A história do mundo em 50 cachorros, de Mackenzi Lee investiga essa e outras histórias dos animais ao longo das décadas
Mackenzi Lee Publicado em 04/04/2021, às 11h15
De todos os absurdos completamente sem sentido da Alemanha pré-Segunda Guerra Mundial, uma mania especialmente estranha foi a dos cachorros falantes. O primeiro cachorro falante da Alemanha foi Rolf, cujo nome não foi inspirado pelo nazista cantor de A noviça rebelde, mas não deixa de ser uma correlação relevante.
De acordo com a dona, Paula Morkel, Rolf se comunicava batendo em letras com a pata. Tá, certo, talvez não seja completamente impossível. Só que, em seguida, ela disse que Rolf era um poeta e bibliófilo, falava diversas línguas e se interessava por teologia e filosofia. Tudo isso batendo as patas.
Eu entendo, todo mundo acha que o próprio cachorro é o mais inteligente do mundo e claro que estamos todos certos. Mas meu Deus do céu, Paula, relaxa aí.
Enquanto Rolf estava ocupado filosofando e compondo sonetos para o Terceiro Reich, outro cachorro papeava com os cidadãos da Alemanha: Don, um Braco Alemão de pelo curto, supostamente tinha a capacidade de falar palavras em alemão.
Nada de bater apenas as patas — esse aqui fazia sons de verdade. Um jornalista alegou que, ao perguntar o nome do cachorro, ele latiu “Don”. Quando perguntou “O que você tem?”, Don respondeu “fome” e pediu “bolo”. De tanto falar, Don se tornou uma celebridade internacional e apareceu em casas de shows e teatros ao redor do mundo.
Rolf e Don chamaram a atenção na Alemanha porque sua fama coincidiu com o crescimento do movimento da Nova Psicologia Animal. Sob a direção do dr. Karl Krall, os estudantes do movimento acreditavam que certos animais, como cachorros e cavalos, eram quase tão inteligentes quanto seres humanos e, se treinados corretamente, podiam acessar um enorme potencial intelectual.
Sabe quem eram os maiores fãs dessa teoria? Os nazistas.
Hitler era conhecido por amar cachorros — apesar de estar no alto da lista de “humanos que não merecem o amor incondicional canino”, ele tinha dois Pastores-Alemães, Blondi e Bella. Hitler não só concordava com a Nova Psicologia Animal como também acreditava que os cães policiais podiam ser treinados para se comunicarem com os mestres da SS e se tornarem soldados, executando tarefas como guarda, reconhecimento e vigilância.
Não da forma como vimos outros cachorros fazerem em guerras anteriores — ele acreditava que os cães podiam literalmente falar com os mestres e servir em postos basicamente equivalentes aos de soldados humanos. Cães de guarda ferozes eram usados pelos nazistas em campos de concentração, mas o objetivo era que um dia só cachorros treinados fossem necessários para guardar esses campos.
Hitler mandou soldados nazistas recrutarem cães inteligentes e matriculá-los na Tier-Sprechschule ASRA, ou Escola de Fala Animal. Lá, eles ensinaram aos cachorros os métodos de Rolf e Don para comunicação e até fizeram experimentos com telepatia humano-canina.
Isso mesmo: Hitler tentou criar um exército de cachorros falantes e telepáticos para servir aos nazistas. Sério, quem colocou esse homem no comando? Apesar de a neta da diretora da escola negar o vínculo direto com o nazismo, historiadores estabeleceram conexões nítidas entre a escola e os objetivos futuros de Hitler para os cachorros soldados.
E se preocupar com o bem-estar animal era parte central de ser um bom nazista. Parte da ideologia nazista era ser amigo de todos os animais, o que parece legal até lembrarmos que eles se preocupavam mais com o bem-estar animal do que, sabe, com os milhões de pessoas que massacraram.
Não há provas de que qualquer um desses experimentos tenha sido bem-sucedido ou de que o treinamento tenha levado a SS a passear com cachorros falantes. Os cachorros nunca aprenderam a saudar Hitler.
**O trecho acima foi extraído da obra A história do mundo em 50 cachorros, com autorização da Editora Paralela.
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