Divulgação/YouTube/Aleksandra Matsu Takarai/17.09.2019 - Divulgação/YouTube/OWN/19.04.2013
Personagem

Ryan White, a triste história do adolescente banido da escola por ter AIDS

Em 1984, o cruel afastamento do jovem diante de inúmeros ataques conscientizou os EUA sobre a doença

Wallacy Ferrari Publicado em 01/11/2020, às 10h00

Nascido em Kokomo, no estado de Indiana, o americano Ryan White sofreu com problemas de saúde desde os primeiros dias de vida, em dezembro de 1971. A opção da família em circuncidar o rapaz resultou na descoberta médica de que o garoto tinha uma severa hemofilia do tipo A, visto que, após a incisão, o sangramento não foi interrompido.

De acordo com o diagnóstico, a coagulação de sangue era dificultada devido a uma associação ao cromossomo X, com a possibilidade de ter hemorragias graves mesmo com pequenos cortes.

Dessa maneira, o garoto tinha de ser acompanhado por médicos e passou boa parte da infância recebendo transfusões de um composto chamado Fator VIII, produzido com sangue doado do plasma de pessoas não hemofílicas.

Visto que, na época, não era incomum a produção de remédios com sangue pelos poucos avanços laboratoriais em relação aos exames de sangue, Ryan passou a maior parte da infância sem manifestar contrarreações do remédio, mantendo uma rotina saudável até o final de 1984.

De maneira abrupta, o jovem foi acometido por uma violenta pneumonia, chegando a ter a remoção parcial do pulmão para exames. A descoberta da análise, no entanto, revelou o motivo do adoecimento acelerado: White estava com AIDS.

Fotografia do jovem Ryan deitado na cama de seu quarto / Crédito: Divulgação/YouTube/OWN/19.04.2013

 

Preconceito e ignorância

Apesar de ter sido informado que teria apenas seis meses de vida, o garoto se recuperou no início de 1985, justamente no momento que deveria retomar as aulas após as férias de inverno. Sabendo da condição do filho, a mãe de Ryan informou a diretoria da escola para evitar problemas com outros alunos, no entanto, a administração da Western School Corporation proibiu o retorno do garoto.

A orientação, rapidamente passada para outros professores e disseminada entre a população local, resultou em um abaixo-assinado de 50 funcionários e 117 familiares de alunos orientando a expulsão do jovem, que foi acatada pela corte distrital. A família contra-atacou, iniciando uma batalha legal — que posteriormente ficou sob responsabilidade do comissário estadual de saúde, o médico Woodrow Myers.

Ao consultar o Centro de Controle e Prevenção de Doenças e verificar exames do jovem, o órgão declarou que White não apresentava riscos aos alunos, mas não conseguiu a aceitação dos colegas.

Readmitido no colégio apenas em abril, a instituição se deparou com uma série de desmatrículas e faltas em massa, além de episódios de bullying contra o garoto — que foi obrigado pela direção a usar um banheiro específico e levar talheres descartáveis.

Michael Jackson e Ryan White passeiam juntos / Crédito: Divulgação/YouTube/Aleksandra Matsu Takarai/17.09.2019

 

Ajuda de famosos

Mesmo desamparado e profundamente infeliz pelo tratamento recebido na instituição de ensino, Ryan conseguiu chamar a atenção da imprensa local e nacional para seu caso.

O jovem, que realizava entregas de jornais nas horas livres para arrecadar dinheiro, foi motivo de cancelamento de assinaturas. O Kokomo Tribune, jornal que White entregava, ficou do lado do garoto, apoiando publicamente e o amparando financeiramente com doações de editores e colunistas.

Mesmo assim, a comunidade local continuava aos ataques, até que, em 1987, a casa onde a família White morada foi atingida por um disparo desconhecido, resultando na mudança do garoto para a cidade de Cicero.

Para pagar as despesas da casa, Elton John deu U$15,5 mil dólares para a mãe de Ryan. Michael Jackson também fez questão de ajudar, dando um Ford Mustang conversível vermelho para o garoto ir até a nova escola.

Charlie Sheen, que décadas depois também descobriu ter HIV, levou o jovem Ryan para premiações como seu acompanhante, de modo a chamar atenção para a causa.

Estampando diversas capas de jornais, as informações sobre a AIDS divulgadas em matérias sobre Ryan auxiliaram na recepção do garoto na nova escola, sendo cumprimentado pela mão por diversos colegas e pela direção.

Barack Obama assina a extensão do Ryan White HIV/AIDS Treatment Act de 2009 / Crédito: Wikimedia Commons

 

Fim e legado

Pouco antes de concluir o ensino médio, no início de 1990, White fez sua última aparição pública, se encontrando com o ex-presidente Ronald Reagan e a esposa Nancy, após a festa do Oscar. O declive em seu estado de saúde fez a condição de Ryan se deteriorar rapidamente, resultando em diversas entradas em hospitais por infecções respiratórias.

Sedado e entubado com um respirador artificial, o hospital chegou a ter os telefones congestionados para envios de mensagens para Ryan. Após dez dias internado, o jovem faleceu aos 18 anos de idade, em 8 de abril de 1990. Seu funeral recebeu a visita dos músicos Elton John e Michael Jackson, da então primeira-dama Barbara Bush e de Donald Trump.

"Surpreendendo seus médicos, White viveu cinco anos a mais do que o previsto. Ele morreu em abril de 1990, um mês antes de se formar no ensino médio e apenas alguns meses antes de o Congresso aprovar a legislação que leva seu nome em agosto de 1990", explica o site do Programa de HIV/AIDS de Ryan White. 

Seu legado resultou no ‘Ryan White Care Act’, lei aprovada quatro meses depois de sua morte pelo Congresso dos EUA como um programa do governo para disponibilizar atendimento e programas de qualidade de vida para portadores de AIDS, sendo assinado por todos os presidentes seguintes até os dias atuais.


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