Descrito por alguns como “assassino de homens”, o guisado acompanhou soldados britânicos ao longo de toda a guerra
Isabela Barreiros, sob supervisão de Thiago Lincolins Publicado em 27/06/2021, às 09h00
Ao longo da Primeira Guerra Mundial, soldados foram submetidos às situações mais adversas, entre batalhas, frio, ferimentos e alimentação precária. Era uma realidade totalmente insalubre que persistiu por quatro longos anos.
Entre os combatentes britânicos, a palavra maconochie ficou muito conhecida, representando para alguns alimentos, mas para outros praticamente uma tortura. O ensopado de carne e vegetais foi considerado inclusive como “assassinos de homens” por alguns, como relatou a BBC internacional.
Os criadores do produto que se tornaria o terror dos soldados britânicos foram os irmãos Archibald e James Maconochie, que viviam na cidade de Lowestoft, em Suffolk, na Inglaterra.
Os dois, porém, começaram um negócio na região de Aberdeenshire, na Escócia. No começo, eles produziam enlatados de peixe apenas no porto de Fraserburgh, mas logo se tornaram gigantes nessa indústria.
Já mundialmente conhecidos pelo produto, os irmãos decidiram que era hora de expandir o negócio e começaram a desenvolver inúmeras refeições enlatadas. Dessa ideia surgiram dois produtos em conserva principais: o famoso ensopado de maconochie e o picles Pan Yan.
Mas os alimentos não ficaram somente nas prateleiras dos mercados britânicos: eles também foram parar no campo de batalha a partir de um grande contrato entre os irmãos Maconochie e o governo da Grã-Bretanha.
Eles forneceriam o famoso enlatado por mais de dez anos aos combatentes tanto do Exército Britânico da Guerra dos Bôeres quanto os da Primeira Guerra Mundial, anos mais tarde. Devido a essa longa permanência entre os soldados, o guisado tornou- se quase uma obrigatoriedade.
Ainda que fosse a maior parte da alimentação dos combatentes durante a guerra, isso não fez com que eles achassem que o ensopado fosse uma coisa boa. Na verdade, como relatou Alan Bowman, um voluntário do Fraserburgh Heritage Center, à BBC, "alguns diriam que você precisava de uma medalha para comer um Maconochie”.
O especialista considerou o alimento como “vil”. Um repórter de guerra, na época, o descreveu como "um tipo inferior de lixo". Só a partir desses relatos é possível entender do que se tratava tal guisado.
Segundo a descrição exposta na lata de Maconochie, o produto contava com a "melhor carne", batata, feijão, cenoura e cebola. Além disso, na embalagem lia-se que o conteúdo poderia ser consumido “quente ou frio”. Se fosse ingerido quente, deveria ser aquecido em água fervente por 30 minutos.
Poder esquentar comida durante a Primeira Guerra era uma prática muito incomum, já que era difícil conseguir realizar tal ato naquelas situações precárias. A tropa, então, tinha que comer o ensopado frio. E isso era pior do que poderiam imaginar.
Como relatou Bowman, havia um enorme pedaço de gordura dentro de cada embalagem de Maconochie, que ficava por cima dos pedaços de carne e vegetais que deveriam ser o alimento principal.
"O conteúdo incluía uma grande quantidade de gordura animal que congelaria se resfriasse. Não era fácil aquecer as refeições. Em geral, costumava ser comido frio”, explicou.
Foi inclusive por isso que um relato da época, repercutido pela BBC, afirmava que se tratava de "uma ração em lata consistindo de vegetais fatiados principalmente nabos e cenouras em uma sopa rala ou molho". "Aquecido na lata, o maconochie era comestível. Frio, era um assassino", lia-se.
Claro que existiam as descrições mais positivas da comida. "Há uma carta do jornal local na qual um soldado escreveu para casa dizendo que um prisioneiro alemão havia saboreado sua refeição Maconochie de carne e feijão”, disse Barbara Buchan, do Fraserburgh Heritage Center.
De maneira geral, porém, as descrições eram quase sempre as piores possíveis. Além de não ser saboroso, o alimento também poderia causar efeitos colaterais terríveis, como gases devido ao feijão combinado aos nabos em algumas das versões do ensopado.
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