A história por trás da origem dos vinhos em lata no Brasil
Portal EdiCase Publicado em 08/12/2022, às 10h00
Um belo dia, navegando na internet, saltaram-me à tela do notebook vários pop-ups (aquelas malditas janelinhas que não pedimos para aparecer!). Dois deles eram de propagandas de vinhos em lata. Imediatamente, me lembrei dos vinhos em lata da marca “Vinhas de Israel” que bebi em minha juventude em Poços de Caldas, MG. Nos anos 1970, eles eram a novidade “prafrentex” (hoje seria “descolada”) e faziam sucesso, sobretudo, nas lojas de produtos para turistas.
Para desapontamento dos poucos caldenses, não eram produzidos pela Marcassa, a única vinícola da nossa cidade, mas sim pela Israel e Silva, vinícola da vizinha cidade de Santa Rita de Caldas, cuja centenária história merece ser contada.
Naquela pequenina cidade sul-mineira, em 1910, Israel Theodoro do Nascimento e Silva, mais conhecido como Sr. Israel Silva, exercia as profissões de barbeiro e folheiro, isto é, um artesão que fazia canecas, latas e outros utensílios com a “folha de Flandres”, material laminado feito de aço de baixo teor de carbono e estanhado, muito resistente à corrosão. A atividade de folheiro foi fundamental para alavancar o seu futuro negócio que nasceu em 1918, a partir da comercialização de compotas de pêssegos feitos por sua esposa Francisca Martins, a Dona Chiquinha.
Com o sucesso das vendas, a produção das compotas foi transferida para uma casa antiga no centro da cidade (que até hoje é sede da empresa), e a nova fábrica foi batizada de Doces Gigante. A origem do nome: os pêssegos usados nas compotas eram plantados pelo próprio Israel e, como eram muito grandes, quando ele os colhia, sempre dizia: “Chiquinha, olha que pêssego gigante!”. Em 1919, Israel resolveu enlatar as compotas para que se conservassem por mais tempo e registrou a empresa sob a razão social Agroindustrial Israel e Silva.
A marca Doces Gigante tornou-se conhecida em todo o país e, na década de 1980, já exportava para Argentina e Estados Unidos. Ao longo dos anos, agregou ao seu portfólio produtos (compotas, doces e geleias) de outras frutas, que existem até hoje (o meu predileto é o “Figo Málaga” caramelado!). Apesar do sucesso dos doces, o empreendedor Israel não se acomodou e decidiu produzir vinho.
Em 1943, com a ajuda do filho José de Alencar e Silva (de apenas seis anos), plantou videiras na sua chácara, a Quinta Santa Rita, e, após o crescimento das videiras, criou a vinícola Vinhas de Israel, que, de 1928 a 1971, produziu vinhos com a marca Santa Rita, envasados em garrafas e garrafões.
Eram vinhos de mesa feitos com três uvas americanas da espécie Vitis labrusca: a Niagara Branca (híbrida resultante do cruzamento das uvas Concord x Cassady, realizado em 1868 no Condado de Niagara, Nova York, EUA), a Niagara Rosada (mutação da Niagara branca, descoberta no Brasil por Antonio Carbonari, em 1933, em Louveira, SP) e a tinta Ives Noir ou Folha de Figo ou Bordo ou Terci (híbrida desenvolvida por Henry Ives em 1810, no Estado de Ohio, EUA).
Após a morte de Israel em 1958, José de Alencar assumiu a direção da empresa e, seguindo o empreendedorismo do pai, decidiu comercializar vinhos em lata. Contudo, o vinho corroía o verniz que revestia o interior da lata. Para isso, ele foi à França, em 1970, em busca da tecnologia para a fabricação das latas que conservassem adequadamente o vinho – e de lá trouxe a solução: as latas teriam que ser de aço e revestidas internamente com um verniz especial.
José Israel passou o protocolo de fabricação à Metalúrgica Mococa (empresa paulista da cidade homônima, existente até hoje), que se tornou a sua fornecedora de latas. Assim, em 1971, começaram a ser produzidos os vinhos em lata da marca Vinhas de Israel, que, portanto, foram os primeiros vinhos em lata do Brasil.
Eram vinhos de mesa brancos, rosés e tintos, feitos com as mesmas uvas usadas nos vinhos de garrafa e garrafões e, também, com a uva vinífera Cabernet Sauvignon, comprada na Serra Gaúcha. Eles fizeram sucesso e, com o aumento das vendas, a Metalúrgica Mococa, então uma empresa pequena, não conseguiu atender à demanda e passou a dividir a produção com as metalúrgicas Matarazzo, Prada e Rheen.
No mesmo ano de 1971, a cervejaria Skol lançou a primeira cerveja em lata do Brasil, feita em “folha de Flandres”. Em 1989, lançou a primeira cerveja em lata de alumínio do país. A partir daí, as metalúrgicas, que antes produziam latas de “Flandres”, direcionaram sua produção para latas de alumínio. Além disso, na época, não havia tecnologia para envasar o vinho em alumínio. Assim, a produção dos vinhos em lata Vinhas de Israel cessou em 1990.
José de Alencar faleceu aos 66 anos em 2003, mas a ideia de voltar a produzir vinhos em lata continua sendo acalentada por seus sucessores. Segundo sua filha Maria Salete, atual gestora da empresa, seus sobrinhos Gustavo e Tadeu, que trabalham com ela na empresa, planejam reativar a produção dos vinhos em lata, pois hoje há tecnologia eficiente para fazê-lo. Nossos votos de sucesso à família nessa empreitada.
Texto originalmente publicado na Vinho Magazine (Edição 126)
Por Dr. Júlio Anselmo de Souza Neto
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