'Marighella' é um filme de 2021 que conta parte da história do guerrilheiro Carlos Marighella, considerado o 'inimigo número 1' da Ditadura Militar
Redação Publicado em 16/01/2023, às 19h00 - Atualizado em 20/01/2023, às 09h14
'Marighella' é um filme de 2019 — lançado só em 2021 no Brasil — que conta parte da história de Carlos Marighella, guerrilheiro comunista e um dos principais organizadores da luta armada no Brasil contra os horrores da ditadura militar. Na última segunda-feira, 16, a produção teve sua estreia em formato de série na Globo, às 23h40.
Dirigida por Wagner Moura, a obra chamou bastante atenção durante e depois de seu lançamento, tendo alcançado bastante notoriedade em festivais internacionais de cinema antes de chegar ao Brasil.
No entanto, embora 'Marighella' seja uma produção histórica que retrata um dos períodos mais obscuros da história brasileira, nem tudo no filme é 100% condizente com o que aconteceu na realidade, assim como ocorre em quase todo filme baseado em fatos.
Assim, separamos o que é fato e o que é ficção em 'Marighella', que chegou às telinhas em formato de série.
Em uma cena chocante do filme, é possível acompanhar um atentado à Carlos Marighella dentro de uma sala de cinema — o que aconteceu, sim, mas não exatamente dessa forma —, quando policiais o abordam utilizando lanternas, e uma discussão se inicia, culminando no guerrilheiro sendo baleado no peito.
No entanto, no livro 'Por Que Resisti à Prisão', Marighella relata que, na verdade, havia marcado um encontro com a zeladora do prédio em que morava para que pudesse pegar algumas roupas — ele havia fugido do local dias antes, conforme a Veja. Porém, percebendo que a mulher estava sendo seguida por policiais, entrou no cinema para confundí-los.
Ao contrário do retratado no filme, o relato de Marighella aponta que, logo que entraram no cinema, os policiais interromperam a sessão e acenderam as luzes do local. Depois de gritos de "abaixo à ditadura", ele foi baleado no peito e até mesmo lutou, desarmado, contra os agentes, até que foi preso, como o filme retrata.
Porém, um elemento do filme que de fato diferencia bastante dos fatos é o filho de Carlos Marighella, Carlinhos. Na primeira cena do filme, que se passa em maio de 1964, o garoto pode ser visto com o que aparenta ser entre 10 e 12 anos, mas ele já teria, na verdade, 16 anos quando os militares tomam o poder.
Além disso, outra licença poética que o filme se deu se relaciona às fitas que o guerrilheiro grava ao longo do tempo para o filho, na esperança de que chegassem ao garoto eventualmente — ele precisou ir à Bahia, morar com a mãe, depois da prisão do pai. Na verdade, as fitas nunca existiram, e elas são utilizadas no filme apenas como forma de expressar a vida e os valores do biografado ao espectador.
Em dado momento do filme, é possível ver Marighella conversando com Jorge Salles, um jornalista da época e filiado ao Partido Comunista Brasileiro. No trecho, o membro do PCB alerta o guerrilheiro sobre a posição contrária do partido à luta armada, e o avisa de que seria expulso — o que, de fato, aconteceu.
Uma edição de janeiro de 1968 do jornal Voz Operária conta com um pronunciamento do PCB sobre seu 6º congresso, além de ratificar sobre a expulsão de Marighella e outros membros por "participaram de atividades fraccionistas". O partido defendia, por sua vez, uma "transição pacífica" para o socialismo, além de resistência à ditadura por métodos constitucionais.
Após deixar o PCB, Marighella funda a Ação Libertadora Nacional (ALN), onde estes e outros expulsos do partido comunista favoráveis à luta armada entraram.
Outra cena importante do filme de 2021 mostra Marighella lendo o manifesto 'Ao Povo Brasileiro' para uma gravação, que foi transmitida via rádio em agosto de 1969. E de fato aconteceu, na época, de a ALN usar torres de rádio para invadir o sinal da Rádio Nacional, burlando, assim, a censura.
Porém, embora tenha realmente sido Marighella quem escreveu o manifesto, foi o estudante Gilberto Luciano Belloque quem o leu em gravação. Além disso, a transmissão não foi feita durante a noite, como o filme retrata, mas sim pela manhã.
Carlos Marighella faleceu no dia 4 de novembro de 1969, em São Paulo, após uma emboscada em que dois padres que ajudavam a ALN, depois de sofrerem torturas e sob a mira de armas, marcaram um encontro com o guerrilheiro.
A narrativa oficial de sua morte descreve que ele chegou ao local e teve voz de prisão decretada, mas correu para o carro e teria ameaçado sacar duas armas para iniciar uma troca de tiros — então teria sido alvejado por metralhadoras e morrido no local.
Porém, uma perícia posterior, feita pela Comissão Nacional da Verdade, aponta que, na verdade, Marighella teria sido alvejado já dentro do carro, sem que houvesse qualquer troca de tiros, tendo sido atingido por um tiro a queima roupa — versão esta retratada pelo filme.
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