Walter Rauff - Wikimedia Commons
Personagem

Walter Rauff, o nazista que foi protegido pela ditadura de Augusto Pinochet

Responsável por criar as câmaras de gás móveis, com a qual admitiu ter matado cerca de 100 mil pessoas, Rauff se refugiou na América do Sul após a guerra — e jamais pagou pelos crimes que cometeu

Fabio Previdelli Publicado em 12/11/2020, às 17h15

Coronel da SS, Walter Rauff foi um pilar fundamental tanto na construção quanto na implementação de câmaras de gás móveis, que eram responsáveis por matar asfixiados judeus, deficientes e comunistas durante a Segunda Guerra.  

O nazista assumiu, em um relatório assinado, ter matado quase 100 mil pessoas com sua invenção, embora historiadores estimem que esse número possa chegar a 250 mil vítimas. Após a queda de Adolf HitlerRauff conseguiu escapar de um campo de prisioneiros e se refugiou na América do Sul, onde foi protegido pela ditadura Pinochet.  

O nazista Walter Rauff / Crédito: Getty Images

 

Sem nunca ter sido condenado por seus crimes, viveu uma vida pacata no extremo sul do país até 1948, quando sofreu um ataque do coração. Em seu funeral, alguns alemães e chilenos fizeram saudações nazistas e gritaram “Heil Hitler”. 

A vida militar de Rauff 

Nascido em 1906, na cidade alemã de Köthen, Walter Rauff começou sua carreira militar na Marinha, em 1924, como um jovem cadete. Nesse seu período como aspirante, inclusive, fez amizade com Reinhard Heydrich. No final da década de 1930, Rauff foi dispensado da Marinha por ter um comportamento inapropriado para a época: supostamente, ele teria cometido adultério.  

Entretanto, Walter não ficou muito tempo desempregado, já que Heydrich o colocou sob sua proteção. Na SS, uma organização paramilitar ligada ao Partido Nazista e a Adolf Hitler, ficou incumbido de colocar a SS e seu serviço de segurança, o Sicherheitsdienst, em pé de guerra. 

Reinhard Heydrich, o arquiteto do Holocausto / Crédito: Getty Images

 

Quatro anos depois, entre 1941 e 1942, se envolveu no desenvolvimento do Corvo Negro — pequenas vans adaptadas com um sistema que enviava a fumaça do escapamento para o compartimento de carga do veículo, o que matava por envenenamento ou asfixia pessoas consideradas inimigas do Estado alemão: judeus, deficientes físicos, comunistas, entre outros. Seu plano era tão diabólico que alguns veículos usavam o símbolo da Cruz Vermelha em suas laterais. 

Seus veículos da morte eram tão eficazes que o próprio nazista assinou um relatório onde assumiu ter “processado” quase 100 mil pessoas. Apesar do número exorbitante, historiadores acreditam que as vítimas de Walter podem ter sido mais que o dobro dessa contagem: cerca de 250 mil. 

Ainda em 1943, Rauff foi recrutado para ajudar no planejamento do extermínio de judeus na Palestina. Isso fazia parte do plano de Hitler para expandir o nazismo além da Europa. No entanto, a missão acabou sendo cancelada. 

A vida pós Segunda Guerra 

Na parte final da Segunda GuerraRauff já ocupava o posto de Coronel e participava da ocupação nazista no norte da Itália. Porém, por lá acabou sendo preso pelas tropas aliadas. No entanto, conseguiu fugir de um campo de prisioneiros e se escondeu em conventos italianos. 

Em um monastério em Roma, contou com a ajuda do bispo austríaco Alois Hudal para conseguir emprego como professor de uma escola católica. Hudal também foi o responsável por ajudar diversos nazistas a escaparem pelas ratlines (ou caminhos de rato, em tradução) com destino à América Latina.  

Walter acabou se estabelecendo em Quito, no Equador, em 1949. De lá, passou por Buenos Aires, capital da Argentina, onde liderou um grupo anticomunista. Em 1958, por fim, foi até o Chile, onde vivia com seu próprio nome. 

Rauff foi recrutado para espionar Fidel Castro / Crédito: Getty Images

 

Por ter uma certa vivência em um país hispânico, foi recrutado pelo governo alemão para trabalhar como espião. A inteligência do país tinha como objetivo espionar Fidel Castro. Entretanto, apesar de apresentar documentos com um nome latino, Enrico Gomez, foi impedido de entra na Ilha.  

De volta ao Chile, sumiu dos holofotes, trabalhando por anos como gerente de uma fábrica de conservas de caranguejos. Seu paradeiro só foi localizado novamente quando enviou uma carta solicitando que sua pensão fosse enviada para um novo endereço. 

Rauff nunca pagou pelos atos que cometeu, apesar de ter sido preso em 1962 pela suprema corte chilena. No entanto, o nazista ficou encarcerado por apenas cinco meses, sendo liberado por seus crimes terem prescrito. Soube-se, décadas depois, que o governo da Alemanha cobriu todos os gastos legais que ele teve com o processo de extradição.  

O ditador Augusto Pinochet / Crédito: Getty Images

 

Com o golpe no Chile e a chegada de Augusto Pinochet ao poder do país, sua vida ficou ainda melhor em 1973. Protegido pelo ditador, teve diversos pedidos da Alemanha Ocidental de extradição negados. Assim, passou a trabalhar no litoral do extremo sul do Chile administrando hospedarias e restaurantes. 

Os últimos dias de um nazista da América 

Vivendo uma vida pacata e sem muitas complicações, passou seus últimos anos de vida em um bairro de classe alta de Santiago. Sua mordomia, no entanto, durou até 14 de maio de 1984, quando sofreu um ataque do coração. 

Em seu funeral, diversos alemães e chilenos fizeram saudações nazistas e gritaram “Heil Hitler”. De acordo com seu arquivo no MI5, serviço britânico de informações de segurança interna e contra-espionagem, "ele nunca mostrou qualquer remorso por suas ações, que ele descreveu como sendo de 'um mero administrador técnico'".


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