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Matérias / Albert Einstein

Refúgio em Norfolk: O local que acolheu Einstein da perseguição nazista

Inimigo número um do Terceiro Reich, Einstein precisou deixar a Alemanha após a ascensão de Hitler, período é retratado no documentário 'Einstein e a Bomba'

Fabio Previdelli
por Fabio Previdelli
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Publicado em 17/02/2024, às 00h00

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Einstein em Norfolk - Divulgação / Netflix
Einstein em Norfolk - Divulgação / Netflix

Na última sexta-feira, 16, estreou na Netflix o documentário 'Einstein e a Bomba', que retrata um dos períodos pouco conhecido na vida do físico alemão: seu esconderijo de três semanas em Norfolk, na Inglaterra. 

"É 1933 e Albert Einstein, o cientista mais famoso do mundo, é um fugitivo. Temendo por sua vida, a única opção é abandonar a Alemanha onde nasceu diante do avanço de Hitler, que começa a perseguição sistemática aos judeus", apresenta a sinopse da nova produção.

"Einstein precisa fugir da ameaça dos assassinos nazistas. Mas como uma celebridade mundial consegue sumir de vista? A resposta o leva a uma cabana de madeira em um campo de Norfolk e à desconhecida história do esconderijo inglês de Einstein. Um lugar que marca uma virada na vida do cientista, entre a Europa e os EUA, entre o pacifismo e a agressão e um momento que vai definir o relacionamento dele com a mais poderosa das invenções: a bomba atômica", continua. 

Com 1h15 de duração, o novo documentário da plataforma de streaming recria a vida de Einstein nesse período usado suas próprias palavras — resgatadas de seus discursos, cartas e entrevistas. 

Misturando uma sequência dramática com imagens reais de arquivo, a produção contextualiza a vida do físico alemão, de origem judaica, durante as duas Guerras Mundias; a ascensão e queda do fascismo; e do advento da era atômica. Mas, afinal, o que se sabe sobre a vida de Einstein em Norfolk?

A ascensão de Hitler

Em 30 de janeiro de 1933, Adolf Hitler foi nomeado Chanceler na Alemanha. Começava ali um regime autoritário que pregou a perseguição sistemática de judeus e outras classes minoritárias. O antissemitismo tomava conta do país. 

Em junho do mesmo ano, o assassinato de Walther Rathenau — então ministro de Assuntos Exteriores alemão, de origem judaica — por ultradireitistas já dava o tom da violência que seguia. 

Judeu, intelectual e antinazista ao extremo, Albert Einstein se tornou inimigo número um do Terceiro Reich. Embora tenha deixado Berlim para se mudar para Kiel, no norte do país, o físico sabia que não poderia mais viver em sua terra natal. 

Afinal, em maio, meses antes da morte de Rathenau, de quem era amigo, uma brochura intitulada 'Os Judeus Estão Observando Você' acusou o físico de "propaganda mentirosa de atrocidades contra Adolf Hitler". Embaixo de sua foto, algo ainda mais intimidador: estava escrito a frase "Ainda não enforcado". 

Albert e seu violino - Netflix

Em setembro, recorda o The Guardian, Einstein atendeu aos apelos de sua esposa, Elsa, para deixá-la na casa de férias onde estavam abrigados, perto de Ostende, na Bélgica, e fugir para a Inglaterra. 

Afinal, o cenário não era nada bom. Aquela altura, os nazistas já haviam assassinado o filósofo judeu Theodor Lessing na Checoslováquia; invadido a casa de veraneio de Einstein e saqueado seu apartamento em Berlim, roubando seu violino, pelo qual tinha grande apreço. O documentário da Netflix também aponta que os alemães colocaram uma recompensa pela cabeça do físico. 

Estadia na Inglaterra

Durante três semanas, Albert Einstein recebeu refúgio de um excêntrico deputado conservador antifascista Oliver Locker-Lampson, que havia sido comandante naval na Primeira Guerra Mundial. 

Embora tivesse uma grande casa de verão em Cromer, a propriedade à beira-mar não era tão segura quanto a cabana em Norfolk — protegida por seguranças armados. 

Apesar de modesto, o abrigo de Einstein na Inglaterra contava com suas regalias; conforme explica o escritor Stuart McLaren, autor de 'Saving Einstein: How Norfolk Hid a Genius – The Double Life of Oliver Locker-Lampson', em entrevista à BBC. 

