Ocorrido há 91 anos, o incêndio no Reichstag ajudou Adolf Hitler a consolidar o seu poder em uma Alemanha fragilizada
No dia 27 de fevereiro de 1933, exatos 28 dias após a ascensão do Partido Nazista ao poder na Alemanha, pessoas que se encontravam nas proximidades do Reichstag (Parlamento) em Berlim, perceberam pequenos focos de incêndio no edifício. Antes que pudessem avisar as autoridades, enormes labaredas irromperam, consumindo a construção por inteiro e em pouquíssimo tempo.
O que aconteceu? Até hoje não existe uma explicação convincente e provavelmente nunca haverá. Os protagonistas estão mortos há muito tempo e os documentos da época não esclarecem o evento de forma convincente.
Curto-circuito não irrompe com tamanha ferocidade em tão pouco tempo. Pode ter existido uma grande quantidade de material inflamável depositado nas dependências. Há evidências de que tropas de choque nazistas da SA entraram no edifício com carregamentos ‘de origem desconhecida’.
Para acobertar a participação nazista no crime, a polícia, agora respondendo ao novo governo, prendeu um holandês piromaníaco e comunista que confessou ter provocado o incêndio. Sua confissão, porém, mais parecia uma busca pela fama, pois, uma só pessoa não seria capaz de transportar tamanha quantidade de material de combustão para dentro do edifício.
Também foram presos três comunistas búlgaros, por sinal, um deles Georgi Dimitroff que, 12 anos depois, assumiria o poder na Bulgária com o apoio de Stalin e do exército soviético, que libertara o país da ocupação nazista.
No julgamento dos réus acusados pelo incêndio, talvez o último na Alemanha nazista onde a justiça ainda prevaleceu sobre as vontades do partido, os três búlgaros foram absolvidos por falta de provas e o holandês sentenciado a morte.
Dois fatores corroboram a cumplicidade dos nazistas no incêndio: o ódio à República de Weimar e à democracia, ambas representadas pelo parlamento e a necessidade de se criar um estopim para implodir a frágil democracia parlamentar.
De fato, quem se beneficiou do incidente foi o Partido Nazista. Enquanto o edifício ainda ardia, Hitler procurou o presidente da Alemanha, Marechal de Campo von Hindenburg (velho, doente e afundado na senectude).
Hitler convenceu-o sob impacto da tragédia, que, na realidade, se tratava de uma ‘intentona comunista’ e que o incêndio fora o sinal para o início da revolução soviética na Alemanha. Solicitou poderes absolutos para que o governo nazista pudesse salvar a democracia (cúmulo da hipocrisia).
Obteve a revogação temporária dos direitos civis, da liberdade de imprensa, da imunidade parlamentar, portanto, em poucas horas realizou todos os objetivos do nazismo que normalmente levaria anos para realizar ou, talvez, nunca os realizaria.
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Os opositores do regime foram presos, torturados ou mortos, muitos fugiram do país e poucos submergiram na clandestinidade. Não existia mais oposição nem mesmo neutralidade em relação ao nazismo. E as medidas temporárias se transformaram em permanentes. Não havia mais quem protestasse. E tudo isto sob o manto da legalidade.
E o que aconteceu na noite de 27 de fevereiro? Sabe-se que o holandês ingressou nas dependências do edifício à noite a fim de perpetrar suas pequenas maldades pirotécnicas.
Ele, joguete nas mãos dos nazistas, provavelmente nada sabia sobre os materiais inflamáveis ali depositados, nem sobre os gases que emanavam deles, saturando o ar. Talvez, tenha riscado um fósforo para enxergar na escuridão e com este gesto banal alterou em definitivo a história do século XX.
*O texto de Gabriel Waldman, escritor e sobrevivente do Holocausto, foi proporcionado pela StandWithUs Brasil, instituição que trabalha para lembrar e conscientizar sobre o antissemitismo e o Holocausto, de maneira a usar suas lições para gerar reflexões sobre questões atuais.