Zé do Caixão em imagem promocional - Divulgação/TV Brasil
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Neste dia, em 2020, morria Zé do Caixão, mestre das histórias brasileiras de terror

Muito além de unhas com mais de 20 centímetros, um marco do bom lixo nacional

Daniel Bydlowski, cineasta Publicado em 19/02/2021, às 09h39

Foi no dia 19 de fevereiro de 2020 que recebemos a notícia que José Mojica Marins, não estava mais entre nós. O mestre do terror brasileiro nos deixou, vítima de uma broncopneumonia. E o que restou? Um legado!

O excêntrico rei do trash, além de muito gosto pela leitura, cresceu assistindo filmes nas salas de cinema em que seu pai trabalhava e sempre criativo montava personagens com direito à cenário e figurino. Com apenas 12 anos ganhou sua primeira câmera e nunca mais parou de fazer cinema.

Aos 17 alcançou o que muitos jamais conseguiriam, abriu uma escola de interpretação, a Companhia Cinematográfica Atlas. Fruto da Boca de Lixo, uma espécie de Hollywood marginal paulistana dos anos 60 e 70, começou suas produções aterrorizantes e bizarras.

Zé do Caixão

Personagem niilista que José criou após um sonho em que um homem horrendo, de unhas longas e capa preta o arrastava para seu próprio túmulo. No momento em que era jogado na cova, viu a face fantasmagórica de seu malfeitor, além de seu nome na lápide.

Cena do filme Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver (1967) /Crédito - Divulgação

 

A partir disso, decidiu dar uma história e vida para essa espécie de alterego. Josefel Zanatas (Zé do Caixão) não foi sempre uma estrela, apesar de ter nascido em berço de ouro, não era muito popular e sofria bullying por conta da profissão de seus pais, que de tão óbvio ninguém imaginaria que eles eram agentes funerários.

Depois de enfrentar a guerra, volta aos braços de seu amor de infância, Sara, que já está no colo do prefeito da cidade, por fim, mata os dois. Após esse episódio, tornou-se transgressor, herege e, paradoxalmente, genial, assim como seu criador.

O sádico agente funerário enveredou-se em uma busca constante para achar uma parceira que compartilhasse de seus assombrosos pensamentos e o desse um filho para perpetuar sua espécie, que acreditava ser superior.

Sua primeira aparição foi em À Meia Noite Levarei Sua Alma e após esse filme, foi imortalizado por mais de meia década.

Mojica Marins e sua excêntrica filmografia

Foi em 1956 que José Mojica Marins deu início ao seu legado com Beijos a Granel, a única epidemia que vale a pena começou nesta produção, eram beijos sem fim. Até aí tudo bem, nada de tão espantoso e que justificasse sua fama.

Foi no terceiro filme, a Voz do Coveiro, que começou a aparecer seus indícios de fixação por produções macabras. Mas em 1964, o auge foi atingido com o sucesso em À Meia Noite Levarei Sua Alma, em que a mulher castigada pelo personagem ícone do terror comete suicídio e dedica sua vida, ou melhor, sua morte, a tentar capturar a alma de Josefel Zanatas.

A partir disso é só “trasheira”! Esse e outros filmes como Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver (1967), O despertar da Besta (1970), Exorcismo negro (1974), Delírios de um Anormal (1978) e Encarnação do Demônio (2008) são produções que marcaram época e fizeram de Mojica Marins quem ele é, o tornaram uma lenda do terror nacional e trouxeram aos aficionados pelo gênero um mundo de oportunidades cinematográficas brasileiras.

Foram 39 filmes como cineasta e 29 como ator, e ficou clara no meio de sua carreira uma inclinação à sexualidade, trash, claro. Os prêmios foram constantes, como o Prêmio L’Ecran Fantastique para originalidade com À Meia Noite Levarei Sua Alma, Rio-Cine Festival atuando em Ritual dos Sádicos e melhor direção e autor no V Prêmio FIESP/SESI-SP de Cinema Paulista com o mesmo filme. Ao todo, esteve envolvido em 13 premiações.

Decadência

“Triste é a nação cujo Zé do Caixão não é o Senhor” – Antonio Laudenir

Censura, preconceito e falta de oportunidades. Esta é a vida de muitos cineastas brasileiros. Imagine, logo com o José do terror não ia ser diferente. Mas a força de vontade o determinou por muito tempo a ponto de ficar conhecido internacionalmente, mas padeceu com a crescente urbanização e chegou a voltar à Boca do Lixo, mas não era mais a da meca do cinema paulistano.

A censura o venceu em O Despertar da Besta. Sem dinheiro, para variar se reinventou e revolucionou a pornochanchada. E novamente estava na Boca do Povo. E assim seguiu por muito tempo, auges e derrotas, porém, retornar dos mortos sempre foi sua especialidade.

Terror e paixão: um patrimônio brasileiro

Derrubou dogmas, apresentou as taras da sociedade ao mundo e com malandragem e astúcia, se tornou conhecido e admirado no país, o seu terror. Capa de disco, apresentador de programa de televisão, que apesar de todo enredo folclórico criado em torno dele, José Mojica Marins conseguiu derrotar por um tempo a censura e privação da liberdade de expressão no país, a sua paixão. Mais um Zé que contrariou todas as estáticas e se tornou um polo de cinema, o patrimônio brasileiro.

Uma marca, um exemplo a ser seguido, mesmo que deseje seguir em outros gêneros. Seu legado não foi só de terror e de unhas de 20 centímetros, foi de perseverança, insubordinação e vontade de chegar aonde não querem que você chegue. Aqui jaz Zé do Caixão, e quando digo aqui, quero dizer no Brasil todo.

Bonus Trash –  6 curiosidades sobre Zé do Caixão e José Mojica Marins

- José: veio de uma família de toureiros;

- Zé: fez um comercial de velas para macumba;

- José: foi registrado em uma sexta-feira 13, dois dias depois de nascer;

- Zé: foi candidato a duas eleições;

- José: dentre suas cômicas mentiras, uma delas é que tinha 21 filhos;

- Zé: Apareceu na capa do disco A Peleja do Diabo com o Dono do Céu, de Zé Ramalho, e virou até marca de cosméticos.


Sobre o cineasta

O cineasta brasileiro Daniel Bydlowski é membro do Directors Guild of America e artista de realidade virtual. Faz parte do júri de festivais internacionais de cinema e pesquisa temas relacionados às novas tecnologias de mídia, como a realidade virtual e o future do cinema. Daniel também tenta conscientizar as pessoas com questões sociais ligadas à saúde, educação e bullying nas escolas. É mestre pela University of Southern California (USC), considerada a melhor faculdade de cinema dos Estados Unidos. Atualmente, cursa doutorado na University of California, em Santa Barbara, nos Estados Unidos. Recentemente, seu filme Bullies foi premiado em NewPort Beach como melhor curta infantil, no Comic-Con recebeu 2 prêmios: melhor filme fantasia e prêmio especial do júri. O Ticket for Success, também do cineasta, foi selecionado no Animamundi e ganhou de melhor curta internacional pelo Moondance International Film Festival.

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