Apesar do sucesso nas operações contra o Cartel de Medellín, Gustavo de Greiff tinha uma polêmica opinião sobre a liberação das drogas
Fabio Previdelli | @fabioprevidelli_ Publicado em 18/06/2022, às 08h00 - Atualizado em 14/10/2022, às 10h00
Pablo Escobar foi um dos narcotraficantes mais temidos e bem-sucedidos da história. Rei do contrabando e da arte de driblar as autoridades — até certo ponto —, El Patrón também tinha suas excentricidades.
O Robin Hood colombiano, como chegou a ser aclamado por algum tempo, estava longe de ser um herói. Os crimes de extorsão, suborno, terrorismo, assassinatos, lavagem de dinheiro e até corrupção política são alguns presentes em sua imensa ficha.
Líder do Cartel de Medellín, chegou a figurar na lista da revista Forbes de homens mais ricos do mundo por seis anos, entre 1987 e 1993. Com uma fortuna avaliada em três bilhões de dólares, estima-se que Pablo gastava, por mês, cerca de 2,5 mil dólares apenas com elástico para conseguir empacotar malotes de dinheiro — o que era irrisório perto dos U$S 60 milhões que ele faturava por dia.
Entretanto, o império de Escobar acabou em 2 de dezembro de 1993, quando ele foi morto em Medellin. Um dos principais responsáveis por sua captura e por tratar das questões relacionadas ao narcotráfico na Colômbia, o então procurador-geral, Gustavo de Greiff, se tornou uma das pessoas mais respeitadas do país.
Entretanto, apesar do seu sucesso, de Greiff acabou não sendo visto com bons olhos pelo governo norte-americano de Bill Clinton. O motivo? Suas polêmicas opiniões em relação a guerra às drogas. Gustavo , que faleceu em 2018, sempre teve uma opinião clara sobre o tema.
Quando assumiu um dos principais cargos do país, em 1º de agosto de 1992, Gustavo de Greiff já estava envolvido em lidar com as condições de encarceramento de Pablo Escobar. Pouco antes, o notório narcotraficante havia se entregado voluntariamente às autoridades, tendo sido encarcerado em sua própria prisão pessoal de La Catedral, onde continuava a comandar o Cartel.
Pouco antes de eu assumir a função de procurador-geral, Escobar se submeteu à Justiça e confessou envolvimento no caso da pequena quantidade de cocaína no Caribe”, disse ele em entrevista à BBC em 2016.
Até então, as autoridades não tinham as reais dimensões do poderio de El Patrón, revela o ex-procurador-geral. “E quando assumi o cargo de fato, fiz com que a Procuradoria-Geral continuasse investigando as atividades de Escobar”.
Segundo matéria do El País, de Greiff tinha a intenção de transferi-lo para uma prisão mais segura, onde as autoridades pudessem "ver, olhar, informar e prevenir atos irregulares". No entanto, o narcotraficante acabou fugindo durante o transporte.
“Depois que fugiu da prisão de Itagüí, tentei fazer ele se entregar novamente. Para isso, falei com o advogado dele e esclareci que a Procuradoria-Geral garantiria proteção física, assim como o respeito aos seus direitos processuais”, revela Gustavo.
Paralelamente a isso, as autoridades continuaram a buscá-lo. Como estratégia, a procuradoria-geral chegou a oferecer proteção policial para a família de Escobar, visto que eles eram alvos frequentes por parte do Cartel de Cali e outros inimigos de El Patrón.
“Abrigamos a família com a esperança de que em algum momento ele tentaria falar com a esposa e, por meio desse contato, nós o localizaríamos. Aconteceu que, já com a família sob nossa custódia, a esposa manifestou que gostaria de se exilar na Alemanha junto dos filhos”, continua.
Embora a família de Pablo não tenha conseguido exílio, visto que dificilmente um país admitiria pessoas ligadas a um foragido, o esconderijo de Escobar acabou sendo encontrado. O líder do Cartel de Medellín foi baleado enquanto tentava fugir das autoridades. El Patrón não resistiu aos ferimentos.
O sucesso da operação tornou Gustavo de Greiff muito popular, o que o levou a ser convidado para um evento nos Estados Unidos, organizado em Baltimore, para discutir quais seriam os principais problemas do narcotráfico e também como combatê-los.
“Esse evento ocorreu há mais de vinte anos, e eu ainda guardo fortes recordações. Eu era novo no cargo de procurador-geral, mas já tinha forte a convicção de que a repressão ao tráfico poderia embargar carregamentos de drogas, confiscar bens de traficantes, destruir laboratórios, mas não solucionava o problema do tráfico. E expus isso na minha fala em Baltimore”, disse à BBC.
“A maioria das pessoas que me viu falar concordou comigo, mas um funcionário do Departamento de Estado do Governo Federal dos EUA, cujo nome infelizmente não me lembro mais, me ameaçou, impondo inimizade do seu país comigo e suspendendo toda a ajuda à Procuradoria-Geral”, continua. A promessa foi cumprida quando ele retornou à Colômbia.
A entrevista com o veículo aconteceu em meados de 2016, cerca de dois anos antes da morte de de Greiff. Até o fim de sua vida, o ex-procurador-geral sempre defendeu a ideia de que a guerra às drogas nunca foi a melhor solução.
Não foi Pablo Escobar que instalou uma crise na Colômbia. Quando ele apareceu na vida pública e criminal, o país já estava em crise. Já haviam guerrilhas, já havia violência nos campos…”, diz.
“Basta ver como o narcotráfico tem sido um problema até hoje para países produtores e ou consumidores de drogas. O narcotráfico seguirá sendo um problema enquanto esses países não regularizarem a produção e o comércio das drogas hoje proibidas”, continua.
Embora tenha reconhecido alguns avanços do governo norte-americano em relação ao assunto, como a liberação da maconha para uso recreativo em alguns estados do país, de Greiff afirmou que as autoridades dos Estados Unidos sempre impuseram grandes obstáculos no avanço das políticas de drogas dentro e fora de seu território..
“Creio que o interesse do governo norte-americano pelo problema das drogas nos países latinos seja por conveniência: em razão da proibição, o mercado das drogas se desenvolve em meio à violência e à corrupção”, aponta.
“Como infelizmente dependemos do comércio com o mercado norte-americano e de manter relações com as suas instituições financeiras, seguimos suas indicações forçadas e também participamos dessa ‘guerra’ [contra as drogas]. E todos têm que entrar neste jogo: desde os indivíduos até os funcionários desses países subordinados”, continou.
Por fim, Gustavo de Greiff apontou que por conta das suas convicções, chegou a ser apelidado como “amigo de narcotraficantes", embora considere que a alcunha foi dada somente para deslegitimá-lo como um defensor da mudança na política proibicionista.
A minha resposta diante disso sempre foi: tenho um estranho problema na coluna vertebral que me impede de me curvar aos poderosos.Continuarei defendendo a legalização da produção e do comércio das drogas e continuarei dizendo: a atual guerra contra as drogas é um fracasso”, completou.
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