Obra 'Carnaval', de Di Cavalcanti' - Divulgação / CWeA Comunicação
Di Cavalcanti

Obras de Di Cavalcanti descobertas em Paris serão exibidas pela primeira vez depois de quase 90 anos

As obras serão exibidas em exposição no Rio de Janeiro, comemorativa dos 125 anos do nascimento de Di Cavalcanti

Redação Publicado em 26/08/2022, às 16h28

A Danielian Galeria apresenta a exposição “Di Cavalcanti – 125 anos”, com um conjunto de aproximadamente 40 obras raras, entre elas duas obras-primas inéditas, localizadas recentemente em Paris, na casa de uma família francesa – as pinturas em óleo sobre tela “Carnaval” (1928), 126x157cm, e “Bahia” (1935), 142 x 106 cm. Após a exibição na Galeria Rive Gauche, em Paris, em 1936, durante o exílio do artista na França, o paradeiro dessas obras se tornou desconhecido.

Denise Mattar, curadora da exposição na Danielian Galeria, diz sobre o achado: "É uma emoção indescritível para uma pessoa como eu, que pesquisa Di Cavalcanti desde 1997, deparar com duas obras dessa importância, que nunca haviam sido vistas desde 1936, e estavam em uma coleção privada na França.

'Carnaval' é um painel cujas características o situam entre a produção dos anos 1929 e 1931, quando o artista criou obras-primas como "As moças de Guaratinguetá", os painéis do Teatro João Caetano e 'Samba', a pintura perdida num trágico incêndio. O parentesco com elas é indiscutível”.

“Ver o belíssimo trabalho torna a crítica ainda mais impactante e sensível. Mostrar duas obras dessa qualidade da produção de Di Cavalcanti é uma contribuição inestimável da Danielian Galeria à arte brasileira”, continua Denise.

Papel social

Defensor de causas sociais, Di Cavalcanti (1897-1976) havia sido preso duas vezes: a primeira em 1932, durante a Revolução Paulista, acusado de apoiar Getúlio Vargas, e em 1936 por ser comunista. Após a segunda prisão, ele decidiu ir para Paris, com a mulher Noêmia Mourão. Neste mesmo ano, 1936, ele expõe 16 pinturas e quatro desenhos na Galeria Rive Gauche, e ganha texto do crítico francês Benjamin Cremieux (1888–1944) no catálogo.

Di Cavalcanti permanece em Paris até 1940, quando decide retornar ao Brasil por causa guerra. Ele costumava guardar suas obras maiores na Embaixada brasileira em Paris, e havia incumbido um amigo a despachar esses trabalhos, em torno de 50, para o Brasil via porto de Marselha. Não se sabe o que aconteceu, mas essas obras se extraviaram, e nunca chegaram ao seu destino. Em 1946, Di Cavalcanti voltou a Paris para tentar reaver seus quadros desaparecidos.

O povo brasileiro

A exposição “Di Cavalcanti – 125 anos de nascimento” reúne um conjunto de aproximadamente 40 obras raras e extraordinárias do artista pertencentes a coleções particulares de São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Fortaleza. “Uma exposição que mostra Di Cavalcanti na sua integridade – o autor de algumas das mais belas obras da arte brasileira”, destaca Denise Mattar.

'Bahia', de Di Cavalcanti - Foto: Divulgação / CWeA Comunicação
Os trabalhos traçam um percurso de Di através de seu tema favorito, o povo brasileiro, proporcionando uma oportunidade única de ver algumas de suas obras-primas. Sua produção está inserida na história da arte brasileira, por mais de cinquenta anos, desdobrando-se em muitas facetas: ilustrador, desenhista, caricaturista, pintor e muralista. Seu trabalho não tem par entre os artistas plásticos do Primeiro Modernismo, sendo Di Cavalcanti o único deles a manter uma produção constante e expressiva até sua morte, em 1976”, explica a curadora.

Entre as obras apresentadas na exposição estão a pintura a óleo “Serenata” (1925), de 85 x 120cm. “Um trabalho icônico que prenuncia partidos estéticos adotados pelo artista para a criação dos painéis decorativos do Teatro João Caetano”, diz.

“A cena tem como pano de fundo uma marinha com barcos a vela, mas se reporta à musicalidade dos morros cariocas, onde o pandeiro e o violão homenageiam uma mulher, cujas formas femininas são destacadas através de uma volumetria com influência da estética art déco. Já está presente a representação de tipos e cenas cariocas que iriam definir toda sua produção posterior”.

“Devaneio” (1927), óleo sobre tela, 99,5 x 156 cm, “também explora o volume das formas através do contraste entre superfícies planas de limites bem definidos e zonas esfumaçadas de onde a cor surge gradativamente a partir do branco, criando relevos espaciais e corporais”. “O título da obra se reafirma pela postura pensativa e um tanto melancólica da figura principal, uma mulher negra, perdida em sonhos, retratada ao lado de um barraco – tempo em que os morros se tornaram o berço do samba”, observa Denise Mattar.

'Devaneio', de Di Cavalcanti' - Foto: Divulgação / CWeA Comunicação

Essa descoberta dos tipos brasileiros é vista ainda na obra “Três moças” (c.1925), na qual Di reproduz três mulheres: uma loira, uma morena e uma negra – esta última destacada por sua beleza.

O inédito painel “Carnaval” (década de 1920), 126 x 157 cm, “tem características que o situam na produção realizada entre os anos 1929 e 1931, quando a influência muralista toma ainda mais corpo na obra de Di”, comenta a curadora. [...] Di tem como proposta criar um muralismo inteiramente diverso do mexicano, que é marcadamente político, preferindo se debruçar sobre o aspecto humanista. Os sambas, morros, favelas e danças, que ele pinta são verdadeiros, quentes, amorosos e carnais — feitos de dentro. Sua obra tem, de fato, o cheiro, o sabor e a cor do Brasil”.

Agora, as duas obras-primas serão mostradas na exposição “Di Cavalcanti – 125 anos”, com curadoria de Denise Mattar, na Danielian Galeria, a partir do dia 6 de setembro de 2022.

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