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Matérias / Beatles

Como viagem de LSD fortaleceu vínculo entre John Lennon e Paul McCartney?

Na nova biografia 'John & Paul', é revelado episódio inusitado sobre o relacionamento complicado entre os dois famosos membros dos Beatles; confira!

Éric Moreira
por Éric Moreira

Publicado em 13/04/2025, às 17h00

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John Lennon e Paul McCartney - Getty Images
John Lennon e Paul McCartney - Getty Images

Uma das bandas mais influentes que o mundo da música já viu, os Beatles foram um grande sucesso na década de 1960, com o emblemático "quarteto de Liverpool", John Lennon, George Harrison, Ringo Starr e Paul McCartney.

John e Paul, em específico, ficaram bastante lembrados como os principais compositores da banda, e agora a relação entre eles é explorada na nova biografia 'John & Paul: Uma História de Amor em Músicas', do autor Ian Leslie. O livro detalha a união entre as duas grandes mentes com observações perspicazes, sendo focado não simplesmente na história da banda, mas em específico na relação — de uma amizade conturbada — entre eles.

John Lennon e Paul McCartney / Crédito: Getty Images

"Melhorando"

Um episódio curioso mencionado no livro, que acabou fortalecendo o vínculo entre os dois, ocorreu durante as gravações de 'Getting Better', faixa do disco 'Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band', de 1967. Vale mencionar que, nessa época, Paul McCartney era quem mais compunha pena banda — o que muitos acreditam que também tenha influenciado na autoestima de John

Enquanto passeava pelo parque, certo dia Paul se lembrou de uma frase do baterista substituto da banda, Jimmie Nicol, que ocupou o lugar de Ringo em algumas apresentações de 1964, quando ele se recuperava de uma amigdalite. Quando questionado sobre como era estar naquela posição turbulenta, na época, Nicol costumava responder com "está melhorando", e essa frase otimista foi o que inspirou Paul a escrever a canção.

Enquanto isso, John vivia um período diferente de sua vida, na época. "Nessa música, iniciada por Paul, John despejou uma torrente de reflexões sobre sua própria vida — sobre a raiva que ele carregava consigo quando adolescente e mais jovem; sobre o abuso emocional e físico que ele infligia às mulheres", escreve Leslie na biografia.

Conforme repercute a revista People, John teve uma infância consideravelmente problemática, tendo sido abandonado pelo pai, se mudado de casa várias vezes, e até mesmo sua mãe faleceu quando ele ainda era jovem.

Eu cresci pensando que todos tinham uma família amorosa. Quando mais velho, fiquei chocado ao descobrir que isso não era verdade — que muitas pessoas tiveram infâncias desastrosas — e John Lennon era uma delas", disse Paul posteriormente no livro 'A Life in Lyrics'.
John Lennon em 1966 / Crédito: Getty Images

Durante a adolescência, John Lennon passou os últimos anos "numa fúria cega... ou estava bêbado, ou brigando", declarou ele mesmo. Inclusive, acredita-se que o verso final que ele contribuiu para 'Getting Better' — "Eu costumava ser cruel com minha mulher/Eu bati nela e a mantive longe das coisas que ela amava/Cara, eu era malvado, mas estou mudando meu cenário/E estou fazendo o melhor que posso", em tradução livre — seja consideravelmente autobiográfico.

John e as drogas

Apesar de ter sido por muito tempo uma pessoa difícil de se conviver, muitos comentam que Lennon melhorou bastante na época em que 'Getting Better' foi escrita, e sua personalidade se suavizou principalmente nestes primeiros meses de 1967. Nessa época, um ciclo vicioso de inquietação e depressão o levou a usar mais maconha e LSD que nunca, isso sem mencionar outras substâncias variadas que ele mesmo moía.

No entanto, nas palavras de Leslie, o efeito desse aumento no uso de drogas foi que John se tornou "mais calmo, mais simpático e mais infantil", deixando de se permitir ser levado pelo álcool, e se tornando até mais afetuoso, abraçando seus amigos.

Porém, junto dessa "iluminação", Lennon também enfrentou uma queda em sua produtividade musical. "Ele nunca achou tão difícil criar novas músicas", observa Leslie no livro, sendo apenas quatro faixas de 'Sgt. Pepper' originárias dele. E ainda assim, elas foram criadas muito por insistência de McCartney para que o companheiro as escrevesse.

"Ninguém, nem mesmo John, acreditava mais nos talentos de John do que Paul, ou estava mais profundamente empenhado em que ele os aproveitasse ao máximo. McCartney também queria que seu amigo fosse feliz. Ele podia ver que John estava mais calmo e bem-humorado do que antes. Ele também podia ver que John estava desorientado. Quando John não estava trabalhando, ele estava viajando. Deixado à deriva sem rumo, ele poderia se perder completamente", escreve o biógrafo.

Paul McCartney e John Lennon / Crédito: Getty Images

Vale mencionar que Paul também perdeu a mãe durante a adolescência, mas ele acabou se estabilizando principalmente no trabalho. E o que ele queria era que o amigo também buscasse melhorar compondo novas músicas.

"Em 'Getting Better', Paul instigou John a criar uma espécie de narrativa de autoajuda sobre sua própria vida", escreve Leslie. "O cantor foi ajudado a deixar de lado a autoaversão e a raiva de sua juventude por, bem, alguém. Sua compreensão é alcançada a contragosto, como algo que ele precisa admitir, assim como você reconheceria um amigo que frequentemente o irrita, mas que está ocupado salvando você de si mesmo".

