Durante quase um ano, operação humanitária transportou cerca de 10 mil crianças para o Reino Unido; 85 anos do Kindertransport são lembrados em exposição
Fabio Previdelli Publicado em 31/01/2024, às 10h59
Entre os dias que se seguiram à Noite dos cristais, em 1938, e o início da Segunda Guerra Mundial, em setembro de 1939, uma grande operação humanitária foi responsável pelo transporte de cerca de 10 mil crianças — de maioria judaica de origem alemã, austríaca e tcheca — para o Reino Unido.
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O Kindertransport salvou essas crianças dos nazistas e as levaram para viver com famílias adotivas. Infelizmente, grande parte delas jamais reencontrou seus familiares após o conflito. Vale ressaltar que, no total, cerca de 1,5 milhão de crianças judias foram assassinadas pelos nazistas.
Em 15 de março de 1939, Hella, que recebeu o número 4672, tinha apenas 11 anos quando deixou a mãe em Viena e se mudou para Londres com apenas uma pequena mala. Em julho do mesmo ano, Alfred, de apenas seis, viveu momentos de incerteza durante a viagem de 48 horas até a cidade — durante todo o tempo, ele não foi capaz de sequer encostar no sanduíche de salame feito por sua mãe; o que poderia ser a última lembrança dela.
Hella Pick se tornou correspondente estrangeiro e editora diplomática do The Guardian; já Lord Alf Dubs virou trabalhista e ex-parlamentar. Os dois colegas visitaram Berlim nesta semana para a celebração dos 85 anos do Kindertransport.
O Kindertransport foi uma operação singular que salvou mais de 10.000 crianças e permitiu que a maioria delas, inclusive eu, tivesse uma vida muito boa", disse Pick, atualmente com 96 anos.
Nesta quarta-feira, 31, o Parlamento alemão inaugura a exposição 'Auf Wiedersehen' ('Adeus', em tradução livre); que retrata as emoções e experiências das crianças, dos pais que as deixaram para trás e das famílias adotivas que as acolheram.
O título também reflete a desorientação linguística de Pick, que disse "adeus" aos seus novos anfitriões assim que chegou ao Reino Unido. "Era a única palavra em inglês que eu conhecia", explica.
Lord Dubs, com 91 anos, recorda os aplausos dos meninos mais velhos em seu trem quando eles deixaram a Alemanha nazista para trás e cruzaram a fronteira para a Holanda. Em sua visão, a exposição — baseada em uma coleção de cartas e cartões postais trocadas entre as crianças, seus pais e suas famílias adotivas — foi "uma forma de dar vida à história do Kindertransport".
A experiência de ser uma criança refugiada moldou grandemente as suas próprias tentativas de moldar a política de imigração britânica, especialmente na tentativa de aumentar a aceitação de crianças refugiadas no país que o acolheu.
Hella e Alfred se consideram pessoas de muita sorte, não apenas por escaparem das garras dos nazistas, mas também por reencontrarem seus familiares: no caso de Pick, sua mãe; Dubs também se uniu à matriarca logo após ela chegar ao Reino Unido, enquanto seu pai morreu logo depois.
Conforme aponta o The Guardian, as peças centrais da exposição são os "mandamentos", ou diretrizes pessoais, escritos num livro de orações por Ferdinand Brann, que o entregou nas mãos de sua filha, Ursula, antes dela embarcar no trem em Berlim, em março de 1939.
Ferdinand acabou sendo deportado para Auschwitz, onde foi morto. No entanto, Ursula jamais esqueceu de suas lições amorosas, que estampam grandes cartazes na entrada do Parlamento: "Seja sempre grato ao governo do país para onde você vem por lhe dar refúgio", diz uma das frases. "Seja grato a quem abre sua casa e a torna sua".
Representando de Ursula, Ollie Gilbert, seu neto, de Londres, disse que ficou surpreso ao saber de sua história. "Nunca falei com ela sobre isso quando ela estava viva. Agora estou reunindo aspectos da vida dela e estou realmente emocionado com todos os detalhes, embora ainda tenha muitas cartas para ler".
Uma caixa com as cartas de Ursula foi descoberta por acaso no sótão da família no verão passado pela curadora da exposição, Ruth Ur, dos Amigos do Yad Vashem em Berlim, a maior coleção desse tipo ligada ao Kindertransport.
"É um tesouro", disse ela. "As cartas refletem o que descobri assim que comecei a me envolver com esse assunto e percebi quão perigosa e desesperadora deve ter sido a situação para os pais enviarem seus filhos para os braços de estranhos".
Nas entrelinhas você percebe a complexidade das emoções que eles estão sentindo", finaliza.
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