Após seu casamento, Hitler viveu momentos de tensão e despedidas no Führerbunker; "Eu quero ser um lindo cadáver", desejou Eva Braun
Fabio Previdelli Publicado em 28/01/2024, às 09h00 - Atualizado em 19/02/2024, às 18h28
Com a derrocada iminente dos nazistas, Adolf Hitler se casou com Eva Braun, sua namorada de longa data, nas primeiras horas daquele 29 de abril de 1945. Após um breve almoço de recepção, por volta das quatro horas da manhã, o Führer se dirigiu ao lado da secretária Traudl Junge para outra sala — onde ditou sua última vontade e seu testamento.
No dia seguinte, o Exército Vermelho já marchava pela capital alemã. Aproximadamente às 14h30, Adolf e Eva entraram no escritório do Führerbunker e, após uma hora, um tiro foi ouvido. Hitler havia se alvejado na têmpora direita; já Braun não tinha marca visível de feridas, mas o forte cheiro amendoado deixava claro seu envenenamento por cianeto.
+ O que aconteceu com o cadáver de Hitler?
Emma Craigie e Jonathan Mayo recriaram meticulosamente cada detalhe do último dia de vida de Adolf Hitler no livro 'O último dia de Hitler: Minuto a minuto', lançado em 2015. Confira abaixo como foi a linha do tempo dos últimos momentos de vida do líder do Terceiro Reich!
Nas primeiras horas do dia, a população de Berlim deixa seus respectivos bunkers em busca de alimentos. Neste momento, o mensageiro da Juventude Hitlerista Armin Lehmann, de 16 anos, se mostra horrorizado com os civis morrendo de fome — principalmente após ver dois homens atacando um cavalo com uma faca.
Outro mensageiro da Juventude Hitlerista chega ao bunker e traz notícias 'desesperadoras': os tanques russos já estão a cerca de 500 metros da Chancelaria do Reich.
Vale ressaltar que tanto os bunker superiores como os inferiores, onde Hitler e funcionários do Reich viviam desde janeiro, estavam abaixo da Chancelaria do Reich. O líder nazista passou a maior parte do tempo na sessão inferior, no Führerbunker, que era protegido com um telhado de concreto de 3 metros.
Neste horário, o general Hans Krebs, no escritório do bunker superior, estava no telefone com o quartel-general do Exército de Berlim; que lhe informara que a defesa alemã estava prestes a entrar em colapso em todas as frentes. De repente, a linha ficou muda.
Com a derrubada de um balão que sustentava as comunicações radiofônicas, todos os telefones na capital alemã ficaram sem linha. As notícias só chegarão com a determinação de jovens da Juventude Hitlerista, que passaram a arriscar suas vidas para ir do QG do Exército até o Führerbunker.
Foi um pesadelo… um jogo de roleta russa", lembrou Armin Lehmann. "Aqueles que saíram do abrigo estavam colocando a vida em risco".
"Na melhor das hipóteses, eles ficariam com a boca cheia da nuvem constante de fumaça de fósforo e gasolina venenosa das bombas incendiárias; na pior das hipóteses, seriam abatidos por um foguete russo. A Wilhelmstrasse [rua central de Berlim] fedia com o cheiro de corpos chamuscados".
Aqueles que se recusassem a seguir as ordens eram usados como exemplo. Lehmann, inclusive, fora preso brevemente após olhar o corpo de um menino que havia sido enforcado em um poste com um pedaço de varal: "ele não devia ter mais de 13 anos", se recorda.
O mordomo de Hitler, Heinz Linge, bate na porta do quarto do Führer para ajudá-lo a se vestir, algo comum nos últimos seis anos. O processo é uma espécie de um ritual: Linge usa um relógio para cronometrar o processo, que começa quando Adolf entoa: "Los" (algo como 'em suas marcas'). Quanto mais rápido é feito o processo, melhor seria o humor de Hitler.
Mas nesta manhã em específico, o tirando nazista já estava deitado na cama totalmente vestido. A única exceção seria sua gravata, que também contava com uma cerimônia: em frente a um espelho, o ditador ficava de olhos fechados contando os segundos enquanto Linge fazia o nó. Então, ele abria os olhos e verificava tudo diante o espelho.
Minutos depois, o barbeiro de Hitler, August Wollenhaupt, adentra o local para seu trabalho quinzenal de aparar o cabelo e bigode do Führer — este último projetado para cobrir as narinas grandes do ditador.
