Até hoje marcado pela "vassourinha", o político prometeu em campanha varrer os problemas do Brasil, mas acabou vetando coisas que não o agradavam
André Nogueira Publicado em 22/10/2021, às 08h00
Em um Brasil desestabilizado, no auge da Guerra Fria, assume um anticomunista de fala empolada, discurso de combate à corrupção e segurando uma vassoura: “Jânio Quadros é a certeza do Brasil moralizado!” dizia o jingle do político que, num curto governo de sete meses, tomou grandes decisões como presidente.
A filosofia da Vassoura de Jânio tinha um grande compromisso com a moralização pública dos hábitos e costumes brasileiros, sempre defendendo uma educação moral e conservadora.
E foi nessa onda que Jânio realizou diversas proibições, algumas que existem até hoje. “Tão graves como a situação econômica e financeira se me afigura a crise moral, administrativa e político-social em que mergulhamos”, afirmou ele em seu discurso de posse.
Muitas medidas polêmicas de Jânio Quadros, assim como suas falas coloquialmente indecentes, foram estratégias políticas e retóricas para um projeto econômico em curso, que se afastava do seu antecessor, JK.
Jânio aproximava o Brasil do FMI, que exigia reformas econômicas impopulares e fragilizava a moeda nacional. Para cada medida econômica vinculada incorretamente, era realizada uma resolução absurda no campo social.
“As medidas foram bem recebidas pelos credores do Brasil e pelo FMI, garantindo significativo reescalonamento da dívida externa do Brasil que venceria entre 1961 e 1965”, afirma o livro Economia Brasileira Contemporânea, de diversos autores.
Um exemplo de proibicionismo clássico do janismo foi o decreto 50.578, que proibiu corridas de cavalo nos dias de semana e a presença de menores de 21 anos nos jóqueis.
Pouco tempo depois, veio a proibição dos desfiles de concursos de beleza com maiôs pequenos, junto com restrição aos anúncios de “maiôs e peças íntimas de uso feminino” na TV e o fim do uso do biquíni nas praias.
Depois, o alvo foi o lança-perfume, cuja produção, comércio e uso passaram a ser completamente proibidos, além de uma política de manifestação contrária ao consumo de drogas em geral.
Outra medida aparentemente descabida do presidente Quadros, dessa vez num sentido mais diplomático, foi a condecoração do ministro cubano Ernesto Guevara e do cosmonauta soviético Yuri Gagarin, ambos em agosto de 1961. Esses atos, formas de afronta à hegemonia pretendida pelos EUA nas relações internacionais brasileiras, criou uma desavença na base de seu governo.
No entanto, uma das medidas mais impopulares foi feita pelo decreto 50.620, que proibiu as rinhas de galo no país, muito frequentes na época. O decreto atingiu também todas as formas de entretenimento baseadas na luta entre animais, atacando também os esquemas de apostas comuns nesses círculos. Muitos galos foram mortos, cozidos e servidos em presídios públicos.
“Determino a expedição de circular aos governadores solicitando coibirem nos termos do decreto em vigor, vigorosamente, as chamadas rinhas”, exigiu o presidente em um de seus famosos bilhetinhos ao Gabinete Civil. Jânio tinha um incômodo pessoal com as rinhas de galo e se esforçou particularmente na fiscalização dessa causa. Chegou a ameaçar intervenção federal no RJ pelo descumprimento do decreto:
“Reiteradamente, no Estado do Rio, o decreto que proíbe as rinhas vem sendo desrespeitado. Entenda-se com o governador daquele Estado para que o faça cumprir de forma efetiva. Não deseja o Governo Federal, que confia nas autoridades fluminenses, adotar outras medidas. Mas, se necessário, fá-lo-á”.
Longe de ser possível alegar insanidade, as atuações políticas de Jânio Quadros demonstraram o conservadorismo e autoritarismo de sua figura pública, cuja renúncia espalhafatosa deu início à nova crise que culminou no Golpe Militar.
As medidas singulares do governo Jânio merecem atenção nos dias de hoje, no esforço de compreender projetos reacionários dos anos 1960 e suas reconstruções contemporâneas.
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