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O soldado do amanhã

Uma revolução tecnológica vem transformando o combatente terrestre em uma máquina ainda mais letal, consciente do terreno em que atua e munido de dados em tempo real

Carlos Emilio Di Santis Junior Publicado em 01/04/2008, às 00h00 - Atualizado em 23/10/2017, às 16h36

A guerra moderna – sem levar em conta a altíssima tecnologia disponível hoje por meio de armas guiadas de longo alcance, navios, aviões de combate invisíveis ao radar e tanques superblindados – continuará a ser decidida pela força representada por soldados. De nada adianta um país ter grande quantidade de armas avançadas se o inimigo mantém-se ativo pela presença de combatentes operando a pé.

Exemplos que sustentam essa afirmação são abundantes na história. No Iraque, os Estados Unidos, donos de uma máquina de guerra fantástica, não conseguiram pôr fim ao conflito em definitivo, sendo arrastados para combates infindáveis de desgaste com grupos de resistência à ocupação – convenientemente chamados pela tendenciosa mídia ocidental de “rebeldes”. Na verdade, esses grupos de resistência iraquianos usam de seus escassos meios de combate, como fuzis AK-47 e lança-rojões RPG-7, para infligir pesadas baixas nas forças invasoras (americanos e seus aliados) e, na seqüência, fugir para desgastar seus inimigos.

No campo de batalha, os Exércitos foram incorporando inovações nos equipamentos, como a adoção de fuzis de assalto automáticos com grande capacidade de munição e o uso de coletes balísticos, eficientes em assegurar maior probabilidade de vida ao soldado atingido em combate. Essas mudanças, porém, foram mais eficientes quando ainda se tratavam de novidades.

Hoje, todas as nações possuem forças armadas equipadas de forma relativamente similar, nivelando-as. Para as forças americanas conseguirem uma vantagem tática neste novo ambiente, por meio de uma maior capacidade de consciência situacional em combate, foi criado o programa de modernização de soldados chamado Land Warrior.

“Guerreiro terrestre”

O Land Warrior é um sistema que integra o capacete, sistemas de comunicação de voz e dados, sistema de posicionamento global (GPS), de navegação e armamento. No capacete do soldado, foi incorporado um monitor monóculo para fazer a visada da arma principal por meio de uma câmera com zoom e visão noturna instalada no fuzil. Ele também pode visualizar as informações do sistema computadorizado, cujo software gerencia os dados de posicionamento.

O soldado, seus colegas e forças aliadas são mostrados num mapa previamente carregado da área a ser dominada. A capacidade de determinar com exatidão onde cada integrante da equipe se encontra permite uma integração inédita em situação de combate. Dessa forma, o defensor, que sempre esteve em vantagem, tem sua condição anulada pela superioridade da consciência situacional do atacante com o sistema Land Warrior.

O GPS integrado a um sistema de navegação permite que uma equipe Land Warrior faça uma infiltração aérea noturna e se reúna muito mais rapidamente quando em terra, do que nas infiltrações comuns. O Computer Radio Subsystem (CRS) integra o receptor do GPS ao rádio, permitindo o intercâmbio de dados, como imagens, por exemplo, entre todos os integrantes da equipe. É interessante notar que essa é uma característica inteiramente nova quando se fala em capacidades disponíveis para soldados.

Há pouco tempo, uma condição como essa era praticamente exclusividade de aeronaves de combate e navios de guerra, que já executam a troca de dados com vistas a uma maior consciência situacional. O Land Warrior beneficia-se muito da miniaturização dos componentes eletrônicos, permitindo o transporte individual de muitos equipamentos avançados que antes só eram vistos em veículos.

Melhorias

Um desafio desse sistema é a necessidade de manter o equipamento funcionando pelo tempo suficiente ao cumprimento da missão. Por isso está em desenvolvimento um novo tipo de bateria que permita uma autonomia adequada. Hoje ela gira em torno de 48 horas de funcionamento, mas o objetivo é que o equipamento tenha condições de se manter durante uma semana.

O software operacional do sistema é o Microsoft Windows 2000, o que facilita muito sua interface, na medida em que é bastante comum e de conhecimento da grande maioria das pessoas. Porém já existe um protótipo que usa o sistema Linux. Seu processador é uma unidade Pentium 4 da Intel, de alta velocidade. Para mover o cursor do software, existem dois mouses. Um fica no ombro esquerdo do soldado e o segundo fica no fuzil, facilitando a manipulação do sistema quando em combate – não é preciso tirar a mão da arma.

