Campo de concentração foi liberto em 15 de abril de 1945, há exatos 80 anos, apenas algumas semanas após a morte de Anne Frank
Há exatos 80 anos, em 15 de abril de 1945, a 11ª Divisão Blindada do Exército Britânico libertou o campo de concentração de Bergen-Belsen — que ficava situado no norte da Alemanha.
Por lá, os soldados Aliados encontraram cenas do que era capaz toda a depravação nazista retratada em cerca de 60 mil vítimas judias, quase mortas. Muitas delas estavam perecendo de tifo, tuberculose e desinteria.
Por todos os lados era possível ver os corpos esqueléticos daqueles que já haviam perdido a vida. O cheiro da morte pairava pelo ar. Muitos morreram nas mãos do depravado comandante Josef Kramer; outros pelo médico Fritz Klein; e também não dá para não lembrar também das atrocidades de Irma Grese (a Cadela de Belsen).
Para muitos, infelizmente, o resgate britânico chegou tarde demais. Um exemplo disso foi a inesquecível Anne Frank; adolescente judia holandesa cujo diário cativou o mundo. Ela morreu apenas algumas semanas antes — entre fevereiro ou março de 1945 — ao lado de sua irmã Margot.
Muito do que foi visto pelos britânicos em Bergen-Belsen foi acompanhado de perto por Richard Dimbleby, da BBC, que estava com as tropas aliadas no momento da libertação. Ele ficou responsável por resumir as cenas inimagináveis e monstruosas numa transmissão de rádio para todo o Reino Unido; o que certamente ficou marcado na história.
Segundo recorda o Daily Mail, a reportagem de Richard foi tão gráfica e angustiante que seus chefes da BBC tentaram suprimi-la. O radialista, porém, relatou como ele se viu "no mundo de um pesadelo".
"Tudo o que eu sei, tudo o que passei, eu não esqueci, porque você não esquece isso", relatou a sobrevivente Mala Tribich, de 94 anos, em entrevista à Press Association, em matéria que marca o aniversário de libertação de Belsen.
Espero que nada parecido aconteça novamente e, claro, cabe a nós nos protegermos contra isso. Espero que algumas pessoas tenham aprendido as lições. Vimos que isso pode acontecer novamente e precisamos tomar todas as medidas para não deixar que isso aconteça."
Inicialmente, Bergen-Belsen foi criado para abrigar prisioneiros de guerra soviéticos, mas, em 1943, foi transformado pelos nazistas em um campo de concentração — que recebeu judeus que haviam sido presos na Polônia, Holanda, Hungria e outras áreas.
Além disso, outros prisioneiros foram forçados a passarem pelas chamadas "Marchas da Morte" até Bergen-Belsen, como aqueles que estavam em Auschwitz-Birkenau, na Polônia ocupada. O Daily Mail aponta que cerca de 70 mil pessoas morreram em Bergen-Belsen, muitos dos quais sofrendo de tifo, disenteria e tuberculose.
Mala Tribich foi enviada para lá junto de seu primo, no começo de 1945. Na época, ela tinha apenas 14 anos, mas já havia passado por horrores inimagináveis por muitas crianças — e até mesmo por adultos.
Tribich, que nasceu em Piotrkow Trybunalski, na Polônia, tinha apenas nove anos quando os nazistas invadiram seu país. Por conta disso, sua família foi obrigada a viver em guetos.
Mala chegou a ser enviada, por certo tempo, para Czestochowa, na tentativa de se passar como parente de uma família cristã. Seus pais chegaram a pagar para uma família cuidar dela enquanto ocorriam as deportações no gueto. Mas acabou voltando algumas semanas depois, dias após sua mãe e irmã de oito anos serem presas e assassinadas em uma floresta local.
Assim, ela se tornou uma trabalhadora escrava até meados de novembro de 1944, quando acabou separada de seu pai e irmão; sendo deportada para o campo de concentração de Ravensbruck com seu primo mais novo.
Dez semanas depois, ela e seu primo foram transportados em vagões de gado para Bergen-Belsen. Sua primeira noite foi passada em uma grande tenda fora da área de acampamento. Tribich carregava apenas um embrulho com um pedaço de pão, que estava guardando para sua priminha, mas que foi roubado enquanto ela tirou um breve cochilo.
"Não deve ter sido por muito tempo, mas quando acordei, meu embrulho tinha sumido e foi como perder meus bens materiais", disse ela. "Não havia muita coisa nele, mas eu pensei: como alguém poderia fazer isso?".
No dia seguinte, ela foi levada para o campo. "A cena que me impactou foi, em primeiro lugar, um cheiro horrível. Havia um cheiro e uma poluição e havia pessoas lá, mas elas eram como esqueletos e estavam meio que se arrastando sem rumo e, enquanto se arrastavam, morriam”.
E havia pilhas de cadáveres. Lembro-me de uma pilha muito grande e de pilhas pequenas, e as pessoas estavam caindo mortas, literalmente. Houve uma espécie de tumulto e um movimento lento de pessoas e foi horrível".
Por sorte, ela e seu primo acabaram sendo acolhidos por um orfanato no acampamento. "Foi muita sorte porque não teríamos sobrevivido no acampamento principal". Ela passou alguns meses lá doente com tifo e disse que não se lembra muito do dia da libertação porque estava muito doente.
Sobre a libertação, em 15 de abril de 1945, ela não se recorda de muito. "Eu estava no meu beliche de cima e devo ter recuperado a consciência... e quando olhei pela janela e vi pessoas correndo em direção ao portão. Eu não sabia por que ou para onde, na verdade, mas aquela foi a libertação quando os britânicos tomaram o campo".
Ela acrescentou que ficou esperando no quartel vazio por dois dias antes que as tropas britânicas viessem buscá-la com uma maca. "Eles iam me colocar na maca e eu disse: 'Não, está tudo bem, eu posso fazer isso sozinha’. Então eu tentei sair e desmaiei. Eu não conseguiria andar".
Mala Tribich foi transferida para um hospital antes de se reunir com seu irmão, Ben, na Inglaterra, em março de 1947.