Estudo liderado pela Dra. Ana Paula Motta identifica o estilo "Figuras Naturalistas Lineares" em Kimberley, sugerindo uma mudança cultural milenar
Um estudo inovador liderado pela arqueóloga Dra. Ana Paula Motta, em colaboração com a Corporação Aborígene de Balanggarra, revelou um novo capítulo na história da arte rupestre australiana.
A pesquisa, publicada na revista Australian Archaeology, identificou um estilo artístico inédito na região nordeste de Kimberley, no oeste da Austrália: as Figuras Naturalistas Lineares (FNL).
A descoberta propõe a inclusão de uma nova fase estilística na já complexa sequência de arte rupestre de Kimberley, que há décadas intriga arqueólogos e estudiosos da cultura aborígene.
Até então, diversos motivos animais eram atribuídos ao chamado Período de Animais de Preenchimento Irregular (IIAP), do Pleistoceno. Contudo, Motta e sua equipe identificaram um conjunto significativo de pinturas que destoava desse padrão — tanto em forma quanto em técnica.
As FNL consistem em grandes representações naturalistas de animais, sobretudo macrópodes como cangurus e wallabies, desenhadas com contornos marcantes e traços lineares, mas sem os preenchimentos complexos característicos de estilos anteriores.
Diferente da dinâmica expressa nos motivos do IIAP, os animais no novo estilo aparecem em posições estáticas e de perfil, evidenciando uma nova abordagem estética e simbólica.
A equipe analisou mais de 1.100 sítios arqueológicos, incluindo 151 com arte rupestre, e identificou 98 exemplos claros do novo estilo em 22 locais diferentes. A posição estratigráfica dessas imagens — sobrepostas a estilos mais antigos como o Gwion e a Policromia Estática, mas sob camadas ou contemporâneas às pinturas Wanjina — situam o estilo FNL no Holoceno médio-tardio, há cerca de 5.000 anos, tornando-o mais recente do que se imaginava.
Mais do que uma simples questão de técnica, os pesquisadores veem o surgimento do estilo FNL como um marco de mudança cultural profunda. "Essa transformação no repertório gráfico pode indicar uma nova forma de percepção da paisagem e da identidade", afirmam os autores do estudo.
O retorno à figuração animal, após milênios de imagens antropomórficas elaboradas, pode refletir transformações sociais, espirituais e territoriais vividas pelas comunidades ancestrais.
Segundo o 'Archaeology News', a participação da Corporação Aborígene de Balanggarra foi essencial para interpretar o significado cultural dessas figuras. De acordo com o conhecimento tradicional, os animais representados carregam relações totêmicas e espirituais com os indivíduos e grupos da região, podendo servir como símbolos de identidade, parentesco e regeneração espiritual.