Para efeito de segurança, como forma de evitar que o inimigo tenha acesso às informações disponíveis no disco de memória HD do sistema, em caso de captura ou morte do soldado, existe um chip de acesso SIM card (como nos celulares GSM), que é codificado. Só o usuário tem o código de acesso.

O armamento, por sua vez, está integrado ao sistema Land Warrior por meio de uma câmera montada no fuzil e usada para mirar alvos de forma indireta, sem que o soldado tenha de se expor. Por exemplo, se ele estiver protegido em uma trincheira, não precisará deixá-la para ter uma posição de tiro. Bastará colocar a arma para fora da trincheira que a câmera irá transmitir as imagens do alvo, podendo fazer a visada por meio do monitor monóculo de seu capacete.

Esse sistema é fundamental para garantir uma vantagem tática durante troca de tiros, principalmente se o campo de batalha for em área urbana. O armamento atual do Land Warrior é a carabina M4A1 SOPMOD, equipada com uma mira eletroóptica que usa câmera, intensificador de luminosidade e telêmetro a laser que indica a distância do alvo. A carabina M4 SOPMOD possui também trilhos picatinny para montagem de acessórios em todas as posições da telha. Normalmente se vê uma manopla de manobra na posição 6 horas, uma lanterna na posição 3 horas e um apontador a laser às 12 horas.

O leitor deve estar pensando: “quanto pesa todo esse material?”. Essa questão revela um dos mais difíceis problemas a serem resolvidos no programa de desenvolvimento. Hoje o sistema pesa o mesmo que o atual equipamento-padrão do soldado americano: 36 quilos. A meta é diminuir essa carga para permitir uma melhora na mobilidade do combatente.

Mula-robô

O sistema descrito neste artigo representa o início de uma revolução para os combatentes terrestres. O Land Warrior será usado e estudado para uma futura atualização, na qual vão se integrar os sistemas do soldado com os equipamentos do sistema FCS (Future Combat System), que representa uma família de veículos de combate que tornarão as forças terrestres americanas mais ágeis no campo de batalha. Essa atualização, hoje, é chamada de Objective Force Warrior (OFW).

Um dos principais pontos em que o OFW irá contribuir é no fator peso. Como foi dito anteriormente, a carga do sistema tem representado um problema para os soldados. O programa OFW fará com que o peso seja reduzido para 25 quilos, uma diminuição de quase 30% em relação à versão em uso do Land Warrior. Outra prioridade do programa é desenvolver sistemas que promovam a consciência situacional do soldado, já bastante ampliada com o equipamento atual.

Seguindo uma linha mais radical, o programa OFW irá mudar também os capacetes. Diferentemente do Land Warrior, que apenas incorporou alguns dispositivos novos ao modelo-padrão do Exército norte-americano, o novo capacete do OFW terá uma tela integral, que funcionará como o Head Up Display (HUD), usado como sistema de mira e navegação em aviões de combate.

Ele irá exibir diversas informações úteis para o soldado nos campos de batalha sem que este tenha de tirar os olhos do cenário a sua frente. O novo modelo ainda terá imagem térmica para visão noturna ou em situações de baixa visibilidade, além, é claro, da capacidade de visualizar no próprio display o ponto para onde a arma principal (fuzil) esteja apontando.

Um elemento interessante integrado ao programa OFW são os robôs, como o Robotic Infantry Support System (RISS), espécie de mula mecânica que transportará os equipamentos dos combatentes de forma autônoma, apenas seguindo seus movimentos. Além disso, a mula robótica deverá contar com outros dois robôs auxiliares de reconhecimento, chamados de cães e águias, cuja função será a coleta de informação por ar e terra para retransmissão ao comando do pelotão.

Obviamente, os Estados Unidos não são os únicos a terem um programa de modernização para seus soldados. Embora eles estejam mais adiantados no desenvolvimento de soluções com esse objetivo, diversas outras nações têm, também, programas para aumentar a letalidade de suas tropas com melhorias nos equipamentos transportados pelos soldados. Os maiores programas desse tipo fora dos Estados Unidos são o Felin, da França, o Fist, da Inglaterra, e o idZ, da Alemanha. As capacidades desses projetos são relativamente similares, com um ou outro se destacando em determinados aspectos. Futuramente, serão detalhados aqui cada um desses sistemas de desenvolvimento.

 

Para saber mais

SITES

www.army-technology.com/projects/land_warrior/

Army Technology, site especializado em indústria bélica.

www.fas.org/man/dod-101/sys/land/land-warrior.htm

Site da Federation of American Scientists (Federação de Cientistas Americanos).

 

Acervo

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