Diversas ossadas de vítimas da violência brutal do Golpe de 64 foram enterradas em local que ficou escondido por décadas
Redação Publicado em 29/10/2020, às 22h52 - Atualizado em 30/03/2023, às 16h56
Era manhã de 4 de setembro de 1990, quando funcionários do Cemitério Dom Bosco, na Zona Oeste de São Paulo, foram convocados para remover a terra de uma área de gramado dos fundos do local. Até então, era só mais um dia comum no serviço funerário, mas o trabalho dos operários acabou virando um dos episódios mais macabros da história brasileira.
Mal imaginavam eles que estavam prestes a resgatar a memória de mais de mil mortos pela ditadura militar. Tudo parecia um grande pesadelo; durante as escavações, os homens encontraram sacos plásticos que continham vários ossos humanos.
Sob gestão de Paulo Maluf, ainda na década de 1970, o cemitério virou exclusivo para enterrar corpos de indigentes. Pelo menos, essa foi a justificativa dada na época. Mas, com a descoberta dessas novas ossadas, um novo mistério se iniciou.
Naquele dia, o lugar se encheu de jornalistas e especialistas, além da visita de Luiza Erundina, prefeita na época. Alguns corpos foram levados ao Ministério Público Federal para uma análise, que contou com pesquisadores da Unifesp.
Os estudos indicaram 1.047 ossadas na vala, todos de pessoas enterradas sem registro. Além disso, os restos mortais continham detalhes específicos, como dentes de ouro e marcas de tortura evidentes, que não eram compatíveis com as características de corpos indigentes. As análises comprovaram que aquela parte do cemitério havia sido usada clandestinamente por agentes do Estado durante a ditadura militar.
Nos anos de chumbo, as perseguições contra militantes de esquerda, estudantes, entre outros, se acentuou devido o estabelecimento do Ato Institucional n.º 5, AI-5, que institucionalizou as torturas e assassinatos praticados pelos agentes do regime.
Era comum, portanto, casos de pessoas que desapareciam repentinamente — e estão desaparecidas até hoje — após serem presas pelas forças militares, ou sequestradas por grupos paramilitares.
Mortos e desaparecidos não podiam ser revelados, e muito menos enterrados em cerimônia aberta. O governo, por sua vez, deu seu jeito: criou valas clandestinas para ocultar os corpos.
O lugar no cemitério em que essas ossadas foram achadas ganhou reconhecimento oficial após a descoberta, recebendo o nome de Vala de Perus. Lá estavam jogados os restos mortais de vítimas da repressão política da ditadura, e até mesmo da epidemia de meningite em São Paulo, caso que as autoridades da época tentaram abafar.
A descoberta da Vala de Perus foi uma vitória sobre o esquecimento. O local é a prova de como os crimes contra os perseguidos políticos se unem a assassinatos cometidos pelos policiais dos esquadrões da morte durante o regime e mesmo depois", analisa o filósofo Lucas Paolo Vilalta, coordenador da área de Memória, Verdade e Justiça do Instituto Vladimir Herzog.
"A ditadura cometeu uma série de violações aos direitos humanos. Muitas famílias conseguiram sequer enterrar seus mortos", continuou.
Uma investigação foi aberta por ordem da prefeita Erundina para identificar os corpos. Uma estimativa apurou que entre os enterrados, vinte eram de presos políticos, e o resto eram de vítimas de violência da época.
Em uma ação promovida pelas organizações dos direitos humanos e familiares dos mortos e desaparecidos, um monumento em homenagem e memória àqueles acometidos ali foi levantado no local da Vala de Perus, hoje é considerado um memorial.
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