Criada por Eugène Delacroix em meados de 1827, a tela foi odiada pela crítica, mas fez com que a carreira do artista decolasse
Redação Publicado em 11/07/2021, às 10h00
Este é um quadro meio maldito. Após sua exibição inicial, passou anos escondido do público, por ser considerado odioso e indecente. A crítica detestou: não só a cena é perturbadora de diversas formas, como a técnica estava toda “errada”, quebrando quaisquer noções clássicas de perspectiva e composição, estabelecidas desde a Renascença. E essa era a intenção.
Foi a partir de 'A Morte de Sardanapalo' que a carreira de Eugène Delacroix decolou. Os tempos estavam mudando e ele estava na dianteira. O quadro se tornou uma das fontes em que bebeu o romantismo, movimento com o qual Delacroix estava pessoal e profundamente envolvido.
Os românticos contestavam a veneração pelos clássicos e a (falsa) estabilidade da razão iluminista, usando de temas intensos e mórbidos. E um estilo que contrariava as convenções — tanto nos temas quanto na forma.
A ideia veio de uma peça do romântico Lord Byron, baseada num relato do grego Ctésias de Cnido, que perdurou por meio do também grego Diodoro Sículo. Ctésias fala sobre o “último rei dos assírios”, lendariamente depravado e hedonista, que preferiu queimar consigo seus objetos de prazer a se render aos inimigos.
Delacroix leu não somente Byron como os textos originais, e adicionou alguns detalhes por conta própria, para aumentar ao máximo o impacto. Que foi grande: ele inspiraria outros pintores românticos e até mesmo músicos, como Hector Berlioz e Franz Lizst, que compuseram óperas sobre o rei infeliz Diodoro Sículo.
Confira sete informações sobre a curiosa obra:
Até o último momento, Sardanapalo aparece caindo em tentações carnais, servido de vinho por seus eunucos. Se Ctésias não inventou tudo, pode ter sido pura propaganda dos persas, inimigos históricos dos assírios. O nome Sardanapalo parece ser uma corruptela de Assurbanípal — mas este foi um ótimo rei, que morreu de velhice.
O homem negro parece fora de lugar em meio aos assírios, que existem ainda hoje e têm o aspecto típico do Oriente Médio. Podia ser um escravo, que, naquela época, vinha em todas as cores. Mas não é impossível que escravos africanos tenham ido parar na Assíria, um pedaço considerável da África.
Sardanapalo aparece nos textos de Ctésias de Cnido, um historiador grego do século 4 a.C. que viajou para a Ásia e disse ter lido fontes originais persas. O “último imperador da Assíria” teria sido extremamente decadente e corrupto. O problema é que os próprios registros assírios não têm ninguém com esse nome — o último rei foi Assuruballit II, que simplesmente desapareceu.
Sardanapalo teria feito uma pira com suas riquezas, e no meio dela prendeu seus escravos, serviçais, concubinas, animais e, por fim, ele próprio, ateando fogo a tudo para evitar que os inimigos ficassem com o butim. Para aumentar o drama, Delacroix retratou a pira já acesa e bem perto, com as concubinas sendo mortas antes de queimadas.
Ctésias dizia que Sardanapalo também tinha rapazes entre seus amantes. Os gregos não condenavam a homossexualidade em si, mas havia várias situações em que isso podia ser visto como vergonhoso. Uma delas era atuar de forma efeminada. Além dos rapazes no canto da imagem, o rei aparece em trajes femininos no topo da figura.
Mirra, a concubina favorita de Sardanapalo, aparece numa posição ambígua, talvez implorando, talvez venerando seu rei condenado. Na narrativa grega, ela teria se unido voluntariamente a ele no momento final.
O rei pode não ter existido, mas uma coisa que não faltava a qualquer imperador neoassírio eram riquezas. Entre 911 e 612 a.C., eles dominaram vasta região do Irã até o Egito, sendo o mais poderoso Estado de seu tempo. Acabariam desintegrados por uma sucessão de guerras civis e revoltas dos povos dominados.
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