Estudo realizado em 2021 estabeleceu um curioso "dia zero" para o funcionamento do aparelho
Ingredi Brunato, sob supervisão de Thiago Lincolins Publicado em 24/04/2022, às 08h00 - Atualizado em 30/12/2022, às 10h49
A Máquina de Anticítera, um artefato de 2 mil anos de idade visto hoje como o primeiro computador analógico já criado pela humanidade, é alvo de curiosidade arqueológica há anos.
Para começar, o equipamento milenar de bronze, que foi encontrado em 1901 dentro de uma embarcação naufragada no mar do Mediterrâneo, estava extremamente deteriorado, dificultando as análises dos pesquisadores.
Estima-se que um terço de suas peças tenham sido perdido, e mesmo as 82 que sobreviveram estavam desgastadas pelo processo de corrosão, algo esperado para um objeto de metal datado do período do Império Romano.
Ao longo do tempo, porém, arqueólogos chegaram à surpreendente conclusão que a Anticítera era capaz prever com impressionante precisão as trajetórias orbitais de planetas, assim como fenômenos astronômicos como eclipses, um feito de cair o queixo para uma civilização tão antiga. Confira abaixo como deciframos aos poucos essa impressionante máquina do passado!
Sabemos da efetividade do artefato porque um estudo 2005 o submeteu a uma análise de raio-X, descobrindo inscrições no bronze que correspondiam aos exatos números de anos que Vênus e Saturno demoram para dar uma volta ao redor do Sol (que são 462 e 442, respectivamente). As informações foram divulgadas pelo site da Universidade de Londres.
O funcionamento sofisticado desse computador analógico milenar, contudo, é um enigma que apenas foi solucionado em 2021, através de uma pesquisa que recriou o objeto usando modelos 3D.
Esse desdobramento, porém, trouxe ainda mais perguntas, uma vez que precisou incluir engrenagens intrincadas, de encaixes por vezes milimétricos, um tipo de engenharia mais semelhante à vista no interior de relógios modernos do que àquela presente em outros artefatos de 2 mil anos atrás.
A pesquisa de 2021 abriu as portas para que mais aspectos da Máquina de Anticítera sejam desvendados, e é isso que um estudo publicado no último dia 28 de março no portal arXiv se propõe a fazer.
A premissa da equipe de cientistas é que o computador analógico precisaria de um "dia zero" a partir do qual passou a realizar seus cálculos. Para eles, essa data foi 22 de dezembro de 178 a.C.
Conforme repercutido pelo Live Science, a razão por trás da estimativa é que este teria sido um dia muito marcante: não apenas era a véspera do solstício de inverno, que possuía grande importância simbólica para a civilização da época, como também ocorreu um eclipse solar de 12 minutos.
Esta "coincidência rara" de eventos teria tornado a data uma ótima candidata para o ponto de partida da máquina.
"Para usar um instrumento de medição, é necessário um ponto de referência, antes do procedimento de medição”, argumenta o artigo científico, "Geralmente, para realizar cálculos de tempo, é mais comum selecionar uma data do passado recente do que uma no futuro", acrescenta, ainda de acordo com o veículo.
Vale mencionar, porém, que a pesquisa ainda não foi revisada por outros especialistas da área, uma parte essencial do processo de publicação científica, e já está atraindo críticas.
Um dos pesquisadores a contestar a proposta do relatório científico é o historiador Alexander Jones, que é especializado no estudo das Ciências Exatas da Antiguidade.
“Não é um artigo que resista a uma revisão competente por pares. Há muitos problemas com ele, desde questões importantes até questões menores que, no entanto, são sintomáticas da falta de uma boa base no amplo contexto da astronomia e ciência antigas”, avaliou o professor em entrevista ao Live Science.
Entre esses problemas menores citados, está o fato que, caso o início do funcionamento do artefato seja 178 a.C., o registro de 'Kraneios', antiga estação associada ao vinho indicada por uma das peças da Anticítera cai em fevereiro, o que não faria sentido uma vez que essa não é uma temporada de colheita de uvas.
Além disso, uma pesquisa anterior que possuía o mesmo objetivo identificou a data de início do computador analógico como 204 a.C., uma conclusão conflitante com a do artigo recente.
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