Por meio de uma carta encíclica datada de 1937, o pontífice mandou uma mensagem a Adolf, que aumentou a perseguição aos católicos alemães
Letícia Yazbek Publicado em 22/10/2019, às 18h19
Em 14 de março de 1937, o papa Pio XI publicava a Mit brennender Sorge (Com ardente preocupação), uma carta encíclica – documento pontifício dirigido aos bispos de todo o mundo. A carta é considerada o primeiro comunicado de um chefe de Estado europeu a criticar o nazismo. Também foi a primeira carta encíclica escrita em alemão.
Em 1933, Pio XI havia negociado uma concordata com a Alemanha, assegurando os direitos dos católicos no país. No entanto, o papa passou a entender que Hitler deixou de honrar seus compromissos.
Na carta, ele condena a confusão panteísta, o neopaganismo e o mito da raça e do sangue. Afirma que a raça é um valor fundamental da comunidade humana, mas sua exaltação a um nível idólatra é negativa.
Em uma das passagens mais conhecidas de Mit brennender Sorge, Pio XI ataca pessoalmente Hitler:
“Aquele que, com sacrílego desconhecimento das diferenças essenciais entre Deus e a criatura, entre o Homem-Deus e o simples homem, ousar colocar-se ao nível de Cristo, ou pior ainda, acima d'Ele ou contra Ele, um simples mortal, ainda que fosse o maior de todos os tempos, saiba que é um profeta de fantasias a quem se aplica espantosamente a palavra da Escritura: 'Aquele que mora nos céus zomba deles’”.
Cópias da carta foram enviadas clandestinamente à Alemanha, para que não fossem apreendidas pela Gestapo. Depois, foram distribuídas aos bispos, padres e capelães, sob a ordem de que fossem lidas em todas as paróquias após a missa matutina do dia 21 de março de 1937, dia em que seria comemorada a festa de Domingo de Ramos. A data foi escolhida pela grande presença de fiéis, com o objetivo de aumentar ainda mais o impacto do discurso.
A leitura da encíclica foi uma surpresa para os fiéis, as autoridades e a polícia, que se espantaram com a agressividade da retórica utilizada por Pio XI. No dia seguinte à missa, as paróquias e escritórios das dioceses alemãs foram visitados por oficiais da Gestapo, que confiscaram as cópias do documento. O conteúdo da carta foi censurado e respondido com uma forte propaganda anticlerical.
Como reação, Hitler imediatamente aumentou a perseguição aos católicos alemães. Em maio de 1937, 1100 padres e religiosos foram presos, e, em 1938, 304 sacerdotes católicos foram enviados ao campo de concentração de Dachau.
Até a queda do regime nazista, em 1945, estima-se que 11 mil sacerdotes foram afetados pelas medidas punitivas do governo alemão – muitos deles terminaram nos campos de concentração.
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