Embora Lewis Carroll tenha criado Alice no País das Maravilhas só em 1864, já era conhecida na Inglaterra a curiosa "doença do chapeleiro maluco"
Publicado em 09/12/2024, às 20h00
Talvez você conheça 'Alice no País das Maravilhas' pela antiga animação da Disney de 1951 ou através da adaptação cinematográfica de Tim Burton de 2010. Porém, nem todos sabem que a história fantástica surgiu ainda no século 19, chegando às livrarias da Inglaterra pela primeira vez em 1864, escrita por Lewis Carroll.
Após Carroll criar um dos personagens mais emblemáticos da fantasia, o Chapeleiro Maluco, muita gente acredita que a expressão "louco como um chapeleiro" — frequentemente usada em inglês, "mad as a hatter" — vem do livro que narra as aventuras de Alice. No entanto, esse ditado surgiu décadas antes, por volta de 1820.
Mas afinal, de onde surgiu a expressão, e o que associa chapeleiros a algum tipo de "loucura"?
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Segundo a Super Interessante, nos séculos 18 e 19 chapeleiros ingleses apresentaram sintomas em comum, incluindo comportamentos estranhos, o que serviu como base para a expressão "louco como um chapeleiro". Existia uma coisa em comum ao ofício: na época, fabricantes de chapéu utilizavam um produto chamado nitrato de mercúrio para tratar os pelos de animais que seriam utilizados nos chapéus.
No processo, extraíam a pelagem de animais pequenos, especialmente coelhos, e agrupavam para formar um tipo de feltro. Então, passavam uma substância laranja com nitrato de mercúrio, que servia para deixar aquele tecido macio. Em seguida, o feltro era mergulhado em água quente, secado, e finalmente poderia ser utilizado para confeccionar chapéus.
Porém, um detalhe é que esses trabalhos ocorriam, geralmente, em locais fechados, de forma que os fabricantes de chapéu inalavam diretamente o vapor de mercúrio na sala, liberado durante o processo descrito. Como sabemos hoje, esse metal pode se acumular no corpo das pessoas, o que acontecia com os chapeleiros, e causava uma série de sintomas.
Vale mencionar que nitrato de mercúrio começou a ser utilizado na indústria de confecção de chapéus ainda no século 17, na França, e acabou posteriormente adotado pelos ingleses. Os riscos de contaminação por mercúrio era de conhecimento de alguns — ainda assim, muitos fabricantes seguiam se dedicando ao método, inclusive, sem equipamentos de proteção.
Com o tempo, esses chapeleiros apresentavam, muitas vezes, tremores, timidez, irritabilidade, fala arrastada e, em alguns casos, até depressão, alucinações e mudanças de comportamento.
Hoje, esses sintomas são associados ao eretismo, uma síndrome neurológica provocada justamente pela intoxicação de mercúrio — por ser recorrente entre chapeleiros, se popularizou como "doença do chapeleiro maluco".
Apesar de todas as semelhanças entre o personagem de Lewis Carroll com alguns sintomas da chamada "doença do chapeleiro maluco", não há qualquer confirmação de que o Chapeleiro Maluco sofria realmente com eretismo.
Isso porque os primeiros diagnósticos de intoxicação pelo metal surgiram na mesma década que o livro foi publicado, logo, não há a certeza de que o autor tivesse consciência dessa informação quando criou a obra.
Ainda assim, não se descarta a possibilidade de que Carroll tenha conhecido algum chapeleiro com tais sintomas.
Porém, quanto a inspirações, vale mencionar que o personagem foi, de fato, inspirado em uma pessoa próxima ao escritor: Theophilus Carter, um vendedor de móveis que morava próximo de Oxford e, segundo registros, era excêntrico.
Ele, inclusive, era chamado de "chapeleiro maluco" por conhecidos, devido a um acessório que carregava sempre em sua cabeça.