Vindo de uma linhagem samurai na família, o ato de não ter respeitado a ordem dos marinheiros foi considerada uma desonra na comunidade local
Wallacy Ferrari Publicado em 02/03/2020, às 07h00 - Atualizado às 07h44
Na noite de 14 de abril de 1912, o RMS Titanic, o navio que um dia foi considerado impossível de naufragar, colidia com um iceberg e iniciava seu naufrágio. Em um processo de afundamento em decorrência ao deslocamento de uma placa metálica na lateral da embarcação, seus tripulantes, que estavam, em grande maioria, dormindo, rapidamente receberam o sinal de alerta ou simplesmente notaram que havia algo de errado.
Conforme protocolos passados antes da colisão, em casos de evacuação, a prioridade seria dada aos passageiros da primeira classe, com alto poder aquisitivo e que faziam a viagem por fins recreativos, dando preferência a entrada de mulheres e crianças aos botes e barcos de resgate. As outras classes, compostas por pessoas menos ricas e trabalhadores da embarcação, teria que aguardar a ordem. Porém, não foi a escolha de Masabumi Hosono.
Masabumi era o único japonês a bordo do navio. Era funcionário público no Japão e ocupava a classe secundária no navio. Acordado no susto, quase ficou preso em um corredor que foi tomado pela água. Pelo notável desespero dos colegas, era pouco provável que sobrassem barcos aos passageiros que não compunham a primeira classe. Logo, desacatou a orientação de aguardar o resgate no térreo do navio e se dirigiu ao convés.
Vindo de uma família com uma linhagem de samurais, Masabumi foi ágil ao se deparar com a escolha que salvaria a sua vida. Ao ouvir um marinheiro informar que um barco ainda tinha dois lugares disponíveis, viu um homem pular no bote, desrespeitando a ordem de prioridade. Prestes a partir, o japonês não aguardou o anuncio da última vaga, pulando rapidamente ao vão disponível. Com o desespero, não foi impedido por ninguém de seguir viagem.
Resgatado na manhã do dia 15 pelo navio vizinho RMS Carpathia, que recebeu o alerta de socorro ainda durante a madrugada, foi levado até Nova York. Evitou interagir com outros tripulantes com medo de que fosse penalizado por não ter respeitado a ordem dos desembarques. Inclusive, relatou a experiência em um papel, que tinha o emblema do Titanic timbrado, sendo o único documento conhecido com essa marca.
Ao chegar, foi a um escritório de exportações onde tinha amigos, que conheceu quando trabalhou em um ministério relacionado ao turismo e relações internacionais no Japão. Lá, conseguiu uma quantia de dinheiro emprestada, sendo suficiente para retornar à sua terra natal. Também contou a história para companheiros nipônicos, que, surpresos, contaram para a imprensa da comunidade japonesa.
Ao chegar em Tóquio, foi recepcionado por jornalistas que tinham interesse na história, porém, sem o brilho de uma vitória; foi criticado por não se adequar as virtudes samurais. Diretamente associadas a coragem, sacrifício e, principalmente, a honra, o fato de não ter respeitado a prioridade e não ter optado por morrer junto aos companheiros foi considerado um ato de covardia.
Sua esposa e suas filhas foram ridicularizadas em seus ciclos sociais; publicações foram feitas afirmando que o mesmo seria um homem de respeito se aceitasse a morte honrosa que foi oferecida; até mesmo seu contrato de emprego no Ministério da Terra, Infraestrutura, Transportes e Turismo foi encerrado. De seus 41 anos até o dia de sua morte em 1939, aos 68 anos, Masabumi foi criticado e desmerecido.
Sua redenção com a pátria só veio em 1997, após o lançamento do filme Titanic. Um “poshumous pardon”, condecoração póstuma para pessoas que foram injustiçadas em vida, foi concedida pelo governo japonês. Sua família, aliviada pela recepção local de maneira mais inclusiva e respeitosa, trabalha a imagem de Masabumi para reexplicar a história e mostrar que sua honra maior foi poder dar segurança e amparo aos filhos e netos.
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