Enquanto isso, seu mordomo administra gotas de cocaína no olho direito de Adolf, que reclamava de dores intensas nos últimos dias. O líder também recebe 'pílulas anti-gases' para usar durante o dia — que aliviariam suas cólicas estomacais e flatulências.
Aquele era o primeiro momento em nove anos que Hitler não contava com o apoio de um médico pessoal, visto que havia dispensado o dr. Theodor Morell há uma semana; após um ataque de fúria, acusou o médico de tentar sedá-lo para tirá-lo de Berlim.
Embora Morell tenha partido, ele deixou um armário cheio de medicamentos, o que incluia injeções de glicose e anfetaminas, usadas diariamente para aumentar a energia do ditador.
Aquela altura, Hitler tomava 28 pílulas e injeções diferentes todos os dias. Hipocondríaco, o tirano sofria da doença de Parkinson e de um problema cardíaco, assim como inúmeras condições relacionadas ao estresse.
Ainda naquela hora, antes de dispensar Linge, o ditador pediu que seu mordomo levasse Wulf, seu cachorro favorito entre os nascidos no bunker, para junto de Blondi — a cadela pastor-alemão de Adolf.
Os seis filhos de Joseph e Magda Goebbels brincavam no corredor do bunker superior. A maioria está entusiasmada por viver no local, que eles chamam de "caverna". Eles também fizeram muitos amigos por lá, incluindo Rochus Misch, o gigante gentil da mesa telefônica. Para ele, as crianças inventaram até mesmo uma rima: "Misch, Misch du bist ein Fisch!" (ou 'Misch, Misch, você é um peixe!', em tradução livre).
Segundo a secretária Traudl Junge, que ajudara nos cuidados, as crianças eram encantadoras e bem-educadas. Naquele momento ninguém poderia prever o destino que as esperava.
Hitler está almoçando junto de Eva Braun e duas de suas secretárias. Desde o início de Batalha de Stalingrado, em agosto de 1942, o Führer compartilha refeições com elas; até mesmo durante o chá nas primeiras horas da manhã. As funcionárias são orientadas a não trazerem questões difíceis para a mesa. Mas, naquela ocasião, é Adolf que começa:
Nunca cairei nas mãos do inimigo, vivo ou morto", diz. "Estou deixando ordens para que meu corpo seja queimado para que ninguém possa encontrá-lo".
Traudl Junge, que come mecanicamente, não demonstra reação enquanto Hitler conversa sobre o melhor método de suicídio. "A melhor maneira é dar um tiro na própria boca. Seu crânio está quebrado e você não percebe nada. A morte é instantânea".
Eva, porém, fica horrorizada: "Eu quero ser um lindo cadáver… Vou tomar veneno". Então, ela mostra às funcionárias uma caixinha de latão em seu bolso onde guarda um frasco com cianeto.
"Eu me pergunto se dói muito", continua. "Estou com tanto medo de sofrer por muito tempo... Estou pronto para morrer heroicamente, mas pelo menos quero que seja indolor".
Hitler, no entanto, faz questão de tranquilizá-la: "Os sistemas nervoso e respiratório ficam paralisados em segundos". Junge e Gerda Christian trocam olhares e depois questionam o Führer em tom uníssono: "Você tem algum frasco que possamos usar?".
Nenhuma delas está disposta a cometer suicídio, mas o veneno pode ser preferível à captura pelos russos. O ditador garante que cada uma delas receberá um.
Nos banheiros em frente à central telefônica, Blondi está tremendo enquanto seu treinador, o sargento Fritz Tornow, segura seu nariz e força a abertura de sua mandíbula. Enquanto isso, um dos médicos da chancelaria, Werner Haase, esmaga uma cápsula de cianeto dentro de sua boca com um alicate.
Blondi cai de lado "como se tivesse sido atingido por um raio". Hitler inspeciona seu cadáver. O Führer precisa ver por si próprio que as cápsulas de cianeto realmente funcionam. O cheiro de amêndoas amargas dominam o ambiente.
Tornow carrega o corpo de Blondi até os jardins da Chancelaria, onde a enterra. Então ele volta para buscar Wulf e os outros quatro pets, leva-os ao jardim para serem fuzilados e enterrados com a mãe.
Na sala verde da Chancelaria do Reich, o chefe de propaganda Joseph Goebbels e sua família se despedem de alguns membros da Juventude Hitlerista. Por volta de 40 pessoas se reuniram, incluindo funcionários e pacientes do hospital de emergência instalado no porão da Chancelaria.