LSD acidental

Geralmente, John só começava suas "explorações psicodélicas" depois das gravações, preferindo não usar qualquer substância enquanto o quarteto trabalhava nas músicas. Porém, na fatídica noite de 21 de março de 1967, para se preparar para uma longa noite de gravações que o aguardava, Lennon buscou em meio às drogas algo que o mantivesse acordado — porém, ele acabou usando LSD acidentalmente.

A primeiro momento, ele não sentiu nada de errado, mas não demorou até que John começasse a sentir os efeitos intensos. "De repente, fiquei com tanto medo no microfone. Achei que estava passando mal. E [então] pensei que estava ficando maluco", disse Lennon em entrevista à Rolling Stone em 1970. "Então me dei conta de que devia ter tomado ácido!"

O produtor da banda, George Martin, decidiu levar John para o terraço para tomar um ar, depois que o músico pediu um intervalo, e os demais membros da banda ficaram para trás. Porém, enquanto Paul e George Harrison discutiam sobre o que deveria estar acontecendo com John, se deram conta de que talvez o topo de um prédio não fosse o melhor lugar para deixar John sob efeito de LSD.

Os dois então subiram as escadas e, felizmente, quando chegaram, encontraram Lennon conversando com George Martin sobre como as estrelas noturnas eram "fantásticas". No fim, a sessão de gravação acabou sendo interrompida, e a banda decidiu que voltaria para casa.

Viajando juntos

Apesar do ensaio ter encerrado antes do previsto, John ainda não podia voltar para casa, pois seu motorista só chegaria ao estúdio em algumas horas. Então Paul levou o amigo até sua casa, próxima ao estúdio de gravação, e lá o baixista tomou uma decisão: "Paul decidiu que ele próprio tomaria um pouco de LSD", escreve Leslie.

Paul McCartney e John Lennon / Crédito: Getty Images

Paul, vale destacar, foi o último membro da banda a usar essa droga. Conforme ele mesmo relatou no documentário 'Anthology', ele "estava realmente com medo desse tipo de coisa". "Quando o ácido surgiu, ouvimos que você nunca mais é o mesmo. Ele altera sua vida e você nunca mais é o mesmo".

Acho que John estava bastante animado com essa perspectiva", continuou, "[mas] eu estava bastante assustado com essa perspectiva. Tipo, 'Exatamente o que eu preciso, alguma coisinha engraçada que me faça nunca mais voltar para casa '. Pode não ser a melhor jogada! Então, fui visto enrolando um pouco dentro do grupo".

Porém, essa resistência de Paul acabou criando uma barreira entre ele e os demais membros da banda, e o baixista se sentia deslocado, de certa maneira. Foi por isso que, em dezembro de 1965, ele experimentou LSD pela primeira vez — sem nenhum dos demais companheiros de banda —, mas ele "nunca se apaixonou" pelo psicodélico.

Ainda assim, aquela noite com John Lennon parecia uma oportunidade rara, e pensando que poderia ser uma oportunidade de se reconectar com algum de seus companheiros — que vinham perdendo a intimidade desde que pararam de fazer turnês no ano anterior —, Paul decidiu que usaria o ácido.

"Pensei que talvez este fosse o momento de fazer uma viagem com ele", recordou Paul McCartney na biografia 'Many Years from Now', de Barry Miles. "Já estava acontecendo há muito tempo. Muitas vezes, é a melhor maneira, sem pensar muito, simplesmente entrar na onda. O John já está no projeto, então vou me atualizar. Foi minha primeira viagem com o John, ou com qualquer um dos caras".

E conforme narra Leslie em seu novo livro, "naquela noite, John e Paul fizeram algo que os dois praticaram algumas vezes durante esse período: olharam intensamente um para o outro. Eles gostavam de aproximar os rostos e se encarar, sem piscar, até sentirem que se dissolviam um no outro, quase obliterando qualquer noção de si mesmos como indivíduos distintos".

O próprio Paul já descreveu essa experiência em outras ocasiões, dizendo que viveu "uma experiência muito bizarra... John estava sentado ali, de forma muito enigmática, e eu tive uma grande visão dele como rei, o absoluto Imperador da Eternidade. Foi uma boa viagem".

Paul McCartney e John Lennon em estúdio / Crédito: Getty Images

Conexão

No livro, um aspecto que Leslie destaca é a importância do contato visual entre os membros da banda, que conseguiam se comunicar até mesmo sem palavras durante suas apresentações. Especificamente sobre John e Paul, o autor comenta que "os dois amigos passaram uma parte incomum de suas vidas se olhando nos olhos".

"Em ônibus de turnê, em quartos de hotel, em camarins. No YouTube e no Tumblr, fãs dos Beatles reuniram longas sequências de imagens de John e Paul se olhando em coletivas de imprensa, entrevistas, no palco, em festas. Todos os Beatles fazem muito contato visual, mas a frequência e a intensidade da comunicação ocular de Lennon e McCartney eram impressionantes", continua.

Essa conexão visual parecia especialmente importante para os dois. Paul recordou em 'Anthology' uma ocasião em que, após uma discussão com John, o colega se dirigiu a ele abaixando os óculos e olhando fixamente, dizendo "sou só eu":

Para mim, aquele era o John. Eram os momentos que eu realmente o via sem a fachada, a armadura, que eu também adorava, como qualquer outra pessoa. Era uma bela armadura. Mas era maravilhoso quando ele abaixava a viseira e você simplesmente via o John Lennon que ele tinha medo de revelar ao mundo".
Paul McCartney e John Lennon / Crédito: Getty Images

Pouco depois da noite em que teve sua viagem de LSD com Paul, Lennon disse ao biógrafo Hunter Davies: "Preciso ver os outros para me ver. Aí percebo que existe alguém como eu, então é reconfortante. Precisamos muito um do outro".