Pesquisa da Universidade de Cambridge demonstra que uma catástrofe real na Islândia inspirou a mudança de fé nos anos que se seguiram
Letícia Yazbek Publicado em 20/03/2018, às 13h17 - Atualizado às 17h01
A partir da análise de amostras de gelo e anéis de crescimento de árvores, uma equipe de cientistas e historiadores da Universidade de Cambridge conseguiu datar a enorme erupção do vulcão Eldgjá, que aconteceu pouco tempo depois de a Islândia ser colonizada pelos vikings. Depois, confrontaram seus achados com o poema medieval mais conhecido no país, que descreve o fim do culto aos deuses e o surgimento de um deus único, relatando uma situação apocalíptica na mesma época.
Na erupção do Eldgjá, enormes rios de lava engoliram a paisagem, acompanhados por uma névoa de gases sulforosos. Esse tipo prolongado de atividade vulcânica é recorrente na Islândia – o último exemplo aconteceu em 2015, quando a erupção do Eyjafjallajokull afetou a qualidade do ar a 1.400 quilômetros de distância.
A pesquisa indica que a erupção começou na primavera de 939 e perdurou pelo menos até o outono de 940. Nessa época, os vikings já habitavam a ilha - a colonização começou em 874. “Algumas pessoas que chegaram na primeira leva de colonizadores podem ter testemunhado a erupção”, afirma Clive Oppenheimer, pesquisador do Departamento de Geografia da Universidade de Cambridge, em declaração oficial.
As consequências foram previstas no estudo. A camada de poeira reduziu a quantidade de luz solar que atingia a superfície, levando a um dos verões mais frios em 1500 anos. E não só na Islândia. “As pessoas sofreram com as consequências da erupção do norte da Europa até o norte da China”, diz Tim Newfield, do Departamento de História e Biologia da Universidade de Georgetown. “Houve infestações de gafanhotos e mortes de gados, e muitos lugares sofreram com a falta de alimentos.”
Segundo Andy Orchard, professor da Faculdade de Inglês da Universidade de Oxford, os efeitos imediatos da erupção do Eldgjá devem ter sido devastadores para a população da época. "No entanto, não há textos sobreviventes que nos contem [objetivamente] sobre isso".
Não há relatos direitos, isto é. Os pesquisadores acreditam que o poema medieval mais conhecido da Islândia, Voluspá (“A Profecia da Vidente”) dá uma ideia de como a erupção do Eldgjá afetou a vida das pessoas. Ele foi escrito por volta de 961, anos depois do fenômeno. O poema descreve como condições apocalípticas marcariam o fim do culto aos deuses pagãos e o início de uma nova era, de adoração a um único Deus. Era a conversão da Islândia ao Cristianismo, que aconteceu oficialmente apenas no ano 1000.
Parte do poema descreve a erupção, como se o autor a tivesse testemunhado: “O Sol começa a ficar preto, o solo afunda no mar. As estrelas brilhantes se dispersam no céu, e as chamas voam alto em direção ao firmamento.” Ele também relata o verão frio que se seguiu à erupção.
As imagens descritas no poema marcam o fim do mundo conhecido até então — é a morte dos deuses pagãos e o início de uma nova era. De acordo com os pesquisadores, essas descrições foram adicionadas para reavivar as memórias da erupção e incitar uma transformação religiosa que já havia iniciado.
"A interpretação do poema como uma profecia do fim do culto aos deuses pagãos e o surgimento de um único Deus sugere que as lembranças da erupção foram provocadas propositalmente para estimular a Cristianização da Islândia.", afirma Oppenheimer. Assim, os vikings teriam passado a acreditar nas palavras dos pregadores cristãos e abraçado a nova crença.
A cristianização entre os nórdicos — viking é o nome de uma profissão, dos aventureiros marinhos — começou no século 10. O primeiro país a oficialmente abandonar Thor e Odin foi a Noruega, com a conversão do rei Harald Dente-Azul (Harald Blåtand) declarando sua fé em 975.
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