Depois de uma refeição de sopa de ervilhas, Goebbels pede à Juventude Hitlerista que cante algumas das antigas canções de luta nazistas. Seus filhos se juntam ao redor da mesa e começam a cantar canções folclóricas alemãs e canções de ninar, acompanhados por um jovem soldado que toca acordeão.
Hitler se senta à mesa na sala de conferências do Führerbunker para ler a transcrição de uma transmissão sobre a morte do ditador italiano Benito Mussolini. Heinz Linge está atrás dele, visto que parte do seu dever é garantir que o ditador tenha sempre acesso a lápis, óculos, lupas, atlas e bússolas.
Nesta ocasião, porém, Hitler não precisa de óculos nem de lupa, pois a transcrição foi digitada em fonte extra grande. Adolf só usa um lápis para sublinhar as palavras: "pendurado de cabeça para baixo".
Apesar disso, ele mantém a esperança de que Berlim possa ser aliviada. Ele ordena que uma mensagem de rádio seja enviada às forças alemãs, perguntando quando e onde ocorrerão seus ataques — o que só mostra sua completa desconexão com a realidade militar; visto que mais nenhum comandante acredita na possibilidade de salvar a capital.
Cerca de 25 guardas e funcionários foram convocados da Chancelaria do Reich para o Führerbunker. Hitler diz que pretende tirar a própria vida em vez de ser capturado pelos russos.
Não quero ser exibido como uma exposição em um museu", afirma.
Em seguida, ele se arrasta ao longo da fila de pessoas, apertando a mão de cada uma delas, agradecendo pelos serviços prestados e dizendo que estão isentos de seu juramento de lealdade.
O Führerbunker está fantasmagoricamente silencioso, exceto pelo zumbido do gerador a diesel e pelos sons distantes de uma festa barulhenta, em algum lugar na Chancelaria do Reich.
Enquanto buscava um banheiro, o médico da SS, professor Ernst Schenck — que já fez experiências com prisioneiros no campo de concentração de Dachau —, vê uma porta aberta. Na parte de dentro da sala, Hitler está parado ao lado de uma mesa, conversando com outro médico: o Dr. Haase.
O ditador diz que deseja morrer no mesmo instante que Eva. Eles concordam que ele terá duas pistolas (caso uma emperre), e duas cápsulas de cianeto (se uma falhar). Eva também terá duas cápsulas.
Adolf é orientado para colocar uma cápsula na boca e segure a pistola na altura das sobrancelhas em ângulo reto, com o cano apoiado na têmpora. Então ele atirará e morderá simultaneamente.
Mais tarde, Haase fala com Eva, que está preocupada em não conseguir se matar caso algo dê errado e Hitler morra primeiro. O médico auxilia que ela morda a cápsula no momento em que ouvir um tiro.
Hitler está sentado em uma cadeira ao lado da cama, usando chinelos de couro macio e um roupão de cetim preto por cima da camisa de dormir. Ele acabou de convocar o General Mohnke para perguntar: "Quanto tempo podemos aguentar?".
"Vinte ou 24 horas no máximo, meu Führer", respondeu. Enquanto isso, a primeira companhia de soldados russos avança em direção ao Reichstag, mas são detidos pela defensiva alemã.
Pelo segundo dia consecutivo, o mordomo de Hitler encontra seu mestre deitado em sua cama, vestido com paletó de uniforme e calças pretas. O ditador leva o dedo aos lábios, levanta-se e caminha silenciosamente pelo corredor.
Martin Bormann e os generais Krebs e Burgdorf estão dormindo nos bancos do lado de fora de seu quarto. Ao lado deles há garrafas de schnapps e pistolas carregadas. Ambas as secretárias dormem em camas de campanha na sala de conferências — o que evidencia o frenesi de libertinagem e bebedeira que ocorreu na Chancelaria do Reich durante a madrugada.
Na sala da central telefônica, Hitler transmite uma mensagem por rádio ao comandante de Berlim, pedindo uma atualização. A resposta vem rapidamente: "os russos estão nas proximidades".
Eva Hitler não conseguiu dormir. Ela sobe apressadamente os degraus de concreto que levam ao jardim da Chancelaria do Reich. Também sente uma vontade repentina de "ver o sol mais uma vez".
Mas o jardim foi destruído por bombardeios e o céu está escurecido pela fumaça da batalha do Reichstag. Ela hesita brevemente antes de voltar para seu quarto. Meia hora depois, Adolf Hitler segue o exemplo da esposa e sobe os degraus do jardim. À medida que ele chega ao topo, os sons dos bombardeios se intensificam. Em vez de abrir a porta, ele se vira e desce lentamente. Aquele seriam seus últimos passos!
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