo de bola, no Chichén Itzá / Kåre Thor Olsen/Wikimedia Commons

 

“Tais descobertas em Toniná fornecem uma ideia mais precisa de quão interessante e complexa era a religião maia, dentro da visão de mundo mesoamericana, e como o conhecimento desse processo de transformação do corpo é essencial para entender essa religião e sociedade antiga, pois o que estava planejado para seus senhores era destinado ao próprio povo”, disse Angulo.

Reações diversas

A teoria foi recebida com otimismo por alguns pesquisadores, enquanto outros afirmaram que a hipótese é improvável. A expectativa é que mais estudos sobre a questão sejam realizados para que mais informações sobre o jogo venham a tona.

Para Gabriel Wrobel, professor de antropologia da Michigan State University “tal prática é certamente consistente com os rituais mortuários complexos e muitas vezes prolongados dos maias que foram documentados”.

James Fitzsimmons, professor de antropologia do Middlebury College, disse ao portal Live Science que “é muito improvável que fossem os restos de governantes, por si só”, opinando que deviam ser restos mortais de prisioneiros de guerra.

Susan Gillespie, professora de antropologia da Universidade da Flórida, por outro lado, duvidou da pesquisa: “Olhando através das informações que encontrei, não há nenhuma evidência real apresentada de que as bolas de borracha foram criadas para incluir os restos cremados de governantes maias. Eu não li que eles encontraram bolas de borracha e as analisaram".

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