Ele até mandou instalar um piano em uma das cabanas e lhe deram um violino", aponta. "Conseguiram para ele um mordomo e um cozinheiro para lhe servir a comida, um gramofone de corda e havia até um rebanho de cabras para lhe fornecer leite de cabra, que Einstein preferia ao leite de vaca".

Enquanto esteve em Norfolk, Einstein continuou com seus trabalhos. Apesar de uma localização 'secreta', ele ainda recebeu algumas visitas enquanto esteve por lá, como o artista Jacob Epstein — responsável por esculpir seu famoso busto. 

Além disso, a convite de Locker-Lampson, o físico recebeu a visita de diversos membros da imprensa. Uma forma de chamar a atenção para a situação que o famoso ganhador do Prêmio Nobel passava

Imagem de Albert Einstein - Netflix

"Foi só quando olhamos mais de perto que percebemos que momento sísmico foi aquele em sua vida", disse o roteirista de 'Einstein e a Bomba', Philip Ralph, em entrevista ao The Guardian. "O que resultou da minha pesquisa foi que este foi, em muitos aspectos, o ponto de virada mais importante na vida de Einstein". 

"Antes desse ponto, Einstein era um defensor declarado e apaixonado da não-violência e do pacifismo. Mas no final dessas três semanas, ele fez um discurso para 10 mil pessoas no Royal Albert Hall, onde disse efetivamente que existe uma ameaça existencial à civilização europeia e que teremos de combatê-la", contextualiza Ralph. 

Escolhemos o título 'Einstein e a Bomba' porque foi a mudança em seu pensamento que ocorreu durante aquele período de três semanas em Norfolk que o levou diretamente a colocar seu nome naquela carta a Roosevelt", completa.

+ O que dizia a carta assinada por Einstein que motivou a criação da bomba atômica

O discurso no Albert Hall

Em 3 de outubro de 1933, Einstein concordou em fazer um discurso no Royal Albert Hall; com o intuito de arrecadar dinheiro, com o valor dos ingressos, para refugiados acadêmicos judeus da Alemanha: 

"As perguntas cruciais de hoje são: como podemos salvar a humanidade e seu patrimônio cultural? Como podemos proteger a Europa de mais desastres? Descontentamento gera ódio. E ódio leva a atos de violência, revolução e até a guerra. Assim, vemos como o sofrimento e o mal geram novos sofrimentos e males.

Se quisermos resistir às forças que ameaçam a liberdade intelectual e individual, precisamos estar bem cientes do fato de que a própria liberdade está em jogo. Precisamos nos dar conta do quanto devemos essa liberdade que nossos antepassados ​​conquistaram através de muita luta.

Sem essa liberdade, não teria existido Shakespeare, nem Goethe, nem Newton, nem Faraday, nem Pasteur e nem Lister. Não haveria casas confortáveis ​​para a população, nem ferrovias, nem comunicações sem fios, nem proteção contra epidemias, nem livros baratos, nem cultura, nem qualquer prazer pela arte. 

Não haveria máquinas para aliviar as pessoas do árduo trabalho necessário para a produção das necessidades essenciais da vida. A maioria das pessoas levaria uma vida monótona de escravidão, tal como sob os antigos despotismos da Ásia. São apenas os homens que são livres, que criam as invenções e obras intelectuais que, para nós, modernos, fazem a vida valer a pena...

Devemos meramente lamentar o fato de vivermos em uma época de tensão, perigo e desejo? Acho que não. Somente quando sujeitas ao perigo e à revolta social, as nações se sentem induzidas a adotar medidas progressistas. Só podemos esperar que a atual crise leve a um mundo melhor".

O discurso de Einstein - Netflix

Dois dias depois de proferir o seu discurso histórico, Einstein partiu para os Estados Unidos, onde lecionou para o recém-formado Instituto de Estudos Avançados na Universidade de Princeton. 

Elsa se juntou a ele pouco depois e os dois passaram o resto da vida no exílio, onde Albert escreveu declarações recomendando que os EUA oferecessem vistos para judeus que fugissem da perseguição nazista e ajudou a fundar a primeira agência de ajuda aos refugiados do mundo, o Comitê Internacional de Resgate. Albert Einstein faleceu em 18 de abril de 1955.