Em 1992, o caçador de marajás caiu em desgraça após uma série de episódios que abalaram o país
Caio Tortamano Publicado em 30/09/2020, às 07h00
Era 1991 quando informações na mídia começaram a circular e fragilizar o governo de Fernando Collor de Mello, até que o irmão de Fernando, Pedro, concedeu uma entrevista em 1992 para a Revista Veja e denunciou esquemas de corrupção envolvendo o ex-tesoureiro da campanha de Collor, Paulo César Farias (ou PC Farias).
O cenário em si já era negativo para o político: ele havia confiscado poupanças excedessem 50 mil cruzeiros prometendo um prazo de um ano e meio, com o objetivo de diminuir a quantidade de moeda em circulação, tudo para conter a inflação galopante que atingiu o Brasil nos anos 90. Uma tragédia.
As denúncias geraram uma grande comoção entre a população brasileira, que enxergava no presidente justamente um caçador de marajás por conta de seu histórico em espionar funcionários públicos que ganhavam salários altos e desproporcionais.
Impeachment
Uma CPI foi aberta e passou a investigar o envolvimento e conhecimento do presidente da República sobre as questões levantadas pelo irmão de Fernando. Assim, foi descoberto que uma conta fantasma mantida por Farias financiava e custeava gastos pessoais de Collor. Uma revolta nacional.
O Movimento dos Caras-pintadas tomou as ruas ao redor do país, exigindo que o corrupto presidente fosse removido do poder por meios democráticos, e foi exatamente isso que aconteceu em 29 de setembro de 1992, por 441 votos a favor e 39 votos contra na Câmara dos Deputados: Collor de Mello fora afastado do cargo.
Encurralado, tomou a decisão final: em dezembro de 1992, o então presidente renunciou ao cargo para tentar encontrar alguma brecha no sistema penal do Brasil e conseguir manter a vida política ativa.
Isso ocorreu horas antes da decisão do Senado de efetivamente condenar o político por crime de responsabilidade, todavia, não ajudou muito o alagoano, que foi impedido de seus direitos políticos por oito anos.
Depois da presidência
O político, que havia conquistado uma aceitação de 71% no começo do mandato, terminou o seu período político de dois anos com somente 9% de aprovação popular.
Quem assumiu o seu cargo foi o vice, Itamar Franco, enquanto afirmava publicamente que havia sido vítima de uma “elite política avessa à necessidade de mudança”.
O próximo passo foi entrar no Superior Tribunal de Justiça com o objetivo de tentar reverter a decisão que o impossibilitava de exercer qualquer cargo público, reafirmando ter abdicado de seu cargo antes que fosse decidida a condenação.
O STJ entendeu que a renúncia havia ocorrido por conta de um “ardil jurídico”, isso é, eles sabiam que a decisão foi tomada única e exclusivamente para tentar amenizar uma possível pena para o corrupto. Dessa maneira, o pedido de Collor foi negado, e ele continuou inapto para comandar cargos públicos.
O processo que julgava Fernando Collor e Paulo César Farias foi arquivado, todavia, o ex-presidente não conseguiu comemorar, já que seu irmão havia morrido em decorrência de um tumor no cérebro. Em fevereiro de 1995 foi a vez de sua mãe, Leda Collor de Mello, o deixar. Diante de tanta tragédia, Mello se mudou para Miami, nos Estados Unidos, onde morou até 1998.
Retorno ao Brasil
Enquanto Collor estava em Miami, no ano de 1996, mais uma tragédia: Farias foi encontrado morto em Maceió ao lado da namorada. Cercado de controvérsias e teorias da conspiração, a perícia envolvida no caso constatou um crime passional realizado pela namorada que, em seguida, se matou.
Depois do tempo que passou nos Estados Unidos, o político voltou ao Brasil e entrou novamente com um recurso para reaver sua proibição. De tanto insistir, depois das eleições federais de 1998 teve seus direitos políticos retomados, e foi em 2002 que conseguiu sua tão sonhada volta à política.
Retorno à política
Logo em sua primeira eleição depois da presidência, Fernando Collor de Mello ficou em segundo lugar para governador de Alagoas, com quase 40% dos votos válidos. Em 2006, Mello voltou a um cargo público como senador pelo seu estado natal representando o Partido Trabalhista Brasileiro, o PTB.
Após o episódio, caiu nas graças do meio político novamente, como se tudo que tivesse sido condenado enquanto ocupava o cargo mais alto do país tivesse sido esquecido. De repente, os milhões confiscados se tornaram a cadeira número 20 na Academia Alagoana de Letras, e, em 2010, lá estava o caçador de marajás disputando novamente o cargo de governador de Alagoas — sendo derrotado ainda no primeiro turno.
Foi em 2014 que voltou a seu posto atual, o Senado do Brasil. Desde aquele ano, configura entre os senadores que ocupam cadeiras em Brasília. Também foi durante dois anos (2017 a 2019) presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal.
Comentários polêmicos
Collor também causou polêmica entre internautas após debochar do confisco de poupanças através de sua conta oficial no Twitter em junho de 2020. O senador publicou que sua esposa havia “confiscado seu telefone celular”, alegando estar tempo demais nas redes sociais.
Três horas depois, o político retornou e fez uma piada: “não foi confisco, foi um bloqueio temporário!”. A brincadeira foi mal recebida por internautas, com mais de 4,6 mil respostas na publicação, sendo a maioria delas associando a óbvia referência ao confisco nas poupanças durante o Plano Brasil Novo, popularmente conhecido como Plano Collor.
No dia seguinte, o ex-presidente se retratou, mas fez questão de esclarecer que o objetivo do comentário era mostrar que “confisco é diferente de bloqueio”, pedindo perdão para quem interpretou de maneira errônea ou se sentiu ofendido: “Sei que muitos sofreram na época e jamais brincaria com isso”.
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