Trajano conquistou a Dácia e ampliou o império romano até o máximo de seu território
Texto Ernani Fagundes Publicado em 01/04/2012, às 17h38 - Atualizado em 23/10/2017, às 16h36
No início do século 2, Trajano tornou-se o primeiro imperador que não nasceu em Roma. Da Espanha, sua terra natal, acompanhou o pai em conquistas nos limites do império, em especial no Oriente Médio. Menino, dormia nos acampamentos e aprendeu que a riqueza romana vinha sobretudo das conquistas militares. Quando chegou ao poder, sabia exatamente o que fazer. Por meio da conquista da Dácia, na atual Romênia (qualquer semelhança do nome com Roma não é coincidência), levou o império à sua máxima extensão. Motivado por duas vitoriosas campanhas militares (101-102 e 105-106) na região, moveu-se por todas as franjas do império e consolidou as fronteiras até a Armênia e a Mesopotâmia.
Roma era rica não só por causa dos impostos de suas províncias. Das regiões mais distantes fluíam riquezas, que chegavam à cidade. Além do trigo egípcio, que movimentava as padarias públicas para alimentar 200 mil pobres de graça (o bolsa-família da época), mercadores faziam fortuna com madeira, vidro, mármore, papiro, tecidos, linho, couro, lã e cavalos. Para comprar as mercadorias importadas, os trabalhadores e escravos produziam artesanato, carroças e tecidos, enquanto os camponeses vendiam alimentos. Era uma economia financiada pela guerra. "O ganho econômico era para os romanos parte integrante da guerra vitoriosa e da expansão do poder", afirma o historiador Willian Harris, autor de War and Imperialism in Republic Rome (Guerra e Imperialismo na República Romana).
Para entender por que a conquista da Dácia foi importante, é necessário voltar ao tempo do antecessor de Trajano, Domiciano. Cássio Dio, em A História de Roma, afirma que o antecessor de Trajano era "cruel e traiçoeiro". Até aí, nenhuma novidade - quase todos os imperadores eram descritos dessa forma. Mas Domiciano cometeu um erro que o tornou impopular: elevou os impostos para pagar o aumento de um terço dos salários de seus soldados. "Ele escravizou o próprio império", afirmou Cássio Dio.
Para justificar os gastos e reduzir o prejuízo, Domiciano diminuiu o número de soldados e fez campanhas de saques nas fronteiras do império. Numa delas, contra a Panônia (região ao sul da atual Alemanha), o imperador resolveu pedir auxílio aos dácios.
Naquele momento, o rei dos dácios, Decébalo, que já havia enfrentado Domiciano invadindo terras na fronteiras, aproveitou a oportunidade para fazer um acordo de paz com garantias de posse e poucos tributos. Quando, em 96, Domiciano foi morto por uma conspiração palaciana, Decébalo deu o acordo por encerrado e os dácios violaram a fronteira natural, o rio Danúbio. Trajano foi então convidado pelo Senado a intervir.
Suas campanhas militares são conhecidas pelas figuras da monumental Coluna de Trajano, ainda preservada no centro histórico de Roma. A narrativa no friso em baixo-relevo representa não apenas as batalhas mas também cenas de transferências de tropas, trabalhos em fortificações, sacrifícios e embaixadas e, em alguns casos, episódios que devem ter sido narrados na obra Commentarii, livro escrito pelo próprio Trajano, que não chegou aos dias atuais. Tamanha homenagem em pedra não era por acaso.
O inimigo estava incrustado no alto das montanhas Orastie, numa área de díficil acesso. Para cumprir a tarefa, Trajano, segundo o exagerado Cássio Dio, mobilizou 120 mil homens na campanha (mais de 10% da população da cidade na época). Claro, a força de guerra era bem menor, mas o imperador precisava de homens para carregar provisões, navegadores experientes para atravessar o Mediterrâneo, lançar barcos no Danúbio e construir estradas para levar máquinas de cerco até a fortaleza de Sarmizegetusa Regia, a capital dos bárbaros.
Trajano atravessou o Danúbio com 13 legiões (cerca de 60 mil homens) na localidade de Viminacium e enfrentou o inimigo na Batalha de Tapae, na Transilvânia. "Ele viu muitos feridos em seu próprio lado e as legiões mataram muitos dos inimigos", relata Cássio Dio. Na primavera seguinte, o imperador estava de novo às portas de Sarmizegetusa, e Decébalo pediu paz. "Caído ao chão, fez a reverência. Trajano aceitou, assentou guarnições aqui e ali e retornou à Itália", diz o historiador. A paz durou só 3 anos, tempo para os bárbaros se reagruparem. Nesse período, Trajano mandou construir uma ponte de pedra sobre o Danúbio com 15 m de altura. Era o necessário para atravessar as máquinas de cerco para a decisiva batalha de Sarmizegetusa (leia ao lado), confronto que selou a submissão dos dácios e a morte de Decébalo.
A Batalha de Sarmizegetusa
No cerco, romanos usaram bolas incendiárias
No cerco final, Trajano tinha 18 mil homens contra um número bem menor de dácios, protegidos em cidadelas nas montanhas Orastie. O primeiro ataque dos legionários à fortaleza principal foi repelido pelos dácios com pedras e flechas. Antecessores dos hunos na região, os dácios já conheciam uma arma terrivelmente poderosa, o arco composto. Das muralhas, atiravam com grande precisão a longa distância. Os romanos se valeram de armas de cerco para atacar as muralhas e construíram plataformas para alcançar os muros. Entre as máquinas de guerra, estavam o aríete para derrubar portões e torres de cerco, com proteção para alcançar o topo das muralhas.
Os legionários cercaram a fortaleza de Sarmizegetusa Regia construindo um muro de madeira para impedir fugas e busca de reforços. Entre uma linha e a outra, posicionavam catapultas de torção para atirar pedras. Os romanos também utilizaram bolas incendiárias, o que causou incêndios em toda a cidadela. Para atirar os projéteis, os legionários se valiam do onagro, uma catapulta para flechas, dardos e pedras envolvidas em bolas de tecido embebidas em betume. As tubulações de água que abasteciam a cidadela foram danificadas, obrigando os dácios a se render. Mas algumas fortificações, em outras regiões da Dácia, possuíam água em poços intramuros. Quando isso ocorria, a alternativa era apertar o cerco até que as provisões de alimentos terminassem e os sitiados se rendessem pela fome.
Ao perceber a iminente derrota, Décebalo suicidou-se. Na versão de Cássio Dio, Bicílis, amigo de Decébalo, relatou onde estava escondido o tesouro do rei. Do leito do rio Sergetia, os homens de Trajano retiraram uma fortuna em ouro e prata. A pilhagem financiou a construção da Basílica Ulpia, do Fórum do imperador e do local conhecido como Mercado de Trajano.
Saiba mais
Site
A História de Roma, Cássio Dio.
Domínio público, em inglês, na Universidade de Chicago (EUA). http://migre.me/8pVCc
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